O amor maternal de um Deus irado

Nossas percepções de um Deus do Antigo Testamento cheio de ira são distorcidas.

Christianity Today September 23, 2020
Illustration by Matt Chinworth

Este é o segundo de uma série de seis ensaios escritos por um grupo diversificado de estudiosos importantes, que revisitam o lugar do “Primeiro Testamento” na fé cristã contemporânea. — Os editores

Nem sempre senti certa aversão por essa expressão. A tradição da igreja na qual cresci emergiu dos avivamentos de fronteira. Uma das marcas dos bons pregadores do avivamento está em sua habilidade de colocar pecadores nas mãos de um Deus irado, geralmente “o Deus do Antigo Testamento”, e então transferi-los para as mãos graciosas e amorosas do “Deus do Novo Testamento” revelado em Cristo Jesus. Esse forte contraste foi básico para minha compreensão de Deus durante a juventude.

Somente na faculdade e durante o mestrado em Antigo Testamento, percebi que esse contraste era uma construção falsa em mais de um nível. Em sua coleção póstuma, Cartas da Terra, o provocador teológico Mark Twain acertou em cheio ao observar que o Deus do Novo Testamento, que aparentemente inventou o inferno, deve ser “um trilhão de vezes mais cruel do que jamais foi no Antigo Testamento.” Ou o que dizer da observação de G. K. Chesterton, em sua obra O Homem Eterno, de que é difícil conciliar o amor e a compaixão de Jesus por Jerusalém com o fato de ele ter colocado Betsaida em um nível mais baixo do que Sodoma?

Mas não era só uma questão de que Jesus era muito mais severo do que as histórias no flanelógrafo da escola dominical revelavam. Em contrapartida, “o Deus do Antigo Testamento” mostrou-se mais amoroso, gracioso, perdoador e compassivo do que eu tinha ouvido por meio dos professores e pregadores da minha juventude.

Deus de compaixão maternal

Se não lemos o Antigo Testamento, perdemos muitas coisas boas, não apenas bebida, sexo e violência. Perdemos conteúdo teológico importante, palavras que refletem a pessoa e o caráter do “Deus do Antigo Testamento”. O nosso Deus.

Uma das declarações teológicas mais importantes aparece perto do fim de um dos pontos baixos no relacionamento de Israel com Deus:

Senhor, Senhor Deus compassivo, clemente e longânimo e grande em misericórdia e fidelidade; que guarda a misericórdia em mil gerações, que perdoa a iniquidade, a transgressão e o pecado, ainda que não inocenta o culpado, e visita a iniquidade dos pais nos filhos e nos filhos dos filhos, até à terceira e quarta geração! (Êx 34.6-7).

Pouco antes dessa afirmação, o povo fez um bezerro de ouro para representar o deus que iria adiante deles para a Terra Prometida. Pouco lhes importava que isso violasse o segundo dos Dez Mandamentos. O povo tinha ficado impaciente com Moisés, que estava demorando muito tempo no monte com Deus, e queria continuar sua jornada. E embora Moisés tenha dissuadido Deus de agir com ira contra Israel, Aarão não conseguiu dissuadir Moisés de sua própria ira, que levou os levitas a abaterem 3 mil de seus irmãos israelitas em nome do Senhor (Êx 32).

No caos consequente da idolatria de Israel, Deus ameaça não seguir com eles para a Terra Prometida. Até a confiança de Moisés fica abalada. Buscando recuperá-la, Moisés pede para ver a glória de Deus, apesar de o Senhor ter falado com ele, na tenda da reunião, como quem fala com um amigo íntimo (Êx 33).

Tudo isso leva à declaração de Êxodo 34.6-7, quando Deus desce sobre o monte para passar diante de Moisés. Particularmente importante nessa declaração é a virtude listada em primeiro lugar entre as demais: Deus é compassivo. O termo em hebraico por trás da palavra em português, compaixão, é mais rico, pois, como Beth Tanner observa no comentário The Book of Psalms, do qual é coautora, também pode significar útero, ventre. Portanto, uma tradução melhor pode ser Deus de “compaixão maternal”.

Em Êxodo 34, Deus ainda chama Israel para prestar contas de seu pecado. Mas o faz com base na compaixão maternal. Moisés suplica a Deus: “E lembra-te de que esta nação é teu povo” (Êx 33.13). A resposta positiva de Deus o identifica primeiramente com a compaixão maternal, o que parece significar que, embora Deus fique irado com Israel, assim como as mães ficam com os filhos, Deus nunca os abandonaria, assim como as mães jamais abandonariam seus filhos. O Deus do Antigo Testamento é o nosso Deus, um Deus de compaixão maternal que confronta pecados ultrajantes e promete um futuro além dos fracassos. Retratar o Deus do Antigo Testamento em termos de ira reflete apenas uma faceta da identidade divina e deixa de perceber que, de acordo com Êxodo 34, a essência do caráter de Deus principia pela compaixão maternal.

Compaixão ao longo de todas as gerações

Muitas gerações depois de Moisés e do êxodo do Egito — na verdade, várias gerações, após o retorno de Israel do exílio — os sacerdotes nos dias de Neemias usaram a linguagem de Êxodo 34.6-7 em uma oração motivada pela preocupação quanto a Deus ter abandonado seu povo (Ne 9.17). Infelizmente, a volta do exílio não aliviara as adversidades que o povo sofria sob o domínio persa (9.36-37). E, para dificultar ainda mais suas lutas, as pessoas ouviam a Torá ser lida por Esdras, o escriba, e, ao que aparece, ficavam tão profundamente conscientes de seus pecados que não podiam conter as lágrimas (Ne 8).

Mesmo enquanto oravam, exaltando a Deus por ter criado o céu e a terra, escolhido Abraão e libertado Israel do Egito, os levitas também lembravam o povo que, quando se recusaram a obedecer à ordem de Deus para que tomassem a terra prometida, o Senhor os perdoou, porque ele é “misericordioso e compassivo, lento para se irar e cheio de amor” (Ne 9.17).

Diante das dificuldades pós-exílicas e do pecado do povo, os levitas fundamentaram sua esperança para o futuro em Deus, que não abandonou Israel no passado por causa de [sua] grande compaixão maternal (9.19). O povo virou as costas para a Torá e matou os profetas, nos dias dos juízes, mas Deus, ainda assim, respondeu a seus clamores com compaixão maternal (9.27), vez após vez (9.28). As coisas não melhoraram com a monarquia; as pessoas continuaram a pecar e a matar os profetas. Mesmo assim, Deus se recusou a abandonar o povo, por causa dessa grande compaixão maternal, porque Deus é simplesmente bondade e compaixão maternal (9.31).

Essa visão de Deus me lembra uma mãe que conheci em meu primeiro pastorado, em Ohio. Seu filho ficou viciado em drogas e envolveu-se em uma série de problemas. Ela e o marido tentaram de tudo: várias clínicas de reabilitação, estabelecer regras, amor enérgico. Nada funcionou. Ainda assim, toda vez que o filho voltava para casa, ela o perdoava, mesmo sabendo que ele provavelmente feriria seu coração de novo. Mas ele era seu filho. Ela era mãe dele. Da mesma forma, apesar de, geração após geração, os filhos de Deus pecarem contra ele — e inclusive matarem seus profetas! — Deus recebia de volta os filhos de Israel (e nós também!) com compaixão maternal, repetidamente. O que mais um pai deve fazer?

Somos todos filhos de Deus

O livro de Jonas funciona em parte como uma meditação sobre a grande compaixão de Deus, que se estende além das fronteiras de Israel, até mesmo entre seus inimigos. Aqui está uma história que o flanelógrafo captou bem em grande parte. Deus disse a Jonas para ir a Nínive, a capital dos assírios, opressores de Israel. Mas Jonas fugiu; Deus interveio e fez com que Jonas fosse jogado de um navio, indo parar na barriga de um grande peixe. Com algum tempo para refletir sobre suas escolhas de vida, Jonas orou e o peixe o vomitou de volta em terra firme. Jonas finalmente cumpriu sua missão original e proclamou a queda iminente de Nínive. Para surpresa dos leitores, Nínive se arrependeu e Deus perdoou a nação.

Talvez Jonas também tenha ficado surpreso quando Nínive se arrependeu. Mas ele não ficou surpreso com o perdão de Deus. O que não me lembro de ver no flanelógrafo é o quanto Jonas ficou irado por saber, assim como Moisés e os sacerdotes nos dias de Neemias sabiam, que Deus é um “Deus misericordioso e compassivo, lento para se irar e cheio de amor. […] pronto a voltar atrás e não trazer calamidade ”(Jn 4.2). Jonas fugiu porque, mesmo que não pudesse prever o que os assírios fariam, ele sabia o que Deus faria: Inevitavelmente, por compaixão, Deus perdoaria os ninivitas ao primeiro sinal de arrependimento.

Afinal, os assírios também são filhos de Deus. Lembro-me de ouvir, naquela mesma igreja em Ohio, o tom áspero com que um dos anciãos começou a depreciar “os japoneses”, cuja perspicácia industrial ameaçava a estabilidade das indústrias dos Estados Unidos. No entanto, os japoneses também são filhos que Deus gerou. Da mesma forma, recentemente, muitos cristãos expressaram raiva de nossos semelhantes muçulmanos, por se sentirem ameaçados por sua presença e temerem que eles estivessem assumindo o controle do país. No entanto, esses muçulmanos também são filhos que Deus gerou. O Antigo Testamento está repleto de inimigos de Israel, assim como não nos faltam inimigos contra nosso país e estilo de vida. O livro de Jonas nos lembra que a compaixão maternal de Deus se estende até mesmo aos nossos inimigos, porque somos todos filhos de Deus.

É claro que as mães não são apenas as pessoas com maior probabilidade de nos perdoar além da conta. Elas também vêm prontamente em nossa defesa em tempos de dificuldade. Minha própria mãe é assim. Lembro-me de quando minhas irmãs e eu éramos bem jovens, e o banco não estava facilitando nossa vida, pois tentávamos depositar dinheiro em uma conta-poupança de Natal sem nenhuma identificação. Minha mãe nos levou até o escritório do vice-presidente do banco e explicou que éramos filhos dela, e que esperava que nos tratassem melhor. Não me lembro de termos tido problemas depois disso.

No Salmo 86, o salmista clama a Deus para que expresse compaixão maternal de maneira semelhante, embora o problema do salmista certamente superasse em muito nosso pequeno incidente com o banco. O salmista conhece o perdão de Deus (Sl 86.5), mas vem a Deus pedir que guarde sua vida (v. 2), que o responda em sua angústia (v. 7), por causa dos inimigos que o atacam, “pessoas violentas . . [que] tentam me matar”(v. 14). E enquanto o salmista encara o rosto de seus inimigos implacáveis, ele também se lembra desta forte afirmação que ecoa por todo Israel e além: “Mas tu, Senhor, és Deus de compaixão e misericórdia, lento para se irar e cheio de amor e fidelidade” (v. 15).

O salmista sabe que Deus olha para a sua situação com a compaixão maternal que o move a resgatar um filho de uma casa em chamas, dando a própria vida para salvar o fruto do seu ventre. A compaixão maternal incita uma defesa apaixonada da vida daquele a quem se deu à luz, a fim de afastar o agressor e propiciar um lugar seguro em um mundo violento. Este também é o Deus do Antigo Testamento, o nosso Deus, que em compaixão maternal vem para salvar (v. 16).

Ide e amai da mesma forma

Se consultarmos o hebraico por trás desse termo na Concordância de Strong, veremos que várias formas da expressão “compaixão maternal” ocorrem cerca de 150 vezes no Antigo Testamento. E, em vez de ignorarmos o grande tema da compaixão maternal, porque vemos um Deus irado e vingativo, um Deus da Antiga Aliança que de alguma forma não é o mesmo revelado em Cristo Jesus, que tal se nossas igrejas fizessem um estudo minucioso dessas 150 ocorrências, ao longo de um ano, e a compaixão maternal se tornasse parte desse nosso nutrir constante das Escrituras?

Algo que aconteceria, segundo acredito, é que passaríamos a adorar e a orar com maior gratidão ao nosso Deus, que “é o mesmo ontem, hoje e para sempre” (Hb 13.8). Ao participarmos da Santa Ceia, veríamos que a expressão do perdão de Deus em Jesus é o ato último de sua compaixão maternal por todos os filhos de Deus, que ele amou desde a criação dos primeiros filhos, no Jardim do Éden. E, naquele mesmo pão e vinho que Jesus oferece, veríamos que o ato de libertação do poder do pecado e da morte em Jesus é a culminação dos muitos atos de salvação das mãos dos inimigos, os quais Deus desempenhou repetidas vezes por seus filhos.

E quem sabe nossas igrejas se tornassem cada vez mais um local de boas-vindas à humanidade caída, como Deus deseja que sejam. Se víssemos todas as ocorrências no Antigo Testamento em que Deus expressa compaixão maternal — e o povo de Israel segue seu exemplo — será que não seríamos movidos a superar nossa inclinação tão frequente para a justiça própria e para difamar nossos inimigos, e passaríamos a abrir nossas comunidades a todos os filhos de Deus, acolhendo-os de modo compassivo? Não seríamos movidos a proteger as vidas ameaçadas de morte em nossas cidades e comunidades?

Talvez viéssemos a perceber que deixamos nos enganar pelas primeiras impressões, e que o Deus do Antigo Testamento é mais complexo, mais vibrante e também mais maternal do que imaginávamos. Talvez parássemos de dizer “o Deus do Antigo Testamento” e simplesmente disséssemos “o nosso Deus”.

Robert L. Foster é professor de Novo Testamento e religião na Universidade da Geórgia. Ele é o autor de We Have Heard, O Lord: An Introduction to the Theology of the Psalter (Fortress Academic).

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Books

Deus sabia o que estava fazendo quando deu a Jesus duas árvores genealógicas

Como resolver as muitas disparidades entre as genealogias de Mateus e Lucas.

Christianity Today September 18, 2020
WikiMedia Commons

Problemas nas Escrituras funcionam como quebra-molas: eles podem ser frustrantes e causar danos aos incautos, mas, sem dúvida, nos fazem reduzir a velocidade e focar nossa atenção. Fato é que tensões provocam reflexões. As contradições aparentes nos forçam a pelejar com os textos bíblicos, prestando mais atenção aos pormenores. Quando Deus os inspirou, ele sabia o que estava fazendo.

Quando estudamos os evangelhos, de imediato encontramos o problema das diferenças significativas entre as genealogias de Jesus em Mateus e Lucas. Mateus 1 lista 42 gerações, que remontam a Abraão; Lucas 3 tem 77 gerações, que remontam a Adão. Das dezenas de nomes citados entre Davi e Jesus, apenas cinco aparecem nas duas listas. Pior ainda, nelas Jesus tem dois avôs paternos diferentes: Jacó (Mt 1.16) e Eli (Lc 3.23).

Os esforços para resolver as disparidades geralmente se concentram no lado de Mateus, em parte porque sua genealogia parece ter motivações mais teológicas: as numerosas lacunas, as mulheres citadas, os três grupos de 14 gerações e assim por diante. Lucas, segundo presumimos, está fornecendo “apenas os fatos”, enquanto Mateus os está trabalhando para provar um argumento. Mas essa visão rebaixa tanto o historiador em Mateus quanto o teólogo em Lucas. Penso que a genealogia de Lucas tem uma motivação teológica tão forte quanto a de Mateus, se não mais.

Considere como ele lista 77 gerações de Adão a Cristo. Esse número aponta para o Sábado (dia do descanso). Ele nos lembra da vingança de 77 vezes de Lameque (Gn 4.24) e do perdão de 77 vezes 1Ou 70 vezes 7. Segundo os estudiosos, não é claro se a expressão que se encontra nos manuscritos gregos deve ser entendida como "setenta vezes (multiplicado por) sete" ou "setenta e sete vezes (ocorrências)". de Jesus (Mt 18.22). Também evoca o ano do Jubileu (Lv 25.8–55), celebrado uma vez a cada sete séries de sete anos. Jesus proclama o cumprimento da promessa do Jubileu em Lucas 4.16-21, um acontecimento prenunciado dois capítulos antes, quando a convocação para se dirigir à terra natal para a realização do censo lembra a ordem do Jubileu de retornar à propriedade da família (Lv 25.10).

Também é digno de nota o fato de Lucas apresentar sua genealogia não no início da vida de Jesus, mas no início de seu ministério, quando ele "estava com cerca de trinta anos" (3.23). Trinta é um número impressionante. Os sacerdotes começavam seu ministério com essa idade (Nm 4.3), a mesma com que Davi se tornou rei (2Sm 5.4) e Ezequiel teve visões proféticas de Deus (Ez 1.1). Ao inserir sua genealogia nesse estágio da vida de Cristo, Lucas está conectando a ancestralidade de Jesus ao seu ministério como profeta, sacerdote e rei. Ao reconstituir sua genealogia até Adão, e não só até Abraão, ele retrata Jesus como profeta às nações, sacerdote para todos os povos e rei de toda a terra.

Depois, há a questão do(s) avô(s) paterno(s) de Jesus. Desde o início do século 3, as pessoas especulam que José teve dois pais, ou porque foi legalmente adotado ou porque era filho de um casamento no sistema de levirato (segundo este costume judaico, se um homem morresse sem deixar filhos, seu irmão se casaria com a viúva, a fim de preservar a linhagem da família). Se de fato foi assim, José seria filho de ambos, Eli e Jacó. Isso sempre soou como um desespero apologético para mim. Mas, então, comecei a notar todas as outras referências em Lucas 3 ao casamento em levirato ou à adoção legal.

Uma delas se relaciona com Herodes e seu irmão Filipe (Lc 3.1). Herodes casou-se com a esposa de Filipe, irritando judeus praticantes, e, mais tarde, levando João Batista à decapitação (Mc 6.17). Portanto, o relato de Lucas sobre a vida adulta de Jesus começa com um homem celebrando um “casamento em levirato” adúltero, pois o irmão ainda estava vivo.

Outra referência diz respeito ao próprio Jesus: “Ele era filho, como se pensava, de José” (Lc 3.23). Legalmente, Jesus era filho de José, mas José não era seu pai biológico. Como Gabriel explicou a Maria, Jesus seria chamado de “Filho do Altíssimo” e “Filho de Deus” (1.32,35).

Encontramos um exemplo até mesmo em João Batista, que faz um célebre contraste entre si mesmo e aquele “tão superior que não sou digno de desatar as correias de suas sandálias” (3.16). Desatar as correias da sandália era o momento-chave na halizah, o processo que liberava um homem do casamento em sistema de levirato (Dt 25.9; Rt 4.7). Talvez, como Gregório, o Grande argumentou, João estivesse se declarando não apenas inferior a Cristo, mas também indigno de substituí-lo como o verdadeiro marido de Israel. Assim, João Batista é o padrinho do casamento, não o noivo (Jo 3.29).

Nesse contexto mais amplo, o quebra-cabeça de Eli e Jacó não é uma coincidência, mas parte de um padrão – o qual poderíamos não perceber, se não tivéssemos diminuído a velocidade até quase parar. Graças a Deus pelos quebra-molas!

Andrew Wilson é o pastor responsável pela área de ensino da King’s Church London e autor de Spirit and Sacrament (Zondervan). Siga-o no Twitter: @AJWTheology.

Traduzido por Mauricio Zágari

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Palavra de Paulo à polícia: proteja os fracos

Como os cristãos negros há muito entenderam, o Novo Testamento tem uma forte teologia de aplicação da lei.

Christianity Today September 14, 2020
Source images:Library of Congress / Wikimedia Commons / Aijohn784 / Getty

Cresci em um bairro pobre em Huntsville, Alabama. Quando tinha 16 anos, eu estava confiante em que o futebol americano seria meu caminho para a faculdade. As cartas e os telefonemas de treinadores universitários haviam começando a chegar. Tudo o que eu precisava fazer era atuar em campo, manter minhas notas e evitar problemas.

Por “problema”, não quis dizer meu próprio comportamento. Eu estava com medo de ser assediado pela polícia e de me ver em alguma circunstância que saísse do controle.

Cheguei à maioridade após o incidente de Rodney King, o que confirmou meus temores com relação à polícia. Mas “dirigir sendo negro” não foi um problema a que simplesmente assisti no noticiário. Foi algo que vivenciei.

Certa noite, em meu primeiro ano colegial, meus amigos e eu tínhamos planos de ir ao shopping e, depois, a uma festa na mesma parte da cidade. Paramos em um posto de gasolina a fim de comprar lanche e combustível antes de continuar com as festividades da noite. Depois que terminei de encher o tanque, voltei para o carro e me preparei para sair. Foi quando percebi que um veículo utilitário esportivo preto havia parado bem atrás de nós. Um segundo parou à minha esquerda e outro estacionou na frente do meu carro. Achei que estava sendo assaltado, mas quem roubaria alguém em um posto de gasolina bem iluminado?

Quando a polícia saiu dos veículos, percebi o que estava acontecendo. “Ponha as mãos onde possamos vê-las”, disse um oficial.

“Não vou pôr minhas mãos em lugar nenhum”, respondeu um de meus amigos.

Naquele momento, meu futuro passou diante de meus olhos. Todo o meu planejamento fora em vão? Eu tinha trocado meus sonhos por um saco de batatas fritas e alguns galões de combustível?

Disse ao meu amigo que ficasse quieto e fizesse o que o policial havia ordenado. Quando o policial mandou que saíssemos do carro, obedecemos. Eu lhe perguntei o que estava acontecendo. Ele respondeu que aquele posto de gasolina específico era um conhecido centro de venda de drogas e que ele nos vira negociando drogas. Não pude deixar de pensar que o local também era conhecido por vender combustível. Mas o que poderíamos fazer?

A coisa toda durou menos de 20 minutos. Eles não encontraram nada em sua busca. Eu esperava algum pedido de desculpas, alguma explicação adicional de por que nos detiveram, a não ser por sermos jovens e negros. Em vez disso, eles nos devolveram nossos documentos e nos disseram que estávamos livres para partir.

Mas não me senti livre. Eu me senti impotente e com raiva. Eu tinha chegado muito perto de perder tudo: a bolsa de estudos, o caminho para sair da pobreza e a chance de ajudar minha família. Fui brevemente aterrorizado.

Ao longo dos anos, fui parado entre sete e dez vezes, na estrada ou em espaços públicos, por nenhum crime além de ser negro. Pessoas que amo também foram detidas, revistadas, acusadas e humilhadas, com pouca ou nenhuma justificativa legal. Essas revelações podem dar a impressão de que não gosto de policiais. Pelo contrário, conheci muitos bons. Reconheço os perigos que enfrentam e as dificuldades inerentes à vocação que escolheram. Mas ter um trabalho difícil não os absolve das críticas; simplesmente posicionam a crítica em uma estrutura mais ampla, que tem de incluir a história da polícia nos Estados Unidos – sua aplicação legal da discriminação racial e o terror que impuseram aos negros.

O lodo escuro dessa história foi trazido à tona por eventos recentes, principalmente o assassinato de George Floyd nas mãos da polícia. Os muitos manifestantes que marcharam nas ruas de nosso país testemunham que Floyd não é o primeiro. Os negros americanos estão “sob os joelhos” não há dias ou semanas, mas há séculos, e essa opressão cumulativa está mais uma vez na frente e no centro de nossa consciência nacional.

Como um país que tenta acertar a questão da ação policial, recorremos a livros, podcasts, conversas em praça pública e projetos nas comunidades. Tudo bacana e bom. Mas, como crentes, devemos voltar nossos olhos para as Escrituras, não a fim de encontrar textos que nos provem algo, mas para pensar teologicamente sobre como o estado policia seus cidadãos. O Novo Testamento, em particular, aponta para uma teologia do policiamento que é frequentemente negligenciada por leigos, clérigos e, até mesmo, estudiosos. (Leia o ensaio complementar de Michael LeFebvre sobre policiamento e o Antigo Testamento, também na edição de setembro da CT).

Surpreendentemente, esse assunto ganhou muito pouca reflexão nas obras-padrão sobre a ética do Novo Testamento. Algo passou despercebido. O tratamento que o estado dispensa aos seus cidadãos não é um assunto estranho ao Novo Testamento, e os negros que procuram esses textos vão de fato encontrar socorro e esperança. Tomadas como um todo, essas passagens são absolutamente fundamentais para pensarmos sobre o futuro do policiamento nos Estados Unidos.

O Novo Testamento fornece as bases de uma teologia cristã de policiamento em duas passagens. A primeira é Romanos 13.1-7, um texto muito difamado e incompreendido. As palavras de Paulo sobre “a espada” dizem respeito diretamente à questão de como o estado policia seus cidadãos.

À primeira vista, os primeiros versículos de Romanos 13 podem não parecer um trecho produtivo para começar. Diz o texto:

Todos devem sujeitar-se às autoridades, pois toda autoridade vem de Deus, e aqueles que ocupam cargos de autoridade foram ali colocados por ele. Portanto, quem se rebela contra a autoridade se rebela contra o Deus que a instituiu e será punido. (Rm 13.1-2)

O foco dessa passagem parecem ser os indivíduos, não o estado. Além disso, Paulo diz às pessoas que se submetam às autoridades, porque quem está no poder foi posto lá por Deus. Aqueles que resistem correm o risco de se opor à vontade divina.

A falta de qualificação de Paulo, aqui, tem sido motivo de preocupação tanto para leitores leigos quanto para estudiosos. Como Leander Keck escreve em seu comentário de Romanos: “Não é a opacidade desta passagem que angustiou e dividiu os intérpretes, mas sua clareza”.

Paulo está argumentando que a resposta cristã adequada aos maus-tratos não é a revolução, mas a obediência? E nossa única esperança é, então, a correção escatológica dos erros do outro lado desta vida? Sim, essa imagem escatológica é importante, mas Paulo tem mais em mente. Suas palavras sobre submissão à autoridade devem ser lidas à luz de um contexto muito mais amplo.

Primeiro, temos de olhar para o estudo de Paulo sobre o faraó. Seu uso da narrativa do faraó é quase universalmente ignorado nos estudos de Romanos 13, mas fornece uma base essencial para uma teologia de policiamento biblicamente informada. Paul escreve:

Pois as Escrituras afirmam que Deus disse ao faraó: “Eu o coloquei em posição de autoridade com o propósito de mostrar em você meu poder e propagar meu nome por toda a terra” (Rm 9.17).

De acordo com o apóstolo, Deus é glorificado por meio do julgamento de reis iníquos. O faraó estava envolvido na exploração econômica, na escravidão e no tratamento severo de Israel, e Deus o removeu por causa de seu governo injusto e tirânico.

Como Paulo observa, a destruição de faraó por Deus foi decretada em parte por meio de Moisés. A história do faraó, então, nos dá um exemplo de Deus removendo autoridades por meio de agentes humanos. Mais especificamente, o interesse de Paulo nessa história mostra que sua proibição contra a resistência não é absoluta.

Em segundo lugar, temos de entender a visão de Paulo sobre o estado. Embora as palavras de Paulo aos indivíduos tenham recebido a maior parte da atenção dos exegetas, seus comentários sobre o estado fornecem um quadro mais completo.

O apelo de Paulo à submissão ao estado é baseado em uma descrição do que o próprio estado deve fazer:

Pois as autoridades não causam temor naqueles que fazem o que é certo, mas sim nos que fazem o que é errado. Você deseja viver livre do medo das autoridades? Faça o que é certo, e elas o honrarão, pois a autoridade é ministro de Deus para o seu bem. Mas, se você fizer o mal, então tenha medo, porque não é sem motivo que a autoridade traz a espada; pois é ministro de Deus, vingador, para castigar quem pratica o mal. (Rm 13.3-4).

Para entender essas palavras sobre a espada, precisamos compreender que, na época de Paulo, os soldados desempenhavam o papel de policiais. Eles eram uma “unidade organizada de homens sob comando oficial cujas funções envolviam manter a ordem pública e o controle do estado em um ambiente civil”, escreve Christopher J. Fuhrmann, em Policing the Roman Empire. Embora os soldados não funcionassem exatamente como os policiais modernos, eles eram, na verdade, o que havia de mais próximo de uma força policial.

Nos versículos 3 e 4, Paulo enfoca as autoridades, não os próprios oficiais. Ele parece reconhecer que a atitude de um soldado com os residentes da cidade será determinada em grande parte por aqueles que dão as ordens. O problema, se houver, não reside apenas naqueles que empunham a espada, mas naqueles que os comandam. Em outras palavras, o foco de Paulo aqui não está nas ações individuais, mas sim nas estruturas de poder.

Um estudante cuidadoso de Paulo pode objetar a essa interpretação apontando o versículo 3, onde Paulo diz que os governantes (que controlam a polícia) não são um terror para aqueles que praticam boa conduta. Ele afirma isso como um fato. No entanto, dada a capacidade de Deus de julgar nações e governantes por práticas corruptas, é evidente que Paulo está falando sobre um ideal. Seu mandato de “fazer o que é bom” pressupõe que os próprios governantes estão discernindo a diferença entre conduta correta e conduta errada. Essa pressuposição é a chave.

Claramente, Paulo sabe que alguns governantes são um terror para os que são bons. Seu estudo sobre o faraó, no capítulo 9, torna isso claro. No capítulo 13, Paulo passa a delinear as responsabilidades dos governantes sem abordar diretamente o problema dos governantes malignos. Nesse contexto mais amplo, somos livres para preencher a lacuna com sua referência ao Egito e ao relato bíblico mais amplo.

O que, então, o enfoque de Paulo nas estruturas de poder significa para hoje? A aplicação parece bastante evidente. Nos Estados Unidos, temos de enfrentar o fato de que o racismo foi baseado no pecado corporativo e institucional e alimentado pelo poder de policiamento do estado. Ao longo de séculos, não décadas, nosso governo elaborou leis destinadas a privar os negros de direitos. Essas leis foram, então, aplicadas pela espada do estado.

Pela lógica da teologia de Paulo, o mesmo governo que cria estruturas cívicas tem a responsabilidade de discernir o que é justo, desfazer quaisquer injustiças e corrigir os erros do sistema. Conclui-se, também, que nós, como cidadãos cristãos, temos o dever cívico de responsabilizar esses governantes ou as autoridades eleitas pelas ações de seus agentes ou oficiais.

A visão de Paulo sobre o policiamento também se origina de uma teologia cristã das pessoas. Essa teologia nos lembra que Deus é nosso criador e o estado é apenas um mordomo, um zelador. Ele não nos criou e não nos possui ou nos define. Com isso em mente, estamos sendo os cristãos que Deus nos chama para ser quando lembramos ao estado dos limites de seu poder.

Tomadas em conjunto, na narrativa mais ampla do Antigo e do Novo Testamentos, as palavras de Paulo apontam para uma direção clara. Sim, ele fala sobre a responsabilidade do cristão de obedecer ao governo. Isso é bom. Não queremos anarquia. E, sim, ele nos convida a reconhecer as potenciais boas realizações do governo. Mas as palavras sobre submissão vêm no contexto de sua exortação mais ampla, chamando os governos a administrar com justiça o seu poder.

E quanto aos policiais? Existe um modelo bíblico para os indivíduos que representam o estado? Se o soldado é o que havia de mais próximo de um policial moderno, então os encontros com soldados no Novo Testamento podem nos fornecer informações importantes. No Evangelho de Lucas, o ministério de João Batista nos dá uma visão clara e contundente do comportamento policial ideal.

Primeiro, é importante lembrar como João Batista atua na narrativa cristã mais ampla. De acordo com os escritores dos evangelhos, Deus designou João como arauto do Messias vindouro e da era messiânica. Todos eles o associam à figura descrita em Isaías: “Ele é uma voz que clama no deserto: ‘Preparem o caminho para a vinda do Senhor! Abram uma estrada para ele! […]'" (Lc 3.4-6). O chamado de João ao arrependimento é uma ordem de preparação para a chegada de Deus. Aqueles que o ouviam perguntaram: O que devemos fazer?

João respondeu com sugestões práticas para diferentes grupos. Um desses grupos são os soldados – ou, para nossos propósitos, os policiais. Ele lhes diz: “Não pratiquem extorsão nem façam acusações falsas. Contentem-se com seu salário” (Lc 3.14).

Se Romanos 13.3-4 enfoca as responsabilidades coletivas do estado, esse versículo de Lucas nos dá uma imagem das responsabilidades individuais de um policial. João condena a extorsão, mas o peso dessa crítica vai muito além de meros subornos. A extorsão envolve o uso do poder para atacar os fracos e só é possível quando os extorquidos não têm recurso. Claramente, então, João está preocupado com uma forma de policiamento em que os que detêm poder o usam a fim de explorar pessoas sem o mesmo poder.

Por isso, sua crítica às falsas acusações não deve ser separada da sua crítica à extorsão, já que as duas costumam andar juntas. Se uma pessoa que está sendo extorquida se recusa a obedecer, ela pode ser acusada de crimes que não cometeu.

Aqui, João pode ter em mente um soldado que envolve uma pessoa em um crime a fim de satisfazer o capricho de um governante ou para alcançar algum fim político. A história da crucificação de Jesus é o exemplo paradigmático. Ele é o verdadeiro inocente que, no entanto, foi assassinado pelo estado.

Quando o apóstolo João reconta as palavras de Pilatos “Eis o homem” (João 19.5), ele está em parte afirmando a humanidade de Cristo. Jesus é uma pessoa que merece ser tratada com dignidade. Hoje, os negros fazem essa mesma reivindicação de consciência sobre aqueles que nos policiam: vejam-nos como pessoas dignas de respeito, em todas as instâncias.

O tratamento de Jesus pelos soldados nos parece chocante, porque ele era inocente das acusações, mas mesmo os culpados não merecem zombaria e espancamentos. Conforme registrado em Lucas, João está chamando soldados em todas as circunstâncias para superar a tentação de desumanizar. Sua exortação aos oficiais reforça a exortação de Paulo ao estado: use seu poder para defender a dignidade inerente de todos os cidadãos e nunca use a espada para seus próprios fins.

Enquanto Paulo chama os governantes para exercerem bem seu poder, João chama os soldados, individualmente, não para atos heroicos de bravura física, mas para a virtude heroica. Tomada em conjunto, essa teologia de policiamento do Novo Testamento convoca o estado e seus oficiais a usar sua influência para proteger os fracos.

Esses princípios bíblicos e teológicos são fáceis de afirmar em termos abstratos, mas sua aplicação costuma ser mais complicada. Algumas pessoas acham que igreja e política não devem se misturar. A esfera da fé deve se sobrepor apenas modestamente (se tanto) aos assuntos de estado.

A história dos direitos civis nos dá um exemplo vívido dessa mentalidade.

Em 16 de janeiro de 1963, oito clérigos – dois bispos metodistas, dois bispos episcopais, um bispo católico romano, um rabino, um presbiteriano e um batista – escreveram uma carta aos cidadãos do Alabama intitulada “Um apelo por lei e ordem e senso comum”. Ela pedia o fim da violência em torno dos protestos pelos direitos civis e implorava que ambos os lados confiassem no sistema judicial. Porém, o texto falhou em se posicionar contra a segregação.

Três meses depois, em 12 de abril de 1963, esse grupo de oito redigiu outra carta. Ela continha uma crítica não tão velada a Martin Luther King Jr. e aos participantes do Southern Christian Leadership Council [Conselho Sulista de Liderança Cristã], que eles caracterizaram como “agitadores de fora”.

Eles questionaram o testemunho político de King e outros. Argumentaram que “ações como incitar ao ódio e à violência, por mais tecnicamente pacíficas que sejam, não contribuíram para a resolução de nossos problemas locais. Não acreditamos que estes dias de nova esperança sejam dias em que medidas extremas são justificadas em Birmingham”.

Essa crítica ao trabalho de King – e à tradição negra e cristã de protestar, que o sustentava – veio de uma espécie de consenso ecumênico sulista e branco. Batistas, metodistas, presbiterianos, católicos, episcopais e líderes judeus se opuseram a ele. A resposta de King, “Carta de uma cadeia de Birmingham”, foi dirigida não apenas a oito clérigos, mas a uma certa abordagem da fé que se concentrava mais na lei e na ordem do que nas exigências do evangelho.

Em sua resposta, King escreve:

Estou em Birmingham porque existe injustiça. Assim como os profetas do século 8 a.C. deixaram suas aldeias e levaram seu “assim diz o Senhor” muito além dos limites de suas cidades e, assim como o apóstolo Paulo deixou sua aldeia de Tarso e levou o evangelho de Jesus Cristo ao cantos longínquos do mundo greco-romano, sou compelido a levar o evangelho da liberdade para além da minha cidade natal. Como Paulo, devo responder constantemente ao apelo macedônio por ajuda.

Quase 60 anos após a publicação desta carta, os americanos ainda estão debatendo o papel da igreja em praça pública. A busca de King por uma sociedade justa era de fato análoga à obra de Paulo e dos profetas, ou era apenas política partidária? Sua crítica pública às estruturas de poder foi um elemento-chave de seu ministério pastoral ou uma distração dele? Para muitos cristãos negros, a resposta é evidente: nunca nos damos ao luxo de separar nossa fé da ação política.

As cartas do Novo Testamento dão suporte para essa integração estreita dos reinos espiritual e político.

De acordo com o estudioso do Novo Testamento J. Louis Martyn, Paulo acreditava que o mundo estava sob o domínio de poderes espirituais malignos antes da vinda do Messias. Como Paulo escreve em Gálatas, Cristo “entregou sua vida por nossos pecados, a fim de nos resgatar deste mundo mau” (Gálatas 1.3-4). Em Efésios, Paulo sugere que esses mesmos poderes têm domínio sobre os líderes e governantes terrestres (Efésios 1.21). As políticas sociais, políticas e econômicas dos governantes não redimidos, então, são uma manifestação das forças do mal a que Deus se opõe. Essas forças – junto com o problema do pecado humano – são os inimigos que Deus enviou seu Filho para derrotar.

Por essa razão, nossa delimitação moderna entre o mal espiritual e o mal político, quando lida de volta no pensamento de Paulo, é um anacronismo. O “mundo mau” pode ser entendido como o mal demoníaco da escravidão em Roma e, também, a exploração econômica da população pelos governantes. Ambos foram movidos pelas políticas da liderança romana corrupta e, em última análise, foram ditados por forças espirituais.

A conclusão é óbvia: chamar um sistema de maligno é uma avaliação política e também teológica. Quando os cristãos negros de hoje olham para as ações de policiais, líderes políticos e governos e os declaram iníquos, estamos fazendo uma afirmação teológica, da mesma forma que Paulo fez. Somos compelidos, nas palavras de King, “a levar o evangelho da liberdade”. Nosso protesto não é antibíblico. É essencial para nossa análise da condição humana à luz da própria visão de Deus para o futuro. Sua visão pode aguardar um tempo determinado, mas está chegando (Hc 2.1-4).

Para mim e muitos outros, a aplicação dessas verdades é profundamente pessoal. Minha esperança acerca das forças policiais não é muito complicada. Eu quero viver sem medo. Quando sou parado por causa de um sinal de trânsito, fico com medo porque a polícia tem sido fonte de terror em minha vida, na de meus ancestrais e na de meu povo.

Como pai, temo que meus filhos e filhas sintam o mesmo terror. Esse pavor vem de um governo nacional que sempre considerou nossa pele perigosa.

Para alguns, meu medo pode parecer injustificado. Estou tentado a listar estatísticas sobre os negros e nosso tratamento nas mãos da polícia. Mas não acredito que as estatísticas convencerão aqueles que são hostis à nossa causa. Além disso, as estatísticas são desnecessárias para nós, que carregamos no coração a experiência de ser negro neste país.

Os Estados Unidos, historicamente e no presente, não nos protegeram. Antes, usaram a espada para incutir um medo que foi transmitido, de geração a geração, em lares e igrejas de negros. Esse pavor, entretanto, nunca teve a palavra final. Em vez disso, os cristãos negros se lembraram de não temer aqueles que só podem matar o corpo. Em nossos momentos melhores e mais cristãos, exigimos nossa primogenitura como filhos de Deus. Mas esses direitos não devem ser comprados ao preço de nosso sangue ou terror. Uma teologia cristã do policiamento, então, é fundamentalmente uma teologia da liberdade.

Esau McCaulley é pastor da Igreja Anglicana na América do Norte, professor assistente de Novo Testamento no Wheaton College e autor de Reading While Black: African American Biblical Interpretation as an Exercise in Hope (IVP Academic), do qual este ensaio é adaptado.

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As raízes da voz profética negra

Por que o Êxodo deve permanecer central para a igreja afro-americana.

Christianity Today August 24, 2020
Illustration by Matt Chinworth

Este é o último de uma série de seis ensaios de um grupo de estudiosos importantes que revisitam o lugar do “Primeiro Testamento” na fé cristã contemporânea. — Os editores

Eu tinha 11 anos quando assisti a um documentário sobre Martin Luther King Jr. e o movimento pelos direitos civis chamado Eyes on the Prize. Imagens de mulheres negras derrubadas ao chão por mangueiras de incêndio em Birmingham passaram diante dos meus olhos. Cães policiais atacaram as pessoas. Rostos brancos furiosos gritavam calúnias raciais para crianças negras que buscavam entrar em uma escola não segregada.

Crescendo na Igreja de Cristo da Hatchie Street, uma pequena igreja negra no sudoeste do Tennessee, ouvi sermões e estudei lições da escola dominical sobre a escravidão israelita no Egito. Depois de assistir Eyes on the Prize, ficou claro para mim que a sorte dos negros nos Estados Unidos era a mesma dos israelitas no Egito. Essa percepção me inspirou a seguir a tradição de Moisés, os profetas do Antigo Testamento e os juízes (a quem podemos chamar de “lutadores pela liberdade”), bem como o legado de Martin Luther King Jr. O Antigo Testamento fala contra o sofrimento e a opressão que os negros vivenciam nos Estados Unidos hoje, e a igreja negra—cada vez mais tentada a um evangelho de prosperidade e ao conforto da classe média—precisa permanecer enraizada nesse legado.

O poder de Êxodo

A história do êxodo manteve o poder na igreja afro-americana porque a narrativa fala muito prontamente sobre os problemas enfrentados por seus fiéis. Os afro-americanos encontraram no Êxodo, ao longo das gerações, um Deus que atende aos oprimidos que clamam por ele:

Por certo, tenho visto a opressão do meu povo no Egito. Tenho ouvido seu clamor por causa de seus capatazes. Sei bem quanto eles têm sofrido. Por isso, desci para libertá-los do poder dos egípcios e levá-los do Egito a uma terra fértil e espaçosa. É uma terra que produz leite e mel com fartura […]. (Êx 3.7-8)

Os afro-americanos leem sobre um Deus que se opõe aos poderosos que desumanizaram os filhos de Deus. Eles passaram a acreditar que Deus ouviu suas orações, assim como ouviu as orações dos israelitas: “Eu realmente vi a miséria do meu povo no Egito”. Esta é a linguagem da eleição e indica que os oprimidos são propriedade de Deus. Esse é Deus na história, que não apenas conhece a localização dos eleitos, mas conhece a qualidade de sua existência e vê sua escravidão como uma ilegalidade divina.

As congregações afro-americanas observam que Deus não apenas vê a miséria de seus eleitos; ele também ouve o clamor do povo: “Tenho ouvido seu clamor por causa de seus capatazes”. Ver e ouvir leva Deus a agir: “Por isso, desci para libertá-los”. O livro do Êxodo nos lembra que a ação libertadora é a resposta natural de Deus quando o oprimido sofre. Como Deus conhece a dor dos escravos israelitas, ele desce para julgar os opressores e libertar os oprimidos. A importância do Antigo Testamento—e, particularmente, do livro de Êxodo—para a igreja afro-americana é sua afirmação de que nosso Deus é um Deus que vê, ouve e age em nome dos aflitos.

É claro que os proprietários de escravos da era em que se incrementou o secessionismo por parte dos Estados Confederados da América entenderam que os escravos que conheciam a história do Êxodo encontrariam um poderoso recurso teológico para imaginar sua própria emancipação como um direito divino. Consequentemente, além de impedir que muitos escravos recebessem educação, os senhores cristãos que tinham interesse em converter seus escravos usavam a chamada “Bíblia dos escravos” intitulada Partes da Bíblia Sagrada, selecionada para uso dos escravos negros nas ilhas britânicas da Índia Ocidental. Essa Bíblia excluiu quase 50% do Novo Testamento e 90% do Antigo Testamento. Não surpreendentemente, quase todo o livro de Êxodo foi removido. Afinal, não seria difícil pôr os proprietários de grandes fazendas no papel de Faraó, enquanto os escravos afro-americanos podiam se identificar facilmente com os judeus escravizados no Egito. Os senhores de escravos brancos entenderam que livro poderoso esse poderia ser—e provou ser—entre as congregações afro-americanas.

Um legado de libertação

King, que muitos afro-americanos viam como o Moisés negro, definitivamente conhecia o sofrimento e a miséria dos negros. Ele nunca permitiu que sua educação excepcional dentro de um sistema educacional de supremacia branca o cegasse para a miséria negra. Como Moisés, o encontro genuíno de King com o Deus da libertação o moveu a agir para libertar seu povo de sua postura ajoelhada diante do trono intimidante da brutalidade branca do sul.

Em Never to Leave Us Alone: The Prayer Life of Martin Luther King Jr., Lewis Baldwin observa a influência do Antigo Testamento em King, que acreditava que os salmistas e profetas personificavam o ideal bíblico de ação ousada embasada em oração persistente. Baldwin escreve: “O líder dos direitos civis aparentemente tinha uma concepção biblicamente informada de oração, e ele encontrou nessas e em outras fontes da Bíblia Hebraica percepções sobre a essência da oração e apoio para sua visão da oração como uma conversa diária e uma caminhada com Deus”. Como Baldwin posteriormente estabelece, “Para King, o imperativo de orar veio não apenas de um senso de finitude pessoal diante de Deus, mas também de uma profunda consciência baseada na experiência religiosa afro-americana, especialmente nas tradições da igreja negra.”

A profunda imersão de King na tradição profética do Antigo Testamento treinou intensamente seus olhos para ver as massas de pobres afro-americanos que estavam sendo autorizados a se afogar no oceano de riqueza branca. Em vez de sua educação de classe média em instituições brancas o anestesiarem para a situação daqueles que estão presos na miséria da pobreza, King usou sua educação para liberar o poder de sua mente e o espírito dos profetas para libertar sua língua em defesa dos explorados.

Essa mesma sensibilidade para com o sofrimento dos deserdados estava profundamente presente no mentor e confidente de King, Howard Thurman. Em Jesus e os deserdados, Thurman conta uma história sobre a noite, quando menino, em que sua mãe o acordou para ver o cometa Halley. Sem palavras, no quintal, eles observaram o grande leque de luz se espalhar pelo céu. Quando Howard expressou medo de que o cometa pudesse atingir a Terra, sua mãe quebrou o silêncio e disse: “Nada vai acontecer conosco, Howard; Deus cuidará de nós.” Ele continua a escrever: “Eu vi muitas coisas desde aquela noite. Vezes sem conta, aprendi que a vida é dura, dura como o aço; mas, com o passar dos anos, o poder majestoso das palavras brilhantes de minha mãe voltou repetidamente, batendo seu canto rítmico em meu próprio espírito. Aqui estão a fé e a consciência que superam o medo e o transformam na força de lutar, de alcançar […] e não de ceder”.

Essa profunda convicção que Thurman herdou de sua mãe e avó era uma convicção profundamente enraizada no Êxodo e na tradição profética. Os oprimidos não tinham outra fonte de poder para apelar em meio ao sofrimento. Essa postura de olhar para cima é uma expectativa implícita de que o Deus da libertação descerá para enfrentar a miséria dos deserdados.

De egípcios a cristãos brancos

Obviamente, a história do êxodo não ajuda apenas os cristãos afro-americanos a interpretar sua história e experiência de opressão. Também os ajuda a interpretar seus opressores brancos, muitos dos quais se identificam como cristãos. Frequentemente, os cristãos brancos dizem aos afro-americanos que não conseguem entender a experiência dos negros. Cristãos brancos não podem entender o sofrimento dos negros porque eles não experimentaram servidão e exploração duradouras. Se os cristãos brancos devem entender a experiência da opressão negra, é preciso haver um desejo intencional de fazê-lo.

Êxodo diz à igreja negra que seus irmãos e irmãs cristãos brancos são como Moisés enquanto ele vivia na casa do Faraó como um herdeiro de privilégios. A narrativa do êxodo dá poucas indicações de que Moisés se interessou pela libertação de seus companheiros israelitas antes de seu misterioso encontro com Deus. Certamente, a educação de um príncipe egípcio não incluía aprender a se preocupar com os escravos que construíram os palácios e as pirâmides do Egito. Assim como Moisés foi condicionado a ignorar o sofrimento de seu povo, muitos cristãos brancos foram condicionados a ignorar a história de opressão dos afro-americanos. Mesmo a melhor educação para brancos frequentemente produz pessoas que afirmam ser “daltônicas”, o que equivale a ser historicamente cego para a longa história de opressão dos negros.

O que os afro-americanos aprendem com o Êxodo (e os profetas, as obras exílicas e a literatura pós-exílica) é que Deus não é daltônico. Deus ouve os gritos dos oprimidos, vê a opressão das pessoas e age. Quando Moisés conhece o sofrimento de seu povo, ele age decisivamente para sua salvação. A verdadeira compaixão leva as pessoas a agir em nome dos oprimidos, a ponto de colocar em risco a própria vida. Talvez os cristãos brancos tenham ignorado deliberadamente o sofrimento de seus irmãos e irmãs negros porque não querem pôr os próprios corpos em risco, ou mesmo arriscar a perda de afeto, aceitação e amor de outras pessoas brancas.

Retornando às raízes do Êxodo

A dissociação dos cristãos brancos do sofrimento dos negros dificultou a compreensão da igreja negra, impregnada dessa narrativa do Antigo Testamento, que luta pela liberdade em todo o movimento pelos direitos civis. O Êxodo foi a história mais influente que aguçou o apetite por liberdade em meio à opressão negra. No entanto, quando o movimento pelos direitos civis perdeu seu líder espiritual, King, a geração seguinte começou a buscar entrada política nos próprios sistemas de opressão ainda sob o controle da dominação branca. King agia como um profeta à margem do sistema de opressão. Mas, depois da morte de King, a igreja negra tornou-se menos orientada profeticamente.

Em vez de continuar a liderar a igreja negra para a terra prometida, muitos dos discípulos de King conduziram a igreja negra para trás, de volta ao palácio do Faraó de política segura, embora com status atualizado. A pura busca de poder político e riqueza material comprometeu a conexão total da igreja negra com o poder espiritual divino que inspirou King e os profetas do Antigo Testamento a arriscar a vida resistindo a sistemas políticos de opressão. Os pregadores negros achavam mais atraente atuar como políticos do que como profetas falando a verdade ousada aos sistemas dominantes de controle político.

Esses profetas que se tornaram políticos não conseguiram perceber que o poder branco não tinha compaixão ou preocupação em aliviar o sofrimento dos negros. Muitos líderes da igreja negra descobriram que atuar como políticos em vez de profetas lhes rendia a ajuda de bons brancos. Potenciais vozes proféticas negras foram aceitas em seminários brancos com bolsas de estudo de minorias no valor de 30 moedas de prata que eventualmente domesticaram o espírito profético que deu origem ao movimento pelos direitos civis. A tradição de pregação profética, que antes fornecia liderança corajosa à igreja negra, tornou-se caiada.

Muitos negros ascenderam a igrejas negras de classe média, lideradas por pastores treinados em instituições acadêmicas de classe média branca. Algumas igrejas negras de classe média começaram a selecionar pregadores que evitariam ofender os sentimentos da classe média negra. Todo o tempo, a igreja negra de classe média tornou-se menos conectada à subclasse negra. Gradualmente, a igreja negra de classe média teve uma crítica menos profética da estrutura de poder dos brancos e tornou-se mais dependente da agenda da supremacia branca com disfarce religioso.

No entanto, outros cristãos negros de classe média usaram suas posições de influência para a libertação das massas negras empobrecidas. Não é de surpreender que os sermões nessas igrejas tenham suas raízes na vasta extensão de histórias do Antigo Testamento sobre a libertação de Deus dos oprimidos da escravidão. Meninos e meninas negros ouviram sermões sobre Moisés, Ester, Josué, Sansão, Débora, Daniel, Neemias, Davi, Vasti, Gideão, Rute, Isaías, Jeremias, Amós e Miqueias—figuras heróicas lutando contra os sistemas opressores que escravizavam seu povo.

A igreja negra, antes enraizada em uma rica tradição de pregar e orar o Antigo Testamento, mostra sinais de estar sendo esticada em um cabo de guerra entre a classe média negra e a classe baixa negra. Como o especial da PBS “The Two Nations of Black America” deixou claro há mais de duas décadas, nós temos a maior classe média negra da história e a maior classe baixa negra da história. Os afro-americanos devem, agora, prestar atenção ao outro lado do racismo branco, que é o classismo negro.

Marvin McMickle, em seu livro Preaching to the Black Middle Class, vê essa divisão entre a classe média negra e a classe baixa como talvez o maior desafio para o pregador na igreja negra. Algumas igrejas negras de classe média têm se comprometido mais em permanecer conectadas ao sistema de riqueza dos brancos do que à subclasse negra. “Ai dos que estão à vontade em Sião”, escreve McMickle, citando Amós 6.1. Para que a igreja negra de classe média tenha credibilidade nas ruas, o púlpito negro deve mais uma vez atender às necessidades das massas negras.

King, é claro, não tinha medo de usar o púlpito onde quer que o encontrasse e de se basear em imagens dos livros de Êxodo, Isaías e Amós. Com uma história de pregadores como King e seus antepassados, a pergunta, hoje, é: será que a igreja negra de classe média se dedicará novamente a ver a miséria da subclasse negra oprimida? A classe média ouvirá os gritos dos oprimidos e desenvolverá estratégias para libertar seus irmãos e irmãs sofredores?

O Antigo Testamento nos obriga a ser movidos hoje com compaixão divina ao olharmos para as massas sofredoras de pessoas negras nos Estados Unidos. A igreja negra de classe média deve recuperar sua voz profética e retornar aos lugares de escravidão, declarando a liberdade aos cativos. Deus é um Deus de liberdade e ainda entra em sistemas opressores e traz as vítimas da opressão, a quem chama de seu povo. À medida que avançamos, podemos permitir que nossa mente liberada expresse, por meio de nossa boca liberada, as palavras que abalarão os alicerces da tirania e consertarão os sistemas construídos com base no sofrimento humano. A igreja negra deve manter seu legado herdado do Antigo Testamento como uma influência libertadora, com uma agenda divina, se quiser mais uma vez funcionar como uma instituição libertadora dentro de sistemas humanos injustos que ainda procuram escravizar.

Jerry Taylor é professor assistente de Bíblia, missões e ministério e é o diretor fundador do Centro Carl Spain de Estudos Raciais e Ação Espiritual na Abilene Christian University.

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Ideas

O Antigo Testamento grita contra a cultura do cancelamento

CT Staff; Columnist

A Bíblia apresenta personagens imperfeitos, chamados para fazer a vontade do Senhor.

Christianity Today August 24, 2020
Illustration by Mallory Rentsch / Source Images: WikiMedia Commons

O marcionismo é uma heresia, mas entendo por que Marcião a elaborou.

Desgostoso com o mal que assola o mundo e lutando com formas confusas como Deus é apresentado nas Escrituras, o teólogo do segundo século fatiou a Bíblia a seu gosto, excluindo todo o Antigo Testamento e, até mesmo, parte do Novo. Não posso aceitar o projeto de edição de Marcião, mas certamente percebo a tensão que o levou a desenvolvê-lo: o Antigo Testamento é difícil, cheio de histórias e pessoas complicadas. De muitas maneiras, seria mais fácil ir para fora do cânon a fim de escapar com segurança de suas passagens estranhas e sombrias.

Suspeito que o produto final de Marcião possuía uma clareza de que a versão integral francamente carece. Mas também suspeito que isso deixaria os cristãos muito menos equipados para lidar com a ambiguidade moral que não podemos eliminar do passado de nossa sociedade – ou de seu presente.

Este tem sido um tempo de iconoclastia. Os protestos desencadeados pela morte de George Floyd nas mãos de policiais de Minneapolis pegaram o impulso catártico de manifestações anteriores contra a brutalidade policial e a desigualdade racial. Os manifestantes exigiram a remoção de estátuas e bandeiras confederadas – ou, em muitos casos, simplesmente as vandalizaram. Então, o escrutínio aumentou. Há apenas três anos, o presidente Donald Trump foi amplamente ridicularizado por sua reflexão de que iconoclastas progressistas eventualmente perseguiriam George Washington ou Thomas Jefferson. Este ano eles fizeram exatamente isso. Monumentos de outras figuras históricas (incluindo Abraham Lincoln, Teddy Roosevelt e Ulysses S. Grant) foram demolidos, tiveram votação positiva para sua derrubada ou se tornaram objeto de debates polêmicos.

Esses conflitos não são fáceis de resolver. O que pensamos de alguém como Jefferson? Ele deve ser honrado ou deplorado? Ele escreveu sobre os direitos inerentes de toda a humanidade em palavras que inspiraram movimentos pela liberdade em todo o mundo, mas, ao mesmo tempo, escravizou centenas e estuprou Sally Hemings, engravidando-a quando ela tinha cerca de 15 anos.

Jefferson condenou a escravidão, mas não agiu para acabar com ela, mesmo rejeitando, como o colunista Noah Millman descreve, “uma grande herança de seu velho amigo, o nobre polonês e herói da Guerra Revolucionária Thaddeus Kosciusko, destinada à compra de escravos para dar-lhes a liberdade, junto com a terra, o gado e o equipamento agrícola para permitir que vivam a vida de independência rural, que Jefferson alegou favorecer em relação a todos os outros”. E, no entanto, apesar de tudo isso, o abolicionista Frederick Douglass considerou a Declaração de Independência de Jefferson “a chave da corrente do destino de [nossa] nação”, um documento de “princípios salvadores” aos quais devemos ser fiéis “em todas as ocasiões, em todos os lugares, contra todos os inimigos e a qualquer custo.”

Há uma agradável simplicidade ética na ideia de levar a faca afiada de Marcião a figuras históricas como Jefferson (que era, curiosamente, ele próprio um tanto marcionista). Jogá-lo fora por causa de seus pecados mais grosseiros ou encobri-lo com suas palavras maravilhosas? Não ousamos nos contentar com menos do que pureza ideológica. Um herói perfeito é o tipo mais confortável.

Os cristãos podem fazer melhor. O Antigo Testamento nos treinou para isso. Se Jefferson é a figura arquetípica difícil da história americana, seu análogo bíblico é certamente o rei Davi: o salmista apaixonado e poético que estuprou Bate-Seba. O que achamos de alguém como Davi? Não há a opção, aqui, de guardar as palavras e dispensar o homem, porque o homem está em toda a Bíblia. Repetidamente, os evangelhos reiteram que Jesus é o “filho de Davi” havia muito esperado, nascido na aldeia de Davi e destinado a se sentar no trono de Davi. Davi aparece no grande argumento do apóstolo Paulo sobre a justificação, em Romanos, e também faz parte da lista de Hebreus 11 dos heróis da fé (cheios de falhas). Em Apocalipse 22.16, Jesus confirma seu testemunho com uma autodescrição: “a raiz e o descendente de Davi, a brilhante estrela da manhã”. Ter uma visão elevada das Escrituras nos força a confrontar a complexidade moral de Davi junto com tantos outros personagens da Bíblia, sem descartá-los por causa de seus pecados nem encobrir esses mesmos pecados com suas realizações fiéis. Esse confronto serve de prática para um discernimento semelhante da história mais recente.

Além disso, não somos os primeiros cristãos a lidar com pessoas, histórias e ideias complicadas. A igreja primitiva lidou com isso com frequência. Muitos dos primeiros apologistas cristãos empregaram a religião e a filosofia da cultura pagã circundante para ajudar a compreender a nova fé cristã. O sermão de Paulo em Atos 17 é um exemplo disso. Ele faz referência a monumentos atenienses e incorpora percepções de poetas gregos, apontando para a Escritura. Da mesma forma, Agostinho aconselhou os cristãos a “reivindicar […] para nosso próprio uso” tudo o que encontrarmos “que seja verdadeiro e em harmonia com nossa fé”, onde quer que encontremos. “Toda verdade é a verdade de Deus”, afirma a lógica agostiniana. Podemos examinar nossa história atual com um olhar semelhante: crítico e distante por um lado, mas também receptivo a qualquer bondade e verdade que encontrarmos no outro.

Finalmente, a antropologia cristã básica também nos prepara para lidar com a tensão histórica. “Os guerreiros da cultura querem evitar […] dissonância cognitiva ao ver os fundadores como santos perfeitos ou pecadores irredimíveis”, escreveu recentemente o ex-editor da CT, Skye Jethani. “Eles não eram nem um nem outro”, continuou ele, o que deveríamos saber bem. As duas primeiras informações que a história cristã dá sobre a humanidade (Gênesis 1-3) é que fomos feitos à imagem de Deus e estamos sujeitos à queda. Fomos criados para o bem, mas, sem Cristo, somos cativos do mal (Rm 6.17-23). A compreensão dos seres humanos a partir desse princípio evita que se fique chocado ao encontrar o verdadeiro bem e o grande mal na mesma vida, como, de fato, encontramos ambos em nosso próprio coração (Rm 7.19).

Bonnie Kristian é colunista da Christianity Today, editora colaboradora da The Week, bolsista da Defense Priorities e autora de A Flexible Faith: Rethinking What It Means to Follow Jesus Today (Hachette).

Books

Como duas megaigrejas da Califórnia continuaram com os cultos

John MacArthur se posiciona contra a regulamentação, enquanto Greg Laurie encontra maneiras criativas de obedecer.

Christianity Today August 17, 2020
Edits by Mallory Rentsch / Source Image: Courtesy of Grace Community Church / Harvest Christian Fellowship Photo by Nicole Shanks

Duas igrejas da Califórnia estavam tão ansiosas para se reunir no último fim de semana que, quando seus cultos começaram, os fiéis explodiram em aplausos.

Em Sun Valley, os fiéis que enchiam o santuário de 3.500 lugares da Grace Community Church se levantaram e aplaudiram, alguns documentando o momento com seus iPhones, quando o pastor John MacArthur dava início à segunda semana consecutiva de cultos presenciais.

MacArthur – que se posicionou abertamente contra as igrejas que se submetem aos regulamentos governamentais acerca de cultos – disse que esse domingo foi “um dia muito especial para uma alegria mais abundante”, já que a congregação estava reunida presencialmente mais uma vez.

O pregador da Grace to You recebeu tanta atenção em razão de por sua postura – da postagem viral dos presbíteros no site da igreja a um segmento no programa Fox News de Tucker Carlson – que a igreja precisou adicionar mil cadeiras em espaços ao ar livre. Antes da pandemia, a soma dos frequentadores dos três cultos da igreja era, em média, de 8.000 pessoas. No domingo, a maioria dos participantes não estava usando máscaras, distanciamento social ou evitando contato. Como MacArthur disse a Carlson, eles “não compraram a narrativa”.

A congregação cantou “We Gather Together”, que MacArthur apontou ter sido escrita quando protestantes holandeses se reuniam para ir à igreja apesar de terem sido proibidos por seu rei. MacArthur pregou sobre o papel de Jesus como divisor e juiz, dizendo que, nos últimos meses, “Nunca ouvi tantas pessoas falando sobre a morte em um nível tão superficial. Você está falando sobre eternidade, inferno eterno ou céu eterno. ”

A uma hora de distância, em Riverside, Califórnia, os fiéis da Harvest Christian Fellowship foram recebidos com cartazes chamativos, em rosa e roxo, que diziam: “Sorria com os olhos (e use uma máscara)” e “Deixe espaço para sua Bíblia – e mais 1,5 metro.” Foi no terceiro domingo que Harvest se reuniu em uma tenda branca com metade do tamanho de um campo de futebol a fim de cumprir as ordens do estado, que restringiam o culto em locais fechados. Após a primeira semana de reunião sob a tenda, o pastor Greg Laurie disse: “Nossa igreja adorou”, então Harvest acrescentou um segundo culto matinal.

Ontem, voluntários escanearam as testas dos participantes com termômetros infravermelhos para medir a temperatura antes que entrassem na tenda, onde fileiras de seis cadeiras estavam espaçadas cerca de dois metros umas das outras. O uso de máscaras era obrigatório – embora, como em muitos lugares, nem todos as usassem adequadamente – e os sinais direcionavam os adoradores ansiosos a acenar em vez de tocar uns nos outros.

Laurie, líder de longa data da Calvary Chapel, cuja congregação de 15.000 membros aderiu à Convenção Batista do Sul há alguns anos, discutiu em seu sermão sobre como as pessoas tendem a responder à pandemia, à economia e à agitação social com raiva e frustração. Ele citou o debate sobre as máscaras como um exemplo de divisões. Ele disse à multidão: “Durante esta pandemia, Deus quer usar você. As pessoas estão com raiva e medo, portanto, você precisa procurar oportunidades para compartilhar o amor de Jesus onde quer que vá.”

MacArthur e Laurie lideraram suas respectivas congregações por cerca de 50 anos, à medida que se tornaram duas das maiores megaigrejas da Califórnia e seus ministérios se multiplicaram. Embora os cultos da Grace e da Harvest sempre tenham sido muito diferentes – ternos e música de órgão versus camisetas havaianas e bandas de louvor -, o contraste aumenta à medida que ambos encontram maneiras de adorar pessoalmente durante a pandemia do coronavírus.

Para muitos cristãos, a maneira como as igrejas se reúnem durante a pandemia não é apenas uma questão de estilo ou estrutura. Essas decisões refletem sua teologia, com líderes explicitando suas prioridades como igreja e o que eles acreditam que Deus deseja que façam em resposta às circunstâncias atuais.

A Califórnia reeditou as diretivas de confinamento no mês passado, enquanto o vírus se recuperava, ordenando que os locais de culto “interrompessem as atividades de canto e entoação em ambientes fechados e limitassem a participação em ambientes fechados a 25 por cento da capacidade de construção ou um máximo de 100 participantes, o que for menor.” Como aconteceu em Nevada, algumas igrejas entraram com processos, dizendo que a proibição é inconstitucional.

Os líderes da Grace se opuseram à ordem de ficar em casa, na Califórnia, enquanto ela se estendia até a primavera, mas concordaram em “se submeter aos propósitos soberanos de Deus” e permanecer on-line. Mas, algumas semanas atrás, sob os novos regulamentos e após 21 semanas de cancelamento de cultos normais, a resposta deles mudou. Os presbíteros de MacArthur e Grace postaram um texto com 2.200 palavras, “Caso Bíblico para o Dever da Igreja de Permanecer Aberto.

Em uma semana, 21.000 pessoas assinaram a declaração, concordando que “a honra que devemos justamente aos nossos governadores e magistrados terrestres (Rm 13.7) não inclui o cumprimento quando tais oficiais tentam subverter a sã doutrina, corromper a moralidade bíblica, praticar autoridade eclesiástica ou suplantar Cristo como cabeça da igreja de qualquer outra forma.”

Jonathan Leeman, um batista do sul que escreveu vários livros sobre fé e política, levantou preocupações em um post para a 9Marks, dizendo que a declaração de Grace não deixa muito espaço para líderes cristãos fiéis chegarem a outras conclusões para as próprias igrejas. “Diga: ‘Somos livres para fazer isso’ o quanto quiser”, disse Leeman. “Mas tome muito cuidado antes de dizer: ‘E você também tem de fazer isso’. Não sacrifique nossa liberdade espiritual por sua liberdade política.”

MacArthur, que tem 81 anos e comemorou 50 anos de ministério no ano passado, se preocupa que o nível de receio dos americanos com sua saúde física durante o COVID-19 tenha se tornado um prejuízo para sua saúde espiritual – e essa última determina seu destino eterno. O Grupo Barna descobriu que 1 em cada 3 cristãos praticantes parou de ir à igreja de qualquer forma durante a pandemia.

Ele expressou sua frustração com quão poucas grandes igrejas continuam a se reunir, apesar das regulamentações estaduais ou dos riscos do coronavírus. “Grandes igrejas ficarão fechadas até janeiro”, disse ele em sua atualização na sexta-feira. “Eu não tenho nenhuma maneira de entender isso a não ser que eles não sabem o que é uma igreja.”

A Igreja da Comunidade North Point, de Andy Stanley, com 38.000 participantes na área de Atlanta, foi a primeira grande megaigreja a adiar as reuniões de adoração aos domingos em seu prédio até 2021, embora a igreja ainda se reúna em grupos menores e pessoais que podem praticar o distanciamento social. A Igreja Summit, de 12.000 membros, de JD Greear, na Carolina do Norte, fez a transição para um modelo de igreja doméstica pelo restante do ano. A proporção de pastores que não preveem retornar às reuniões presenciais normais em 2020 saltou de 5%, no início de julho, para 12% na semana passada, de acordo com o Barna.

Durante o sermão de domingo, MacArthur sugeriu que as igrejas que fecham não são verdadeiras. “Nunca houve um tempo em que o mundo não precisasse da mensagem da verdadeira igreja”, disse ele. “Eu tenho de dizer ‘verdadeira igreja.’ Odeio pensar nisso, mas existem tantas formas falsas de igreja. Deixe-os fechar.”

A congregação riu e depois aplaudiu.

Alguns críticos questionaram por que a Grace Church não se reunia externamente ou ajustava suas reuniões internas para atender às diretrizes do departamento de saúde, em vez de recorrer a uma forma de desobediência civil. Outros mencionaram o risco de infecção, uma vez que os especialistas sugerem que os contextos religiosos, particularmente com grandes multidões que não praticam o distanciamento social, são muito suscetíveis, e se tornaram responsáveis por vários surtos recentes.

“Dadas as explosões em alguns lugares, as igrejas que reabriram têm seguido, em muitos casos, alguns padrões rígidos, mas, ao mesmo tempo, isso é suficiente?” O diretor executivo da LifeWay Research, Scott McConnell, disse ao Religion News Service (RNS), observando uma queda recente nas reaberturas de igrejas da Califórnia como casos de pico. “Acho que essas perguntas serão cada vez mais feitas.”

Phil Johnson, diretor executivo do ministério Grace to You, de MacArthur, disse em um tweet que mover as reuniões ao ar livre para cumprir os regulamentos do estado não era uma opção para a Grace devido ao tamanho da congregação e ao calor da Califórnia. Ele também disse: “você não precisa fechar a igreja inteira” só porque as pessoas podem pegar uma doença.

Laurie, cuja igreja pegou emprestada uma tenda gigante do evangelista Nick Vujicic para seu recente local de cultos, vê o cenário ao ar livre como “nossa mais nova resposta para manter as pessoas seguras na Califórnia”.

“Não precisamos ficar ao sol e fomos facilmente capazes de sentar em grupos distantes e ainda nos sentirmos como uma grande família feliz”, disse Laurie à CT. Os cartazes no culto reconheceram a mudança com uma atitude otimista: “Mesma Igreja. Nova Mensagem. Nova experiência.”

Laurie, 67, viu o lado bom dos ajustes promovidos pela pandemia desde o início. Ele celebrou o “despertar espiritual” que ocorreu on-line, à medida que mais espectadores acessavam as transmissões ao vivo de seus sermões. Um deles foi o presidente Donald Trump, e Harvest recebeu um aumento adicional no número de telespectadores quando Trump tuitou que assistia ao culto do Domingo de Ramos. (Laurie pertence ao conselho consultivo evangélico do presidente.) Até hoje, Harvest recebeu 80.000 profissões de fé on-line e enviou Bíblias para um quarto dos novos convertidos que se juntaram pela internet.

Laurie compartilha preocupações sobre igrejas fechadas com outros evangélicos. Ele disse acreditar que a igreja local não pode ser substituída pelo culto on-line e teme que o governo exagere na regulamentação do culto durante a pandemia. No entanto, ele também se manifestou contra mitigar o impacto do vírus.

“Vou ser honesto com você”, disse Laurie ao Los Angeles Times em abril. “Uma das coisas que me irritam é a maneira como algumas pessoas não estão respondendo de maneira adequada à ameaça real do coronavírus. […] Às vezes, elas estão simplesmente ignorando a situação, como se isso não nos tivesse sido pedido, e acho que devemos ter consideração pelos outros”.

Companheiros pastores do sul da Califórnia sugeriram que o fato de os líderes verem o coronavírus como uma ameaça contínua geralmente determina o nível de precauções que eles tomarão nas reuniões. A perspectiva tornou-se cada vez mais politizada, e o número de apoiadores de Trump que afirmam estar preocupados com as taxas de infecção e morte pelo vírus representam a metade dos que são críticos ao presidente e afirmam a mesma coisa.

Na primavera, Laurie tentou convencer os pastores a encerrar os cultos presenciais à medida que o coronavírus se espalhava. “Sei que você pode ver isso como um ato de grande fé, mas acho que, de muitas maneiras, você está pondo o Senhor à prova, muito mais do que confiando nele”, disse ele em um artigo do Wall Street Journal.

O pastor e reavivalista da Harvest também permanece sensível a como o coronavírus está se transformando em outra questão, gerando divisão e desacordo entre o corpo de Cristo. “Quando os cristãos se amam, eles são uma testemunha poderosa. Mas quando estão zangados uns com os outros, dão um testemunho fraco”, disse ele na mensagem de domingo. “O que precisamos agora é de menos indignação e mais proclamação do evangelho.”

Em uma pesquisa da LifeWay Research divulgada na semana passada, mais de um quarto dos pastores (27%) disseram que manter a unidade em meio a conflitos sobre a reabertura foi uma das maiores pressões que enfrentaram. Eles se preocupavam com a politização do uso de máscaras e o distanciamento social e como os diferentes membros de sua congregação se viam como resultado dessas medidas.

MacArthur reconheceu na sexta-feira que há membros da igreja que podem não se sentir confortáveis em reuniões internas ou podem querer usar máscaras e praticar distanciamento social. “Nós amamos você da mesma forma ao fazer as coisas que se sente mais seguro em fazer”, disse MacArthur, observando que máscaras e água seriam fornecidas nos novos assentos ao ar livre, onde a transmissão ao vivo foi projetada fora de um prédio do seminário.

Na maioria dos casos, os cristãos que temem que seu direito de adorar livremente esteja sendo retirado acreditam que este não é o momento para ser belicoso. MacArthur defende a decisão da Igreja de reabrir o suficiente para que esteja disposto a arriscar as ramificações legais ou buscar uma batalha legal, disse ele.

O Departamento de Saúde Pública do Condado de Los Angeles está investigando a Grace Church por não cumprir suas restrições ao culto e canto em ambientes fechados. “Estamos investigando relatos de que os serviços foram realizados em ambientes fechados”, disse o departamento em comunicado à CT na segunda-feira.

“Lembramos a todas as casas de culto, em consonância com outros setores empresariais que também tiveram de fechar as operações internas, que os serviços devem ser prestados ao ar livre ou virtualmente, apenas neste momento, devido aos níveis atuais de disseminação do COVID-19. Se os níveis de disseminação fossem muito melhores e o controle fosse sustentado, poderíamos voltar a reabrir operações internas limitadas para esses e potencialmente reabrir setores de negócios adicionais”.

N. T. Wright: A pandemia deve nos tornar humildes – e implacavelmente práticos

Não sabemos ao certo por que isso está acontecendo nem como parar. Mas as Escrituras nos chamam a sofrer com o Espírito de Deus e começar a trabalhar servindo aos outros.

Christianity Today August 10, 2020
Illustration by Rick Szuecs / Source images: RealPeopleGroup / Getty / Andre Ouellet / Unsplash / Cynoclub / Envato

Entre reportagens 24 horas por dia, entrevistas com especialistas em saúde pública e experts discutindo os prós e os contras de diferentes estratégias de combate a esse mal, dificilmente temos escassez de informações e abordagens sobre o COVID-19. No entanto, ainda há muitas perguntas que lutamos para responder com total confiança: por que isso aconteceu? O que devemos fazer em resposta? E onde está Deus nisso tudo? Em God and the Pandemic: A Christian Reflection on the Coronavirus and Its Aftermath, o teólogo e autor N. T. Wright mostra como as Escrituras falam de nossa confusão e incerteza. Andy Bannister, diretor do Solas Centre for Public Christianity, sediado na Escócia, conversou com Wright sobre seu livro.

Muitos cristãos já escreveram livros sobre a pandemia — de John Lennox a John Piper, e até pessoas com outros nomes que não John. O que o inspirou a contribuir com seu próprio livro?

Em março, a revista Time me perguntou se eu escreveria um artigo sobre a pandemia. Ele recebeu um título bastante provocador: “O cristianismo não oferece respostas sobre o coronavírus. Não é seu papel oferecer”. Eu queria dizer que isso nos remete a Romanos 8, onde lemos que o Espírito geme em nós com gemidos inexprimíveis (v. 26) — é extraordinário Paulo dizer isso. E o que isso me diz é que devemos ser humildes, sem acreditar que precisamos saber todas as respostas.

Depois que o artigo foi publicado, comecei a receber feedbacks. As pessoas me enviavam e-mails para perguntar: “Como você pode dizer isso?” E fui informado sobre o que estavam dizendo no Twitter (eu nunca olho o Twitter). Durante todo o tempo, eu continuava ouvindo as pessoas usarem as Escrituras de uma maneira que parecia menos do que totalmente adequada. O livro é uma tentativa de explorar como realmente as Escrituras, em todo seu fluxo e sua narrativa, falam das circunstâncias que estamos enfrentando.

Quando o COVID-19 chegou, parece que muitos foram pegos de surpresa. Você acha que a igreja ocidental vive com conforto e segurança há tanto tempo que esquecemos como lidar com as trevas, o sofrimento e a crise?

Absolutamente! Eu estava conversando com um pastor veterano há algumas semanas sobre isso e ele comentou: “Você sabe, Tom, não lamentamos muito bem. Não estamos acostumados a isso. Mas também não comemoramos terrivelmente bem. O que mais parecemos fazer é ter complacência.” E acho que ele está certo. Continuo ouvindo os cristãos perguntando: “Isso pode ser o fim do mundo?” E quero lembrá—los de que coisas assim aconteceram repetidas vezes. Por exemplo, em 1917-18, houve a grande pandemia de gripe espanhola, durante a qual as igrejas em algumas partes do mundo foram fechadas por um ano. Esquecemos que já passamos por coisas assim antes.

Além disso, a minha geração, a de baby boomers, que cresceu após a Segunda Guerra Mundial, nunca viveu uma guerra em seu território. Não tivemos uma pandemia. Claro, tivemos algumas crises econômicas, mas conseguimos resistir a elas, mais ou menos. Então, apenas nos confundimos e continuamos como se nada de ruim fosse acontecer. Esquecemos a história.

Fiquei fascinado quando reli recentemente as cartas de Martinho Lutero, uma das quais cito no livro. Ele teve de lidar com esse tipo de poucos em poucos anos, seja em sua vida ou na de pessoas de cidades vizinhas que gritavam: “Socorro! Temos uma grande epidemia. Pessoas estão morrendo. O que fazemos?”. Lutero fala sobre obedecer às regras relativas ao uso de medicamentos, ajudar onde for possível, e não atrapalhar transmitindo a doença a outras pessoas, se você estiver infectado. Ele era muito pragmático, e dizia efetivamente: é desse jeito que lidamos. Não façamos uma grande confusão teológica sobre isso.

Seu livro é baseado em muitos temas do Antigo Testamento, especialmente de Salmos e Jó. Em relação a esse último, você argumenta que “parte do ponto de Jó é precisamente seu caráter não resolvido”. Você acha que os cristãos de hoje parecem ter dificuldades com a ambiguidade porque não têm uma base mais firme no Antigo Testamento?

Creio que o Novo Testamento também tem espaço para ambiguidade. Há muitas passagens no Novo Testamento que terminam com uma espécie de reticências seguidas de ponto de interrogação, porque isso é chamado de viver pela fé.

Em geral, creio que parte do nosso problema é o racionalismo dos últimos duzentos ou trezentos anos no mundo ocidental, que foi absorvido pela igreja porque os críticos racionalistas do cristianismo disseram coisas como: “Ah, olha, a ciência moderna nos mostra que o cristianismo é falso!” Em resposta, os cristãos racionalistas disseram: “Não, vamos mostrar como tudo é completamente racional!” Isso pode nos levar a querer ter a resposta para tudo e, por isso, queremos dizer coisas como: “Porque Deus é soberano, ele deve ter feito isso deliberadamente ou, pelo menos, permitido deliberadamente”. Pensamos que deveríamos ver o que ele está fazendo. Mas realmente não acho que recebemos dele esse tipo de acesso.

Um de meus trechos favoritos no Novo Testamento está na carta de Paulo a Filemom sobre o escravo Onésimo. Ele escreve: “Ao que parece, você perdeu Onésimo por algum tempo para ganhá-lo de volta para sempre” (1.15). Em outras palavras, Paulo estima que ele possa ver o que Deus estava fazendo nessa situação. Mas ele não diz isso definitivamente.

Há uma humildade aqui da qual necessitamos. Agora, essa postura pode se transformar em uma atitude de “Não sabemos nada, então quem se importa?” Isso também não seria sensato, porque recebemos orientações. Mas conhecer todos os detalhes está acima da nossa capacidade. É trabalho de Deus. Nosso trabalho, quando Deus nos permite saber o que temos de fazer nessa situação específica, é seguir em frente.

Ao falar sobre os evangelhos, você enfatiza o exemplo de Jesus parado no túmulo de Lázaro, chorando. O que você poderia dizer a alguém que não é cristão, que está lutando com o problema do sofrimento e que pergunta: “Que benefício traz um Deus chorar? Eu posso chorar. Qualquer um pode chorar. O que precisamos é de ação; precisamos de algo feito! Como Jesus chorando ajuda?”

Há muita ação na história e a ação cresce das lágrimas. Como costuma acontecer, as lágrimas nos evangelhos às vezes são o elemento crucial. O que eles mostram é que o Deus que criou o mundo, que se tornou humano na pessoa de Jesus de Nazaré, não está sentado em algum lugar do andar de cima, olhando para baixo e dizendo: “Ok, eu vou resolver sua bagunça”. Pelo contrário, ele é o Deus que vem, suja as mãos e perfura as mãos para estar onde estamos e nos resgatar de lá. É profundamente reconfortante saber que, quando estou sofrendo, como Paulo diz em Romanos 8, Jesus está sofrendo comigo, e o Espírito Santo está sofrendo dentro de mim. E esse é um dos elementos que definem a fé cristã como distinta de qualquer outra cosmovisão que eu conheça.

O que o restante do Novo Testamento — e em particular o papel do Espírito Santo — tem a nos ensinar sobre nossa resposta à pandemia?

Romanos 8, que acabei de mencionar, é uma das mais grandiosas passagens de toda a Bíblia. Quando eu estava trabalhando como bispo, se estava entrevistando pessoas para trabalhos paroquiais, às vezes perguntava: “Qual é o seu texto bíblico da ilha deserta?” E para dificultar, eu acrescentaria: “Você já tem João 20 e Romanos 8, então não as mencione. Essas são óbvias demais”.

Romanos 8 é cheia de glória. Está cheia de salvação. Está cheia da obra do Espírito. É fácil se deixar levar, no entanto, e imaginar que, depois de atravessarmos as partes difíceis de Romanos 7, estaremos navegando bem até a afirmação de Paulo de que nada pode nos separar do amor de Deus (8.38-39). Mas você ainda precisa atravessar o túnel escuro de Romanos 8.18–30, especialmente os versículos 26 e 27, que falam do Espírito intercedendo por nós em nossa fraqueza.

Quando o mundo está o caos, como está em geral, mas particularmente em momentos como agora, seria muito fácil imaginar a igreja se afastando e dizendo: “Que pena o mundo estar tão bagunçado. Mas pelo menos sabemos as respostas”. Mas não, Paulo diz que, quando o mundo está gemendo com dores de parto, então nós mesmos — que temos as primícias do Espírito, a agitação da nova criação de Deus dentro de nós — gememos enquanto aguardamos nossa adoção como filhos e filhas, a redenção de nossos corpos (Rm 8.23).

Você pode dizer, ok, então a igreja compartilha o caos em que o mundo está, mas certamente Deus sabe o que está fazendo. Bem, de certa forma, sim, Deus sabe o que está fazendo. Mas aqui encontramos o mistério do Deus trino, porque Paulo diz que, naquele exato momento, o Espírito geme dentro de nós com gemidos inexprimíveis. Além disso, em referência ao Salmo 44, um dos grandes salmos de lamento, Paulo diz que o Deus que perscruta o coração conhece a mente do Espírito, porque o Espírito intercede pelo povo de Deus de acordo com a vontade de Deus (Rm 8.27). Em outras palavras, Deus Pai conhece a mente do Espírito. Mas a mente do Espírito é a mente que não tem palavras para se manifestar sobre como as coisas estão terríveis agora.

Tudo isso é muito estranho. Mas o que penso é o seguinte: para resgatar o mundo, Deus vem na pessoa de seu Filho a fim de assumir sobre si o peso do pecado. E Deus vem na pessoa do Espírito para ser aquele que geme na igreja, no lugar onde o mundo está sofrendo. É assim que Deus passa, então, por essas dores de parto, do atual estado de horror e vergonha do mundo para a salvação — a nova criação total, que é o que nos é prometido.

A ideia do luto e do gemido do Espírito me leva de volta a algo que você mencionou anteriormente: lamento. Ao longo do livro, você diz que precisamos “abraçar o lamento”. Isso é algo de que esquecemos um pouco na igreja moderna? Se sim, como o redescobrimos?

Sim, penso que alguns de nós nos esquecemos. Para aqueles de uma tradição em que usamos os salmos o tempo todo, ajuda que lamentemos com bastante frequência. Quando estou orando os Salmos, dia após dia, frequentemente encontro um dos salmos de lamento — e muitas vezes é disso que preciso, porque essas coisas ruins estão acontecendo na minha vida.

Em outras ocasiões, posso encontrar salmos de lamento quando pessoalmente estou me sentindo bastante alegre. Então, como exercício espiritual, tento pensar na situação das pessoas que conheço em todo o mundo: amigos meus ou pessoas que vi na televisão ou nos noticiários que estão em uma situação terrível — pessoas em um campo de refugiados horrível e pobre, ou qualquer que seja o caso. E eu oro os salmos de lamento tentando abraçá-los no amor de Deus.

Precisamos lembrar de que o lamento não é apenas para a Quaresma. Também está incorporado no Advento, enquanto nos preparamos para o Natal. Essas são estações que podemos usar para desenvolver liturgias de lamento que trazem a dor do mundo à presença de Deus, usando salmos de lamento — como os salmos 22, 42 e 88 — que prefiguram o que Jesus orou na cruz: “Meu Deus meu Deus, por que me abandonaste?” (Mt 27.46). Às vezes, essas orações nos mostram a luz no fim do túnel. E, às vezes, como Salmos 88, não mostram. Ficamos no escuro. E há uma sensação de que Deus está conosco nessa escuridão.

No final do livro, você fala sobre a igreja e sua resposta a várias ordens de lockdown. Você argumenta que nossa disposição em suspender reuniões presenciais e realizar cultos on-line pode ter acidentalmente reforçado a ideia secular de que a fé é uma atividade privada. Como navegar pela tensão entre o chamado à adoração corporativa e a importância da saúde pública?

Começo com o argumento de Lutero de que não devemos espalhar a infecção. Isso é irresponsável. É brincar com a vida de outras pessoas. E, se amamos mais os edifícios de nossa igreja do que nossos vizinhos, ai de nós. O fato é que a maioria das igrejas no Reino Unido são prédios antigos, o que torna muito difícil limpá-las profundamente. E levo isso muito a sério.

Mas, por outro lado, temo que a igreja on-line possa facilmente nos fazer dizer: “Oh, não precisamos nos encontrar pessoalmente, porque esses são assuntos espirituais”.

Então você pode adorar a Deus em seu quarto, em seu pijama, tanto quanto em qualquer outro lugar? Bem, em certo sentido, você pode. Mas o cristianismo é um esporte em equipe. É algo que fazemos juntos. Pense no fruto do Espírito: amor, alegria, paz, paciência, amabilidade, bondade, fidelidade, mansidão e domínio próprio (Gálatas 5.22–23). Todas são coisas que fazemos juntos. Você não pode praticar essas virtudes separadamente uma da outra. E, assim, quanto antes voltarmos juntos, com sabedoria, melhor.

Quanto a receber a Eucaristia, sim, podemos fazê-lo por vídeo, mas também existe um sentimento de jejum, privação e exílio, porque o corpo de Cristo — a família maior do povo de Deus — não está fisicamente presente conosco.

Há muito tempo penso que a resposta mais importante ao mal e ao sofrimento não são palavras, mas ação, mesmo ações que podem custar caro. Jesus modelou isso para nós. Assim, à luz do sofrimento causado pela pandemia: o que os cristãos deveriam estar fazendo agora? Como, então, devemos viver?

Há uma passagem fascinante em Atos 11, na qual os discípulos de Antioquia ouvem de um profeta que haverá fome (v. 28). Eles não respondem: Oh, poxa, o que isso pode significar? Deus está zangado conosco? Isso significa que o Senhor está voltando? Não, eles são muito práticos. Eles perguntam: quem estará em pior situação? o que nós podemos fazer para ajudar? E quem devemos enviar? O resultado é que Paulo e Barnabé são enviados para Jerusalém com dinheiro para a igreja pobre (v. 29–30).

É semelhante ao início de João 9, a história do homem que nasceu cego. Jesus é implacavelmente prático e desencoraja seus discípulos de perguntar de quem foi a culpa ou se algum pecado era o responsável (v. 3). Na verdade, não foi culpa de ninguém. A questão importante é o que Deus quer que façamos em resposta.

Portanto, creio que devemos começar com nossos vizinhos, amigos e familiares, perguntando quem podemos ajudar, fornecendo comida, ferramentas ou suprimentos médicos. Talvez nossa igreja possa se envolver com algo como administrar um banco de alimentos. Em resumo, devemos perguntar: o que podemos fazer?

Em seu maravilhoso livro Dominion: How the Christian Revolution Remade the World, o historiador Tom Holland aponta que muitas coisas que a igreja e somente a igreja costumava fazer agora foram assumidas pela sociedade secular em geral. Assim, muitos médicos e enfermeiros que não se autodenominavam cristãos adotaram esse forte imperativo de cuidar das pessoas, mesmo ao custo potencial de sua própria vida. Isso é nobre.

Mas, no mundo antigo, foram apenas os cristãos que fizeram isso. Então, de certa forma, parte desse ideal cristão se espalhou pelo mundo. E devemos agradecer a Deus por isso. Mas, na igreja, desde o início temos feito coisas como fornecer remédios, cuidar dos pobres e investir na educação. Eles estão arraigados no DNA da igreja. Portanto, os cristãos devem reivindicar essa tradição e se apegar a ela — e não apenas quando há uma pandemia.

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A vergonha não pode consertar o racismo. Mas a culpa pode.

Culpa é sobre ação com um caminho claro para a redenção. A vergonha nos deixa presos em nossos pecados.

Christianity Today July 31, 2020
Illustration by Mallory Rentsch / Source Images: José Martín Ramírez Carrasco / Alejandro Luengo / NordWood Themes / Felipe Pelaquim / Unsplash

[Read in English]

Nos dias seguintes à morte de George Floyd, nas mãos da polícia de Minneapolis, ocorreu uma rápida substituição nos meus feeds de mídia social. Várias atualizações da vida de meus entes queridos apareceram. Entraram em minha linha do tempo novos compartilhamentos de relatos de estranhos, publicações sobre disparidades raciais no policiamento e sobre o racismo nos Estados Unidos de maneira mais ampla.

Inicialmente, fiquei emocionada ao ver isso. Escrevi sobre policiamento, incluindo sua dinâmica racial, durante quase uma década. Ao longo do tempo, sempre que o entusiasmo por mudar nosso sistema de justiça criminal diminuiu, perguntei por quê e me questionei se os americanos brancos jamais assumiriam um compromisso duradouro com a reforma. Talvez desta vez fosse diferente e esse compromisso tivesse ocorrido.

Mas, então, a conversa mudou. Informados por fontes como a Fragilidade Branca de Robin DiAngelo, que liderou as listas de best-sellers durante todo o verão, os posts desenvolveram um tique de vergonha. Um post popular, em particular, me impressionou. A própria imagem exige nuances e discrição ao lidar com o racismo. Depois, há a legenda. Os brancos “nunca podem ‘acertar’ nesta conversa”, diz o texto. “Os brancos são os opressores e se beneficiam da própria opressão — promover justiça racial ‘certa’ é, por definição de nossa brancura, impossível.”

Comecei a perceber esse tipo de discurso por toda parte. Cristãos brancos bem-intencionados, em busca de justiça racial, começaram a falar do racismo como um pecado irreparável, adotando a linguagem de nossa conversa nacional sobre raça. Eles falavam do racismo como uma mancha na alma dos brancos que não pode ser lavada. Embora raramente seja tão franco quanto essa legenda, grande parte do conteúdo que encontrei se reduziu a basicamente a: “Pessoas brancas como você e eu somos, inerentemente, inalteráveis e vergonhosas”.

Essa rejeição da redenção me perturbou. O racismo, é claro, é um erro horrível. Foi e continua sendo um grande mal em nosso país. Desvaloriza as pessoas criadas à imagem de Deus, pessoas pelas quais Cristo morreu. É insidioso e é usado para justificar toda uma série de outros pecados. Mas isso não nos torna irredimíveis e, quando falamos como se fôssemos, diminuímos a obra de Cristo.

Se cremos que Deus nos livra do mal (Rm 7.24-25) e nos afasta de nossas transgressões como o oriente dista do ocidente (Sl 103.12), se acreditarmos que somos transformados em novas criações em Cristo (2Co 5.16-19), não falaremos sequer do racismo como uma mancha permanente em nós mesmos ou em outras pessoas. O racismo é mais poderoso que o sangue de Cristo? O racismo é o único erro que Jesus não derrotou? Se não é — e eu estou dizendo que não é porque nenhum mal é maior que Cristo (1Co 15.54-57) — então nosso confronto com o racismo deve refletir essa verdade.

Por que os cristãos agiriam de outra maneira? Suspeito que o culpado seja a crescente fixação de vergonha por nossa sociedade e nossa própria adoção de seu vocabulário e suas suposições.

Para entender a natureza e o poder da vergonha, considere três contrastes com a culpa. Primeiro, a culpa é sobre ação, enquanto a vergonha é sobre identidade. A culpa diz: “Você fez uma coisa ruim.” A vergonha diz: “Você é uma pessoa má.” Segundo, a culpa é geralmente individual e a vergonha é comunitária; a vergonha sujeita você ao julgamento e à exclusão da multidão. Terceiro, a culpa permite um caminho claro para a redenção por meio do arrependimento, mas nossa cultura individualista não tem meios de restauração para quem se envergonha, como o ex-editor da CT Andy Crouch habilmente explicou. Assim, a culpa pode nos motivar a uma transformação positiva, mas a vergonha ancora no desespero e se correlaciona com o vício, a violência e o suicídio.

Responder ao racismo com vergonha comete o erro teológico de reduzir o alcance da redenção. Mas isso não é tudo. Em uma ironia cruel, também conta uma história que desencoraja a verdadeira busca da justiça racial.

A história de vergonha diz que todos os americanos brancos se beneficiam de sistemas racistas e são, portanto, como diz a legenda, “opressores” que “por definição” não podem “acertar a justiça racial”. “Não precisamos subestimar a gravidade ou a sistemática natureza da injustiça racial em nosso país para reconhecer como esse enredo deixa os americanos brancos em um vínculo inextricável: como não podemos mudar nossa identidade, sempre seremos vergonhosos.

Algumas pessoas, ouvindo essa história, simplesmente a rejeitam. Eles negarão a premissa da história de injustiça racial, como um meio de escapar de sua conclusão de vergonha inevitável. Outros reagirão embarcando em uma penitência permanente de auto-educação e defesa antirracista. Isso parece bom no Instagram, mas — muito parecido com a cultura de bem-estar de autoajuda com que se assemelha estranhamente — não é motivado pelo amor e pela fome de justiça por nossos vizinhos e familiares em Cristo. É autofocado, performativo (Mt 6.5) e terapêutico, melhor para não se sentir uma pessoa má do que realmente promover a justiça. A maioria, porém, exausta pela vergonha, não fará nada. Isso é “psicologia básica”, argumenta o autor Fredrik deBoer: “As pessoas precisam sentir que seus esforços têm alguma possibilidade significativa de criar mudanças positivas”. Por que buscar mudanças se é impossível?

“Mas para Deus tudo é possível”, disse Jesus (Mt 19.26). Em vez de vergonha, podemos repudiar o racismo com a convicção de Paulo em 1Coríntios 6 (parafraseada): “Você não sabe que os transgressores não herdarão o reino de Deus? Não se iluda! Os racistas não herdarão o reino de Deus.” E, então, aos nossos companheiros cristãos e a nós mesmos, acrescentamos: “E é isso que alguns de vocês costumavam ser. Mas você foi lavado, santificado e justificado em nome do Senhor Jesus Cristo e no Espírito de nosso Deus.” Em Cristo, já somos redimidos. Ainda resta mostrar nossa redenção como algo real, como Paulo acrescenta, não agindo como antes, mas glorificando a Deus e, no Espírito, agindo como as novas criações que nos tornamos e que amam a justiça.

Bonnie Kristian é colunista da Christianity Today, editora colaboradora da The Week, bolsista da Defense Priorities e autora de A Flexible Faith: Rethinking What It Means to Follow Jesus Today (Hachette).

Traduzido por Maurício Zágari

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Culture

Ciência e Escrituras concordam: cantar eleva nosso espírito

Por que os cristãos cantam mesmo quando a esperança parece perdida.

Christianity Today July 31, 2020
Source Image / Priscilla Du Preez / Unsplash

Nós jantamos apressadamente, deixamos a lavagem da louça para mais tarde e nos aconchegamos em torno de um iPad na mesa da cozinha. Estava na hora de uma apresentação de músicas da Disney e minha família, que é apaixonada por música, não queria perder. A verdade é que, na maioria dos dias da quarentena, nossos dispositivos Amazon Echo têm tocado listas de reprodução do Spotify, de "Hamilton" a "High School Musical", passando por trilhas de filmes da série "Descendentes". Adoramos música e dança, e nossa casa reflete isso, mesmo que tenhamos preferências musicais muito diferentes.

A música tem algo que eleva nosso espírito em épocas difíceis. Vimos cenas de italianos em pé em suas varandas, cantando canções folclóricas e óperas – e, sem dúvida, também assistimos a algumas paródias! Lembro de uma cena, passada em uma rua inglesa, em que um homem bem-intencionado tentou liderar seus vizinhos em uma emocionante canção de pub, a partir de seu quintal, e foi recebido com gritos para que ficasse quieto. Quando nos sentimos tristes, nosso impulso é cantar, apesar dos vizinhos irritados.

O sociólogo Randall Collins argumenta que os humanos buscam algo que ele chama de “energia emocional”, isto é, um “sentimento de confiança e coragem para agir, além de ousadia para tomar iniciativa”. Ganhar mais energia emocional, de acordo com Collins, é o objetivo da interação social. Os pesquisadores James Wellman Jr., Katie E. Corcoran e Kate Stockly-Meyerdirk argumentam que o que Collins chama de “energia emocional” pode “representar principalmente a ocitocina”, uma substância química associada ao bem-estar. Quando “as taxas de ocitocina aumentam, os níveis de estresse diminuem e a pessoa experimenta sentimentos de amor, calma, confiança e motivação para interagir socialmente”. Algumas atividades humanas levam ao aumento nos níveis de ocitocina, mas a maioria delas envolve toque físico, algo que está em falta nas sociedades ao redor do mundo durante a crise do COVID-19.

Então, o que fazemos sem toque físico e interação social? Nós cantamos. De acordo com o mesmo trio de pesquisadores, estudos mostram que “após uma sessão de canto em grupo, o nível de ocitocina aumentou significativamente nos cantores”. Cantar faz com que nos sintamos melhor. A ciência, como se vê, concorda.

Os antigos hebreus também concordariam. Em seu hinário, o livro de Salmos, eles fazem elogios e petições, exprimem lamentos e tristezas e clamam por atenção e ação da parte de Deus. Mas eles não estavam simplesmente cantando para se sentir melhor, como um ato de catarse ritual. Na oração e no cântico, eles elevavam a alma a Deus, seu Deus de aliança – o único soberano sobre a criação, que se unira a eles em amor. Aprendemos com os antigos hebreus que o poder do canto não está simplesmente na música, mas em quem é o destinatário da sua canção.

Séculos depois que os salmos foram escritos, dois mestres foram presos em meio a uma viagem, espancados e lançados na prisão. Eles faziam parte da primeira geração de seguidores de Jesus, o Messias, convencidos de que ele era de fato o Filho de Deus, o Deus de Israel que veio reinar como rei. Crucificado pelos romanos, ele havia sido elevado para ser o Senhor de todo o mundo. As cadeias de uma prisão romana em Filipos não conseguiram reprimir a esperança daquela dupla. E foi assim que Paul e Silas começaram a cantar, à meia-noite, quando tudo estava escuro e as perspectivas eram sombrias. Os cristãos cantam como se fosse manhã mesmo quando é meia-noite.

Cantar tornou-se uma marca das comunidades cristãs primitivas. Várias décadas após a morte de Paulo, um governador regional chamado Plínio escreveu ao imperador Trajano que os cristãos se reuniam em determinado dia da semana e cantavam hinos a Cristo como a um deus. Os cristãos cantam no culto semanal e nas celas sombrias da prisão, seja quando os corações estão animados, seja quando a esperança parece perdida.

Nós, cristãos, não cantamos simplesmente porque somos felizes; cantamos porque somos pessoas cheias de esperança. Permanecemos firmes diante do medo, à sombra da morte, no meio do sofrimento e da dor. Em tudo somos atribulados, mas não angustiados; perplexos, mas não desanimados. Perseguidos, mas não desamparados; abatidos, mas não destruídos. Cristãos são aqueles que acreditam que, porque Jesus ressuscitou dos mortos, o pior dia não será o último. Por isso, cantamos. E convidamos você a cantar junto.

Glenn Packiam é pastor sênior auxiliar da New Life Church, em Colorado Springs. Este artigo explora temas de seu livro Worship and the World to Come: Exploring Christian Hope in Contemporary Worship (IVP Academic).

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Como ‘A Bênção’ (‘The Blessing’) viralizou em todo o mundo

Cem corais virtuais cantaram a conhecida bênção do Antigo Testamento durante a pandemia.

Christianity Today July 31, 2020
Photo Courtesy of Elevation Worship / Edits by Mallory Rentsch

Apenas algumas semanas antes de a pandemia de coronavírus fechar os EUA, Kari Jobe realizou uma sessão de composição com o marido, Cody Carnes, junto com Steven Furtick e Chris Brown, do Elevation Worship. Juntos, eles tocaram uma das bênçãos mais conhecidas da Bíblia, que está em Números 6.24–26:

Que o Senhor o abençoe e o proteja. Que o Senhor olhe para você com favor e lhe mostre bondade. Que o Senhor se agrade de você e lhe dê paz.

Quando eles apresentaram “The Blessing” [“A Bênção”] em uma igreja da Elevation Church, perto de Charlotte, Carolina do Norte, em 1º de março, Jobe disse aos fiéis que as letras representam “o coração do Pai sobre nós como seus filhos” e os convidou a receber a música como “uma bênção para você, sua família e seus filhos”.

Eles não tinham ideia de quantos cristãos gostariam de ouvir e cantar essas palavras quando a pandemia se espalhasse nos meses seguintes. Em apenas cinco meses, “A Bênção” tornou-se um sucesso no topo das paradas e uma sensação viral cantada por mais de 100 corais virtuais em todo o mundo.

Uma versão em português de “A Bênção” foi gravada por André Aquino e Ana Paula Valadão.

“Como essa música é baseada nas Escrituras, a mensagem é atemporal, e queríamos divulgá-la o mais rápido possível, sabendo o efeito imediato que isso poderia ter no coração e no espírito das pessoas, como aconteceu conosco”, disse Jobe ao The Christian Beat. “Deus sabia que seria algo a que poderíamos nos apegar durante uma momento de nossas vidas cheio de incertezas e incógnitas.”

O vídeo de 12 minutos da apresentação ao vivo na Elevation estreou em 6 de março e tem mais de 21 milhões de visualizações. Um desses primeiros espectadores foi Alan Hannah, pastor assistente da Allegheny Center Alliance Church, em Pittsburgh, que ajudou a organizar o primeiro coral virtual para fazer o cover da música.

Inspirado em parte pelos cantores dos estúdios de Nashville, cujas gravações de celular de “It is Well With My Soul” obtiveram 1,3 milhão de visualizações no YouTube, Hannah e o colega pastor de Pittsburgh Jason Howard, da Amplify Church, convidaram os líderes locais para participar, cada um gravando a si mesmo cantando “A Bênção”.

Quase 30 igrejas contribuíram para a versão final, lançada no domingo de Páscoa. A idéia era “unir-se como igreja e cantar essa música sobre a nossa cidade como uma bênção em um momento de incerteza e medo”, disse Hannah.

Sua compilação lançou uma tendência global. Dentro de 24 horas de sua estreia, “The Pittsburgh Blessing” chamou a atenção de Tim e Rachel Hughes, pastores da Gas Street Church, em Birmingham, Inglaterra.

Os Hughes contataram as igrejas e ministérios de suas mídias sociais para montar um coral virtual que representaria o Reino Unido. A “Bênção do Reino Unido” estreou em 3 de maio. “Foi lindo ver como tudo aconteceu”, disse Tim Hughes ao Premier Christianity.

Mais de 100 corais virtuais criaram versões da música, declarando as bênçãos de Deus sobre cidades, países e continentes inteiros.

Além dos EUA e da Inglaterra, foram feitas compilações em Austrália, Birmânia, Chile, Canadá, França, Gana, Índia, Indonésia, Irlanda, Itália, Líbano, Madagascar, Malásia, México, Holanda, Nigéria, Romênia, Espanha, Cingapura, África do Sul, Coréia do Sul, Suécia, Vietnã e Zimbábue. “The Arab World Blessing” apresenta cantores de 16 países de língua árabe em Oriente Médio, norte da África, Península Arábica, Egito e Sudão do Sul.

O projeto deu às igrejas a chance de se unir por trás de uma mensagem comum. Na Austrália, “é a primeira vez que isso acontece”, escreveram os organizadores do coral. Trezentas igrejas participaram do vídeo, que apresentava imagens da paisagem e da vida selvagem australianas, voluntários fazendo refeições, dançarinos e pessoas das Primeiras Nações (australianos nativos).

Na cidade de Nova York, o vídeo do coral virtual reconheceu o papel da cidade como epicentro das mortes do COVID-19 e também os protestos no final da primavera sobre desigualdades raciais e violência. O vídeo incluía imagens de drones dos pontos de referência da cidade de Nova York, justapostas com imagens de hospitais de campanha, médicos e manifestantes.

A “Bênção de Nova York” incluiu 125 cantores de 100 igrejas cantando em oito idiomas, incluindo algumas das maiores igrejas da cidade, como a Christian Cultural Center e a Redeemer Presbyterian.

O organizador do vídeo, Bonny Andrews, fundador do ministério Transform Cities, veio da Índia para Nova York há menos de um ano. Antes do bloqueio, ele costumava orar pela cidade todos os dias enquanto pegava a barca. Ele vê o projeto como um ato de amor pela cidade, no espírito de Jeremias 29.7, uma canção de lamento e esperança.

O objetivo da “Bênção de Nova York”, disse Andrews, é inspirar cidades ao redor do mundo a cantar bênçãos sobre suas comunidades usando músicas exclusivas de suas culturas. “Queremos encher a Internet de música, porque uma canção pode chegar onde um sermão não pode”, disse ele.

Ações que abençoaram comunidades carentes acompanharam as palavras de “A Bênção”. As igrejas envolvidas na “Bênção de Nova York” serviram refeições aos membros de suas comunidades e conseguiram máscaras e equipamentos de proteção individual para os profissionais de saúde na linha de frente.

As 65 igrejas representadas na “Bênção do Reino Unido” — desde congregações católicas e ortodoxas a igrejas das Assembleias de Deus e da Igreja Anglicana — já serviram 400 mil refeições desde o início do isolamento devido ao COVID-19.

“A igreja não tem nada a ver com um prédio. A igreja existe para a comunidade, e por isso se adapta. A igreja não apenas proclama essas palavras para a comunidade, mas demonstra isso na prática”, disse Hughes.

As igrejas irlandesas adotaram a ideia e criaram um coral virtual com o sotaque da Irlanda. Mais de 300 igrejas de todos os condados forneceram imagens de membros cantando “Be Thou My Vision”.

“Queríamos honrar essa inspiração e, ao mesmo tempo, honrar a história e a cultura únicas de nossa ilha. Por isso, escolhemos uma música que ressoaria em toda a ilha, com todas as denominações e grupos culturais, uma que poderia ser usada como plataforma para cantar uma bênção sobre nossa terra, todos os trabalhadores-chave e aqueles de quem eles estão cuidando”, os organizadores escreveram na descrição do YouTube.

As músicas de adoração tipicamente têm uma trajetória lenta e levam meses para ganhar popularidade nas rádios cristãs e serem incluídas no cancioneiro das igrejas. Mas “A Bênção”, agora número 2 na lista de músicas mais populares da Christian Copyright Licensing International, saltou para o topo graças aos covers virais do YouTube. A CT também reportou o apelo global da música número 1 da lista, “Way Maker” (‘Caminho no Deserto’).

“A Bênção” foi capaz de se espalhar rapidamente em muitas línguas, em parte porque as palavras são relativamente simples e fáceis de aprender ou traduzir. Ela repete a passagem de Números 6 como seu único verso, com um coro de amém e três pontes no final.

Desde que o vídeo inicial de “A Bênção” estreou, em março, o Bible Gateway tem demonstrado crescente interesse em Números 6.24–26. O envolvimento na passagem e as pesquisas relacionadas à “bênção” aumentaram 73% em todo o mundo em relação ao ano passado.

“Chorei muitas vezes quando vi pessoas diferentes em todo o mundo declarando a bênção sobre suas famílias, igrejas e nações”, disse Jobe. “Isso traz muita paz, especialmente em um momento de decepção, incerteza e medo, como todos temos experimentado este ano”.

Em maio, o Elevation Worship reconheceu o apelo global de “A Bênção” ao apresentar a música com um coral global ao vivo.

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