Nota da edição da CT em Português: esse artigo tem como base uma pesquisa feita nos Estados Unidos para o contexto americano, mas acreditamos que essas informações podem ser importantes para a igreja de língua portuguesa.
Com 28% dos americanos dizendo que não pertencem a uma tradição religiosa, os “sem igreja” [ou pessoas não filiadas a uma religião] hoje superam qualquer grupo religioso nos EUA, de acordo com um estudo do Pew Research Center divulgado no mês passado.
O afastamento da igreja, segundo as pesquisas do Pew, é alimentado não apenas pelo ceticismo secular, mas também por percepções negativas sobre instituições e líderes cristãos. Para os protestantes evangélicos — que são atualmente 24% do país — a tendência pode parecer uma derrota. Ou uma imensa oportunidade.
Os líderes evangélicos reconhecem os fatores que estão levando as pessoas a se afastarem da fé: ambientes cristãos em que sentem que suas perguntas não são bem-vindas; mágoa e desconfiança em relação a escândalos na igreja; e mudanças sociais que tornam as crenças ortodoxas menos aceitáveis culturalmente, para citar apenas alguns dos fatores.
Mas eles ainda dizem que a igreja não deve se sentir ameaçada pelas tendências de desfiliação e de desconstrução, nem temer a ascensão dos “sem igreja”.
“Temos uma oportunidade de alcançá-los, voltando ao centro de nossa fé e da nossa mensagem", disse a teóloga Katie McCoy, diretora do ministério de mulheres da Texas Baptists. “O evangelho ainda é o evangelho. Não importam as tendências culturais; as pessoas ainda estão em busca de tudo o que Jesus oferece.”
A maioria dos sem igreja não são ateus nem agnósticos. Mais de 60% dos que não são filiados a nenhuma igreja consideram que “não têm uma religião em particular”. Os americanos desse grupo geralmente foram criados como cristãos; 83% ainda acreditam em Deus ou em algum poder superior, e 59% dizem que sua espiritualidade é uma parte importante de suas vidas.
“Eles querem olhar para além de si mesmos, mas desconfiam de organizações, inclusive da igreja”, disse Mark Teasdale, professor de evangelismo do Seminário Teológico Evangélico Garrett, que citou um declínio geral da confiança nas instituições do país. “O problema é que isso os deixa solitários e sem um senso de propósito, pois eles se isolam da comunidade […] Isso leva à ansiedade, e não há uma noção real de como resolver o problema.”
Os americanos que não têm uma religião em particular são os que menos se envolvem em todos os setores. “É menos provável que votem, é menos provável que tenham se voluntariado ultimamente, são menos satisfeitos com suas comunidades locais e menos satisfeitos com suas vidas sociais”, escreveram os pesquisadores do Pew.
“Como os laços relacionais são menos fortes, as pessoas tentam preencher esse vazio”, disse McCoy, que escreve sobre questões de gênero, sexualidade e relacionamentos e tem visto a política identitária tomar o lugar da formação cristã.
As pessoas que não pertencem à igreja também estão buscando uma forma própria de conexão espiritual, à medida que tendências da Nova Era — como carregar cristais, fazer limpeza com sálvia e acreditar em curas energéticas — tornam-se mais comuns. Os americanos que se enquadram na categoria dos que “não têm uma religião em particular” têm maior probabilidade do que qualquer outro grupo de usar cristais (20%), joias (19%), tatuagens ou piercings (14%) com fins espirituais, bem como de acreditar que objetos e lugares podem ter energias espirituais, segundo o Pew.
Então, por que eles não estão recorrendo à religião? Entre os sem igreja, cerca de 30% não veem necessidade disso. Mais da metade (55%) afirma não gostar de organizações religiosas ou ter tido experiências ruins com pessoas religiosas.
As mulheres e os mais jovens têm maior probabilidade de dizer que abandonaram a fé devido a interações anteriores com pessoas religiosas.
Em comparação com o restante da população, os “sem igreja” são mais jovens; a maioria tem menos de 50 anos. Mas a Geração Z não está abordando a fé exatamente da mesma forma que os céticos das gerações anteriores. A apologista Mary Jo Sharp notou que os adolescentes e os jovens de 20 e poucos anos de hoje tendem a enquadrar questões da teodiceia com base na forma como veem os cristãos vivendo a fé que professam.
Por exemplo, a tradicional questão do mal se transforma em algo como “Se Deus é bom, por que os cristãos se comportam tão mal?”, disse Sharp, fundadora da Confident Christianity (Cristianismo Confiante) e professora da Houston Christian University. “A hipocrisia dos fiéis cristãos se tornou uma das preocupações apologéticas mais frequentes deles.”
Vários líderes falaram à CT sobre como a Geração Z adota uma abordagem mais holística para a fé, buscando por suas implicações na política, nas questões sociais e na vida cotidiana.
E para que os não filiados de todas as idades confiem na igreja e vejam seu valor, será necessário que os cristãos trabalhem para combater algumas das percepções negativas.
“Mostramos que nos preocupamos com o bem comum, especialmente de formas físicas, porque eles conseguem apreciar isso”, disse Teasdale. “E mostramos que realmente nos preocupamos com aquilo com que eles se preocupam; nós vamos ao encontro deles em sua ansiedade e solidão. A melhor maneira de fazermos isso é oferecendo nossos relacionamentos.”
Sharp também disse que, em vez de apenas trazer as pessoas para a igreja, os cristãos “agora precisam pensar em enfatizar o envolvimento da igreja local […] de formas que demonstrem visivelmente seu compromisso com os dois maiores mandamentos: em síntese, amar a Deus e amar os outros como a nós mesmos”.
Os “sem igreja” foram ambivalentes quanto ao fato de a fé realmente incentivar as pessoas a tratarem bem os outros — 45% dos participantes do estudo do Pew disseram que isso não acontece. Em comparação com ateus e agnósticos, os não filiados, que não são de nenhuma religião em particular, têm uma visão melhor da religião, mas metade deles ainda disse acreditar que a religião faz “bem e mal em doses iguais”.
Mais de um quarto dos “sem igreja” associa “superstição e raciocínio ilógico” à religião. Eric Hernandez, apologista da Texas Baptists especializado em alcançar as gerações mais jovens, enfatiza a importância de a igreja ser um espaço seguro para perguntas e para um engajamento intelectual.
Hernandez disse que eventos de perguntas e respostas no estado têm atraído membros da comunidade desigrejados e não filiados. “Estamos vendo mais pessoas assinalarem a opção ‘sem igreja’”. Ele está animado para responder as perguntas dessas pessoas sobre ciência e fé ou para corrigir o que pode ser uma visão distorcida ou incompleta do cristianismo.
Mesmo que as pessoas digam que foram criadas na igreja, “não tenho certeza se elas entendem [o cristianismo]”, disse ele. “Queremos ter certeza se o Deus que elas estão rejeitando é o Deus da visão bíblica.”
Erik Thoennes, da Talbot School of Theology da Biola University, disse que o aumento da desfiliação também pode oferecer um “efeito esclarecedor” proveitoso, que vem com “uma dificuldade maior de ser cristão de forma pública”.
Em vez de sentirem a pressão de apelar para os não filiados ou para a próxima geração, Thoennes tem visto seus alunos da Geração Z serem desestimulados por tentativas de “vender” a igreja ou torná-la descolada. Eles ainda estão fazendo perguntas e se debatendo, mas estão em busca de uma expressão de fé autêntica e genuína.
Portanto, Thoennes, pastor da Grace Evangelical Free Church em La Mirada, Califórnia, está se apoiando no alicerce sobre o qual a igreja sempre foi construída: o poder e a beleza de Cristo. Mais pessoas podem estar perdidas e em busca, mas os cristãos acreditam que a igreja ainda tem a resposta.
“Não preciso estar por dentro das últimas tendências para garantir que não ocorra um desigrejamento em minha igreja”, disse ele. “A coisa é simples: Mantenha o foco em Jesus.”
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