Tim Keller queria aprender com a igreja global, inclusive com a Europa secularizada.

O que o pastor reformado viu nos cristãos do velho continente — e por que isso lhe rendeu o respeito dos plantadores de igreja europeus.

Christianity Today May 30, 2023
Illustration by Christianity Today / Source Images: Redeember City to City / Unsplash

Quando Timothy Keller visitou Roma, em 2014, ele falou para os pastores da cidade, fez uma palestra apologética no Senado italiano e respondeu a perguntas de alunos da Universidade Sapienza de Roma, a maior universidade da Europa.

Como pastor que plantou uma igreja perto de Sapienza, fiquei impressionado ao ver Keller ministrar em meu próprio contexto. Naquele campus, minha esposa e eu já tínhamos distribuído panfletos, feito piqueniques, interagido com os alunos e ajudado alguns deles a orar pela primeira vez. Dois anos antes, uma multidão de estudantes havia se reunido no gramado central da universidade para um debate sobre a existência de Deus, no qual tentei ao máximo interagir com um professor ateu e promover a fé cristã.

Enquanto Keller participava de uma extensa sessão de perguntas e respostas, respondendo aos questionamentos mais difíceis feitos pelos alunos, admirei a ponderação de suas falas. E fiquei impressionado com sua postura de servo. Keller arregaçava as mangas, servia ao lado de obreiros locais e recebia com contentamento as perguntas dos jovens italianos seculares.

Aquele momento sintetizava o espírito generoso e humilde que conquistou o respeito de muitos líderes cristãos europeus. Em Keller, eles encontraram robustez teológica em uma era de pragmatismo e técnica, um espírito reconciliador em uma era de divisões e uma redescoberta do evangelho em uma época em que os pregadores são tentados a reduzi-lo a meros conselhos práticos e histórias inspiradoras.

“Ele foi o principal líder evangélico norte-americano de sua geração”, disse Lindsay Brown, ex-secretário-geral da International Fellowship of Evangelical Students [Comunidade Internacional de Estudantes Evangélicos]. A morte de Keller lhe trouxe à mente palavras ditas no funeral de John Stott: Em 2011, o teólogo Chris Wright prestou homenagem a Stott descrevendo-o “como o maior e o mais humilde do Ocidente”.

“Eu diria o mesmo sobre Tim Keller”, disse Brown. “Ele exemplificou o espírito de parceria. Era um homem de convicção no que se refere à verdade bíblica, mas a aplicava de forma graciosa e compassiva.”

Os europeus atentos podiam ver as camadas do cristianismo europeu que moldaram Keller, desde os reformadores e puritanos até a pregação comovente de George Whitefield, a espiritualidade evangélica de John Newton, a teologia holandesa de Herman Bavinck e Abraham Kuyper e os escritores de Oxford, de meados do século 20, como C. S. Lewis e J. R. R. Tolkien.

Quando Keller se sentiu intimidado pelo desafio de plantar uma igreja em Nova York, na década de 1980, ele se inspirou na geração anterior de pastores londrinos que demonstraram que igrejas no coração da cidade nutridas com pregação expositiva podiam alcançar profissionais urbanos.

A Igreja All Souls, de John Stott; a Capela de Westminster, de Martyn Lloyd-Jones; e a St. Helen's Bishopsgate, de Dick Lucas inspiraram Keller do mesmo modo que a Igreja Presbiteriana Redeemer [pastoreada por Keller durante muitos anos] ajudaria os europeus, nas gerações seguintes, a se sentirem esperançosos quanto à possibilidade de suas cidades serem alcançadas pelo evangelho.

Para Pangiotis Kantartzis, pastor da Primeira Igreja Evangélica Grega em Atenas, na Grécia, a plantação de igrejas missionárias era um novo conceito. “Eu nunca tinha visto, em minha vida e em meu ministério, uma nova igreja crescer de forma intencional, e não por divisão ou por conveniência”, disse ele. Ele confessou ter ficado ansioso com a ideia de promover um movimento evangélico que plantasse várias igrejas, criasse um ecossistema que treinasse líderes e atendesse às necessidades da capital grega e ao afluxo de imigrantes.

Desde então, a Primeira Igreja Evangélica Grega ajudou a plantar igrejas para profissionais gregos, imigrantes iranianos e jovens ativistas que vivem em Exarcheia, bairro de espírito anarquista de Atenas.

“Ver o que Deus estava fazendo em Nova York e acompanhar a análise disso, por meio dos vários artigos que Keller escreveu, tiveram um papel decisivo em me inspirar e me moldar no sentido de como desenvolvo uma visão para um movimento evangélico na cidade”, disse Kantartzis.

Para Tiago Cavaco, pastor batista e cantor punk-rock que vive em Lisboa, a visão e os escritos de Keller ajudaram a desenvolver sua abordagem em relação ao engajamento cultural. A essa altura, Cavaco já promovia eventos e diálogos com pensadores não cristãos. “Quando comecei a acompanhar o Keller, percebi que ele tinha uma abordagem muito mais madura e experiente que, apesar de ser feita em Nova York, poderia ser aplicada em Portugal, para nós.”

Cavaco enfatizou a postura de escuta de Keller como a chave para engajar os europeus. “Keller foi um raro exemplo de um pregador americano [bem-sucedido] — acessível para as experiências de frustração comuns ao nosso cristianismo europeu — [que] foi inteiramente receptivo ao que significa ser cristão em um lugar diferente do dele”, disse Cavaco. “Zero superioridade, atenção total.”

Keller encorajou colegas americanos a adotarem a mesma postura e a aprenderem com a igreja global, mesmo com a Europa secularizada e com sua igreja numericamente menor. Em Movements of the Gospel , uma obra de ensaios de plantadores de igreja europeus, lançada em 2018, ele declarou: “Devemos observar a igreja europeia e aprender com seus sucessos e fracassos, pois nossas próprias culturas são cada vez mais moldadas pelo mesmo secularismo e pelo mesmo materialismo”.

“Keller acreditava que nós, europeus, estamos ‘na linha de frente’ de uma nova era muito mais secular e multirreligiosa. Essa não é apenas uma perspectiva realista, mas também muito encorajadora”, disse Tim Vreugdenhil, pastor de Amsterdã que foi pioneiro de um método de evangelismo interativo para alcançar profissionais seculares da cidade.

“Ele me ajudou a acreditar que nossa geração de teólogos e plantadores de igreja não são ‘os últimos homens e mulheres que restaram’, mas sim os pioneiros de um tipo diferente de cristianismo: muito menor em tamanho e número, mas, se Deus quiser, mais influente na pregação do evangelho.”

A experiência e a humildade de Keller levaram líderes europeus a aprenderem com ele em conferências organizadas pela City to City, a organização que Keller fundou para preparar a próxima geração de igrejas em cidades globais do mundo todo. Ele parecia igualmente à vontade em uma catedral de Paris ou em um cinema de Cracóvia.

Vários outros líderes europeus também se lembraram das visitas de Keller ao continente.

Em uma homenagem ao homem a quem ele se referiu como “um ponto de referência global para o arquipélago evangélico”, Leonardo de Chirico, pastor da Igreja Evangélica Breccia di Roma, lembrou aos leitores sobre a herança italiana de Keller.

“Quando veio a Roma, entre os barulhos da cidade e os sabores que provou, ele confidenciou ter sentido uma sensação estranha: como se estivesse reativando sons e sensações que experimentara na infância, quando participava do barulhento e saboroso ‘ritual’ dos almoços de domingo [com sua] família imigrante”, escreveu Chirico.

Outros sentiram que Keller os ajudou a apreciar seus próprios contextos de forma mais plena.

“Tim Keller me ensinou a amar Dublin”, disse Seán Mullan, plantador de igreja em Dublin. “Ele conhecia as terras do evangelho de maneira diferente em diferentes culturas e respeitava isso.”

Xavier Memba, que ajudou a plantar a Igreja Ciutat Nova, diz que Keller o ajudou a ver seu ministério em Barcelona sob uma luz diferente.

“O treinamento com Tim Keller me ofereceu uma nova perspectiva da igreja no mundo moderno, destacando como ela deve se adaptar ao seu contexto cultural e urbano sem se esquecer da mensagem do evangelho”, disse ele.

Líderes do norte da Europa concordaram.

“Muitos de nós aqui, na Noruega, somos profundamente gratos pelo rico legado de Tim Keller — um legado que nos envolve e nos desafia”, acrescentou Lars Dahle, professor associado da NLA University College Kristiansand. “Ele foi um pregador centrado no evangelho, um líder unificador e um missionário estratégico.”

A morte de Keller, em 19 de maio, foi uma perda profundamente sentida por muitos na Europa. Seu papel de comando como missiólogo urbano, teólogo evangélico e ponto de referência para líderes globais da igreja é algo dificilmente substituível. Mas a rede de líderes formada por Keller aprendeu que são necessárias muitas igrejas para alcançar uma cidade e muitas vozes para repercutir o sempre fascinante evangelho de Jesus.

“Nossas equipes que tocam ações evangelísticas e projetos de discipulado em mais de 100 cidades se beneficiaram do material de Keller”, disse Luke Greenwood, diretor da Steiger na Europa, uma organização de missões que alcança jovens europeus de maneiras criativas. “O coração de Tim pelos perdidos e [sua] disposição de se envolver pessoalmente em diálogos difíceis têm sido uma fonte de ensinamento e de estrutura teológica sólidos para o que fazemos.”

Nos últimos anos, Keller procurou garantir que o trabalho continuaria após sua morte, disse Tim Coomar, plantador de igrejas em Atenas e líder da City to City Europe.

“Enquanto choramos a perda de Tim e nos perguntamos como continuaremos a seguir em frente, acho que ele se preparou para sua partida garantindo que, embora não haja uma pessoa que sozinha pudesse fazer o que ele fez, todos nós juntos podemos desenvolver mais e mais profundamente o que ele começou. ”

René Breuel é o pastor fundador da Igreja Hopera, em Roma, e autor da obra The Paradox of Happiness [O Paradoxo da Felicidade].

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