Devemos manter a transmissão ao vivo do culto presencial?

Os crentes que optam pelo culto online percebem o que estão perdendo?

Christianity Today April 19, 2023
Source Images: Ismael Paramo / Nathan Mullet / Unsplash

Quando as igrejas estavam fechadas, durante a fase inicial da pandemia, muitos pastores recorreram à transmissão online ao vivo como um substituto temporário para os cultos presenciais. As igrejas começaram a realizar reuniões virtuais nas casas dos fiéis. Parecia uma boa ideia na época. Certamente era melhor do que nada.

Mas aqui está o problema: o que a maioria de nós presumia que seriam algumas semanas, acabou se transformando em meses, e depois passou para muito além de um ano. O que começou como uma alternativa provisória tornou-se um hábito confortável.

A transmissão ao vivo certamente tem seus benefícios: é conveniente, de longo alcance e acessível. Assim, mesmo depois que a reunião presencial tornou-se viável novamente, muitos pastores mantiveram a opção do culto online. Mas a igreja transmitida ao vivo tem uma deficiência que supera em muito seus benefícios: é uma pseudo-comunhão. Tem a aparência de relacionamento sem ter a profundidade genuína que vem da proximidade. E encoraja a noção de que a proximidade não é algo essencial.

Eu de fato acredito que a transmissão ao vivo tem valor em alguns contextos, como ministrar a congregantes que não podem sair de casa ou àqueles que podem ser imunocomprometidos. Hoje, porém, há muitos cristãos que não têm essas preocupações, mas se acostumaram tanto com a transmissão ao vivo do culto que a veem como uma alternativa viável a uma ida semanal até o santuário.

À medida que meus colegas de ministério e eu discutíamos diferentes pontos de vista sobre a transmissão ao vivo dos cultos de domingo, reduzimos nosso foco a uma única pergunta: por que a igreja local precisa se reunir presencialmente? Acredito que Lucas fornece uma resposta quádrupla em sua descrição da igreja do primeiro século: “Eles se dedicavam ao ensino dos apóstolos e à comunhão, ao partir do pão e às orações” (Atos 2.42). Essas quatro práticas sofrem, quando a transmissão ao vivo substitui permanentemente a comunhão próxima dos santos. Será que os crentes que optam pelo culto online percebem o que estão perdendo?

O ensino dos apóstolos

Tratar o estudo da Palavra de Deus como um exercício acadêmico — como se fosse assistir a uma palestra online ou a um TED Talk — é um desserviço à revelação divina. Os crentes são participantes da proclamação das Escrituras, durante um culto de domingo. Este ato é comunitário; não ocorre em isolamento. E embora apenas uma pessoa esteja falando, os sermões devem ser conversas; em termos ideais, eles provocam diálogo e reflexão dentro do corpo de Cristo. Receber o “ensino dos apóstolos” não se resume apenas a assistir a um bom orador online; significa abrir nosso coração para a autorrevelação de Deus. Assistir a sermões online em isolamento deve ser apenas uma solução temporária. Precisamos encorajar diretamente os membros de nossa igreja a não negligenciar o contexto de corpo no qual a Palavra de Deus floresce. Como povo de Deus, somos discípulos em comunidade, que ouvem e apreciam juntos o que Deus disse.

Comunhão

O intelectual Marshall McLuhan cunhou o ditado “O meio é a mensagem”. A internet redefiniu os relacionamentos; nós nos acostumamos a chamar estranhos de “amigos” e a negligenciar o valor sem igual da comunidade próxima. Para a igreja primitiva, o significado de comunhão era claro: a reunião de uma comunidade encorajadora, na qual alguém poderia ser verdadeiramente conhecido (Hebreus 10.25). Todas as semanas, na igreja, dou as boas-vindas a cada congregante. Conversamos um com o outro, observo suas expressões faciais e sua linguagem corporal. Essas mensagens não verbais são praticamente invisíveis em um ambiente online. Mas quando os cristãos se reúnem presencialmente, vemos aquilo que não é dito em palavras. Fica mais difícil esconder a mágoa ou reprimir a alegria. A proximidade presencial permite que outros crentes vejam você e participem de seus momentos de dor ou de alegria (Romanos 12.15). Essa necessidade é mais bem atendida em uma comunidade em que tenhamos proximidade.

O partir do pão

A passagem do tempo não foi gentil com “o partir do pão”. Ceias do Senhor eficientes padronizaram o uso de bolachas [salgadas] e copinhos de plástico com suco de uva. No primeiro século, entretanto, a ceia ocorria como parte de uma refeição. Comer juntos era algo apreciado e íntimo. Embora nossas igrejas certamente valorizem os símbolos do corpo partido e do sangue derramado de Cristo, a importância de nossa participação nessa lembrança costuma ficar obscurecida. Quando os membros da igreja reduzem a Ceia do Senhor a uma mera formalidade, não é surpresa para ninguém que as reuniões presenciais percam para as transmissões simultâneas online. Mas reconhecer a Ceia como um ato de graça que reiteradamente encarna o ataque ao corpo de Cristo, que ele suportou por nós, ajuda nossos fiéis a entenderem o significado de se reunir para que a recebam juntos. Estamos nos reunindo não para seguir uma formalidade legalista; estamos nos reunindo para exemplificar o sacrifício de Jesus.

Orações

No dia da minha conversão, perguntaram-me: “Você aceita Jesus como seu Senhor e Salvador pessoal ?” Eu aprecio esse sentimento, mas individualizar a salvação dessa maneira pode diminuir nosso senso de identidade comunitária. As Escrituras repetidamente enfatizam a oração em comunidade, como os apelos e o arrependimento coletivos (2Crônicas 7.14). A igreja primitiva reconheceu a necessidade da participação conjunta nesse ato sagrado. Quando os crentes se reúnem, a oração nos capacita de uma maneira única. Por meio da oração comunitária, a igreja local pode buscar a direção de Deus, render-se à sua soberania e apoiar-se conjuntamente no poder do Espírito Santo. Certamente, há um importante componente pessoal na oração, o qual, porém, nunca deve acontecer às custas da reunião dominical que une os crentes que oram.

A sensação de que estamos perdendo alguma coisa

Não estou sugerindo que as igrejas devam abandonar por completo os cultos online; mas os pastores devem pensar estrategicamente sobre como oferecer esse ministério, porém, sem promovê-lo como um substituto para a frequência à igreja. Uma estratégia que usamos é postar o vídeo do culto durante a semana, em vez de transmiti-lo ao vivo. Outra abordagem é passar o culto da semana anterior durante o horário de domingo; quem assiste continua tendo a opção de assistir ao culto dominical, mas também percebe que está perdendo a oportunidade de participar da assembleia. Sentir que que estamos perdendo algo pode alimentar um ciúme virtuoso.

Embora a transmissão ao vivo tenha sido uma dádiva de Deus no início da pandemia, essa medida paliativa não pode substituir totalmente a igreja local reunida. Como pastores, sabemos disso, mas muitos na igreja precisam nos ouvir dizê-lo. Estaremos ministrando aos que nos assistem online se os encorajarmos a comparecerem presencialmente.

Reunimo-nos para o ensino dos apóstolos, o partir do pão, a comunhão e a oração; essas são as características bíblicas da adoração comunitária. Em vez de encorajar os crentes a “irem à igreja” por meio de telas, que possamos convidá-los direta e repetidamente para reuniões onde eles possam encarnar a igreja.

Brandon Washington é pastor de pregação e visão na The Embassy Church, em Denver. Ele é o autor de A Burning House (Zondervan, 2023).

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