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Por que o terrível relatório da ONU sobre mudanças climáticas é dedicado a um cristão evangélico

John Houghton, galês vencedor do Prêmio Nobel, via o pecado como o coração desta crise ecológica.

Christianity Today September 3, 2021
Sean Rayford / Stringer / Getty Images

O sexto relatório do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas das Nações Unidas (IPCC) é alarmante — mas não surpreendente.

A primeira avaliação das pesquisas científicas sobre mudanças climáticas, feita pelo painel em 1990, descobriu que a queima de combustíveis fósseis aumenta substancialmente as concentrações atmosféricas de gases do efeito estufa — entre eles, dióxido de carbono, metano, clorofluorcarbonetos e óxido nitroso — causando um aumento na temperatura média global e aquecendo os oceanos do mundo.

“As mudanças consequentes”, dizia o primeiro relatório, “podem ter um impacto significativo na sociedade”.

A segunda, a terceira, a quarta e a quinta avaliações feitas pelo IPCC encontraram mais evidências e um consenso crescente de que a atividade humana está causando a mudança climática e que seu impacto afetará muitas pessoas.

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A sexta avaliação, divulgada em agosto, é mais urgente e enfática, embora chegue à mesma conclusão. O IPCC agora diz que as mudanças climáticas não só podem ter, como terão um impacto significativo na sociedade.

Os legisladores, cientistas e cidadãos conscientes que pegarem a versão final do relatório podem se surpreender com uma coisa: ele é dedicado a um cristão evangélico que disse que a raiz do problema da mudança climática é o pecado.

“Cuidar da Terra é uma responsabilidade que nos foi dada por Deus”, escreveu John Houghton certa vez. “Não cuidar da Terra é pecado.”

Houghton, que morreu de complicações relacionadas à COVID-19 em 2020, aos 88 anos, foi o editor-chefe dos três primeiros relatórios do IPCC e um dos primeiros líderes influentes a fazer um apelo para agirmos sobre a questão da mudança climática.

Suas preocupações com os gases do efeito estufa, o aumento das médias de temperatura, os recifes de corais em extinção, as ondas de calor escaldantes e as condições climáticas cada vez mais extremas eram embasadas por sua formação como físico atmosférico e seu compromisso com a ciência. Também decorriam de sua compreensão evangélica de Deus, dos relatos bíblicos sobre a relação da humanidade com a criação e o que significa para um cristão seguir a Cristo.

“Não vivemos à altura do chamado à santidade”, explicou a neta de Houghton, Hannah Malcolm, à CT. “Fomos conformados aos padrões deste mundo, com seus respectivos desejos de acumular riquezas e aumentar nosso conforto, e não é essa a exigência que nos é feita como seguidores de Cristo.”

Houghton nasceu em uma família batista, no País de Gales, em 1931. Quando jovem, ele percebeu que precisava tomar uma decisão pessoal por Cristo, e assim o fez. Até o fim da vida, Houghton a descreveu como a escolha mais importante que ele já fez.

Seu amor por Deus alimentava seu amor pela ciência, o qual ele via como uma forma de adoração.

“A coisa mais grandiosa que pode acontecer a alguém é estabelecer um relacionamento com aquele que criou o universo”, disse Houghton a um jornal galês, em 2007. “Nós descobrimos as leis da natureza quando fazemos nossa ciência. Assim, descobrimos o que está por trás do universo, e se há uma inteligência e um Criador por trás dele. O que estamos fazendo como cristãos é explorar nosso relacionamento com a pessoa que é o Criador do universo. Isso é algo absolutamente maravilhoso.”

Houghton começou a estudar na Universidade de Oxford aos 16 anos, tendo concluído o bacharelado em 1951 e o doutorado em 1955. No ano seguinte, a União Soviética enviou o primeiro satélite artificial ao espaço e, enquanto o mundo considerava o que aconteceria se uma bomba nuclear fosse detonada na atmosfera, Houghton, então um cientista de 25 anos, voltava sua atenção para a circulação atmosférica.

“Tínhamos medições feitas de aviões e balões, mas estes ficavam em um ponto só”, disse ele. “Se pudéssemos colocar um instrumento em um satélite que circulasse a Terra cerca de 14 vezes por dia, e medir a temperatura atmosférica em diferentes níveis, medindo a radiação emitida a partir da Terra, seria um tremendo passo à frente.”

Isso levou Houghton a se tornar um dos primeiros cientistas a trabalhar com a questão das mudanças climáticas, além de uma escolha natural para presidir o grupo de trabalho do IPCC, quando este foi criado pela Organização Meteorológica Mundial e pela ONU, em 1988.

Após a divulgação do primeiro relatório, ficou claro para Houghton que uma ciência meticulosa, feita com a máxima transparência possível sobre os níveis de certeza, não seria suficiente para motivar os governos mundiais a agirem sobre a questão das mudanças climáticas. Havia muitos incentivos de curto prazo para se colocar em dúvida as advertências sobre as consequências devastadoras que aconteceriam em um futuro distante.

Houghton se viu cada vez mais chamado para o papel de comunicador.

“Ele tinha uma crença realmente profunda na virtude da pesquisa científica por si só, mas também encontrou em si mesmo alguém que estava sendo ouvido por políticos e líderes”, disse Malcolm. “O que ele queria resolver nunca foi apenas um problema intelectual. Sempre que falava sobre isso, ele começava pela devastação ecológica e a questão da justiça era uma referência constante. Já ouvi pessoas dizerem que ele tinha a urgência de um profeta”.

Em 1995, quando foi publicada a segunda avaliação feita pelo IPCC sobre a ciência das mudanças climáticas, Houghton começou a falar sobre as mudanças climáticas explicitamente como pecado. Ele foi influenciado por John Zizioulas, o bispo metropolitano da Igreja Ortodoxa grega de Pérgamo, que defendia que os pecados contra a natureza também eram pecados contra Deus, uma vez que os seres humanos receberam de Deus a criação para que dela cuidassem.

Segundo Houghton, algumas religiões ensinam que a Terra e o mundo material são maus. Mas a Bíblia ensina que a criação é boa e descreve o ser humano como jardineiro divinamente comissionado para cultivar e cuidar do mundo.

“Mas, com frequência, somos mais exploradores e causadores de danos [à natureza] do que jardineiros”, escreveu Houghton. “Alguns cristãos interpretaram mal o ‘domínio’ dado aos seres humanos em Gênesis 1.26, como se fosse uma desculpa para uma exploração desenfreada. No entanto, os capítulos de Gênesis, assim como outras partes das Escrituras, insistem que o governo humano sobre a criação deve ser exercido sob Deus, o governante supremo da criação, com o tipo de cuidado exemplificado por esta imagem do ser humano como ‘jardineiro’ ”.

Houghton começou a procurar líderes evangélicos para falar com eles sobre a crise ecológica que se aproximava. Ele foi influente e convenceu Richard Cizik, John Stott e Rick Warren a fazerem da mudança climática uma prioridade e a falarem sobre isso como um problema espiritual.

Depois do terceiro e quarto relatórios do IPCC, e apesar do painel ter ganhado o Prêmio Nobel (juntamente com o ex-vice-presidente Al Gore), muitos defensores de cortes drásticos nas emissões de carbono começaram a se desesperar. A mudança não estava acontecendo com a rapidez necessária para fazer diferença.

Mas Houghton, inspirando-se em sua fé, sempre falava sobre a importância da esperança cristã.

“Ele acreditava que a bondade do Senhor seria vista na terra dos viventes, e isso o sustentava”, disse Malcolm.

Ele orava regularmente para que o reino de Deus viesse — “Sem demora!” — e consertasse as coisas.

Após se aposentar, Houghton voltou ao País de Gales, onde serviu como presbítero em uma Igreja Presbiteriana e ensinou seus netos a amarem as montanhas galesas e as praias varridas pelo vento.

De acordo com Malcolm, que agora está se preparando para o ministério na Igreja Anglicana e escrevendo uma tese de doutorado sobre teologia e luto climático, Houghton achava que era impossível convencer as pessoas a protegerem algo que não amavam. Ele queria que os cristãos aprendessem a amar o meio ambiente e permitissem que a ciência da mudança climática os levasse ao arrependimento.

“Nosso desejo de ser deuses leva a uma grande destruição ao nosso redor”, disse ela. “Há algo no trabalho da ciência climática que revela a consequência de nosso pecado, incomoda aqueles que estão no poder e nos conclama a reconhecê-lo, mas também a estarmos cientes de que uma alternativa é possível — uma alternativa para o nosso pecado.”

Houghton não viveu para ver a publicação do sexto relatório do IPCC ou para promovê-lo entre os cristãos evangélicos. Mas a avaliação científica, dedicada à sua memória, ecoa um tema central da obra de sua vida: agora é a hora, diz o sexto relatório, de abandonar o caminho da destruição.

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