O evangelicalismo sempre enfatizou a necessidade da conversão pessoal por meio da experiência de nascer de novo, na qual o Espírito Santo muda o coração de uma pessoa de forma sobrenatural.
Do século 18 até o presente, muitas igrejas evangélicas exigiram um testemunho pessoal de conversão como pré-requisito para ser membro da igreja. E, na maioria das vezes, isso envolve uma experiência pessoal de transformação divina.
Mas o que acontece se alguém não tiver esse tipo de experiência transformadora? E se uma pessoa acreditar [que nasceu de novo] não por causa de algum experiência religiosa perceptível, mas simplesmente por causa de uma convicção racional sobre a verdade das declarações de Deus? Indivíduos que se sentem assim são realmente salvos? E, mesmo que sejam, eles podem se considerar cristãos evangélicos?
Esse foi o dilema enfrentado por Francis Wayland (1796—1865), um ministro batista ordenado e presidente da Brown University no início do século 19. Ele nunca teve o que considerava ser essa experiência de nascer de novo — e para o presidente de uma importante faculdade batista no século 19, isso era um problema.
Tive um breve encontro com Wayland quando estudava o ativismo antiescravagista americano do início do século 19; porém, só recentemente percebi que esse oponente da escravidão e professor de “evidências cristãs” também lutou com a certeza de sua salvação, por não ter tido o que considerava uma experiência autêntica de nascer de novo.
Durante grande parte de sua juventude, Wayland acreditou que tal experiência era necessária para se tornar cristão. Afinal, ele cresceu imerso na teologia evangélica de Jonathan Edwards em um lar batista calvinista. Ele acreditava que a verdadeira conversão exigia uma mudança de ordem sobrenatural das afeições e da vontade de alguém. E, como muitos evangélicos de sua época, ele acreditava que essa mudança se manifestava na convicção de pecado seguida por uma súbita sensação de bem-aventurança.
Wayland teve essa convicção — mas não a experiência de êxtase.
Ele cresceu indo à igreja e aprendendo as verdades teológicas, e nunca foi um pecador desmedido, segundo os padrões mundanos convencionais. Ele continuou a frequentar a igreja depois que saiu de casa, e viveu o que seus contemporâneos evangélicos teriam considerado uma vida moral íntegra. Segundo seu próprio relato, ele também acreditava plenamente nas alegações de Jesus e nas doutrinas teológicas do cristianismo.
E, no entanto, em seu último ano de faculdade de medicina, ele percebeu que estava vivendo para si mesmo, e não para Deus. “Quando meus propósitos eram contrariados, meu espírito, como bem me lembro, levantava-se contra o domínio de Deus”, escreveu ele. “Eu sabia que, se houvesse algum universo para o qual eu pudesse fugir, no qual Deus não reinasse, eu teria ido sem demora para lá.”
Em outras palavras, ele descobriu que não tinha amor verdadeiro por Deus. Em sua busca por sucesso em seus estudos da medicina, ele descobriu que estava vivendo para seus próprios interesses, e não para as prioridades de Deus.
Quando refletiu sobre isso, ele de repente percebeu o quão perigosa espiritualmente era a sua inimizade secreta com Deus. “Eu acreditava em tudo o que a Bíblia dizia sobre minha condição e meu perigo”, escreveu Wayland. “Jesus Cristo veio para salvar pecadores; no entanto, nunca busquei seu perdão".
Ele, portanto, resolveu buscar a Deus da maneira que havia sido ensinado a fazer, como todo calvinista evangélico dos anos 1800 — ou seja, passando horas em oração conjunta até que Deus, em sua graça soberana, decidisse salvá-lo.
Wayland, portanto, abriu sua Bíblia e passou o dia inteiro sem fazer nada além de ler as Escrituras e orar. Nada aconteceu. Então, ele tentou novamente no dia seguinte. E, no entanto, ele ainda não sentia nenhuma mudança perceptível em si mesmo — nenhuma sensação de segurança, nenhum sentimento de uma visitação sobrenatural do Espírito Santo em seu coração. Ele tentou novamente pelo terceiro dia, mas ainda não viu resultados.
Por fim, ele teve de retornar às suas atividades diárias e aos estudos da faculdade de medicina, mas decidiu que em seu tempo livre leria apenas a Bíblia e livros cristãos. Ele frequentava a igreja com mais entusiasmo. Até foi a um encontro de avivamento. Ele agora sentia pelos outros crentes um amor que nunca havia sentido antes, bem como uma preocupação renovada pelos perdidos e um desejo de que outros cressem em Jesus. Ele “amava as doutrinas do evangelho” de uma forma que nunca havia amado antes. E sentia uma tristeza por sua vida anterior de rebelião secreta contra Deus.
Mas Wayland não considerava nenhum desses novos anseios e emoções como um indicativo da experiência de conversão que ele esperava. Em vez disso, quando refletia sobre sua fé, sentia que ela se baseava inteiramente na razão e, portanto, não poderia ser resultado da obra direta do Espírito Santo.
“Eu não podia acreditar que a luz que gradualmente iluminava minha alma fosse algo mais do que aquilo que era ensinado pelos preceitos dos homens”, escreveu Wayland. “Tudo na religião me parecia tão racional, que tudo o que eu sentia me parecia brotar de meras deduções lógicas do intelecto, das quais o coração, o mais íntimo da alma, não fazia parte.”
Ele acreditava na existência de Deus com base na evidência do design da natureza. Ele acreditava que a Bíblia viera de Deus e que Jesus realmente ressuscitou dos mortos, depois de ser crucificado — com base em evidências históricas e deduções lógicas. E com base na evidência da profecia bíblica e no testemunho dos escritores do evangelho, ele acreditava que Jesus era de fato o divino Filho de Deus que havia dado sua vida pelos pecadores.
Dadas essas crenças, Wayland considerava que era lógico que ele devesse confiar em Jesus para a salvação e viver sua vida para Deus, e não para seus próprios desejos egoístas. A partir disso, era simplesmente lógico que ele agora “desejasse com fervor” a salvação de outros que estavam perdidos. Era lógico que ele procurasse a companhia de outros crentes e se dedicasse a adorar o Senhor e a encontrar contentamento nessa atividade.
Entretanto, como tudo isso era tão lógico, seria possível que ele tivesse chegado a tais crenças apenas por meio de seu próprio intelecto — o que significa que não tinha uma fé realmente salvadora, já que, segundo ele, não fora gerada pelo Espírito Santo?
“Eu não podia negar que houve uma mudança em mim, mas a mudança foi tão racional [isto é, gerada por meio de reflexão racional] e de grau tão leve, que eu não poderia ser um filho de Deus”, pensava ele.
E como ele nunca havia experimentado a transformação divina do coração que buscava, Wayland estava convencido de que ainda estava perdido — um pensamento que o aterrorizava.
Foi preciso que outro ministro batista convencesse Wayland de que ele realmente havia experimentado uma regeneração gerada por Deus. Wayland cria e fora mudado, argumentou o ministro. E, se era assim, então ele realmente havia se convertido e recebido o Espírito Santo — independentemente de ter vindo à fé salvadora por meio de reflexão racional ou de uma experiência dramática.
Wayland acabou admitindo que o ministro estava certo. Ele teria preferido uma experiência mais direta, que lhe daria maior segurança, mas Deus “em sua misericórdia me decepcionou e me tornou disposto a aceitar sua graça da maneira que ele escolhesse concedê-la”.
No entanto, em sua velhice, Wayland continuou a lutar com dúvidas recorrentes sobre sua própria salvação, pois não conseguia apontar honestamente um único momento em que o Espírito Santo tivesse entrado em seu coração e mudado sua vida.
Mesmo em seu suposto momento de conversão, quando era um jovem estudante de medicina, dizia ele, “tudo foi gradual e parecia ter decorrido de uma linha de dedução lógica. Não consigo determinar o momento exato em que ocorreu uma transformação moral em meu caráter”.
Desde aquela época, ele escrevia: “Tive muitas temporadas de declínio e de avivamento religioso; tenho sido atormentado por muitas dúvidas sobre meu estado diante de Deus e raramente alcancei a plena certeza da fé, um privilégio de tantos discípulos de Cristo”. Ele orava reiteradamente por essa certeza, mas ela nunca veio.
Em vez disso, Wayland resolveu viver uma vida de obediência e submissão ao Senhor. Por décadas, ele deu aulas na Brown University sobre “evidências cristãs” (isso, é claro, foi em uma época em que essa instituição, como várias outras escolas da Ivy League, ainda era uma faculdade cristã). Se ele não podia encontrar segurança em sua própria experiência, ele podia, no entanto, encontrar bases objetivas, e não provenientes da experiência, para saber que Deus era real e se revelara em Jesus Cristo — e que aqueles que confiassem em Jesus podiam ter certeza das promessas de Deus.
Conversando com seus alunos e conhecidos, ele também veio a perceber que havia muito mais pessoas como ele do que antes havia imaginado — isto é, pessoas que cresceram em lares evangélicos e queriam servir ao Senhor, mas que achavam que nunca tinham tido uma experiência de salvação. Frequentemente, seus conselheiros espirituais as encorajavam a buscar o Senhor por meio da oração e da contrição, do mesmo modo que Wayland fazia, na esperança de que tal encontro acontecesse.
Mas Wayland dava um conselho diferente. Em vez de continuar buscando uma experiência que pode nunca acontecer, as pessoas simplesmente precisavam acreditar no evangelho e fazer as coisas que Deus disse para fazer — não para ganhar um senso de segurança por meio de boas obras, mas para servir ao reino com a confiança de que Deus as aceitou e de que isso é o que Ele quer que elas façam.
Wayland veio a perceber que Deus podia operar tanto por meio da razão quanto por meio da experiência, e que, em sua graça soberana, nem todos receberiam esse senso de milagre em suas vidas. Algumas pessoas são abençoadas com uma conversão dramática ou um sentimento de paz. Outras, como ele, podem nunca ter tido tal experiência e, por isso, lutam constantemente contra a tentação de acreditar que sua fé pode não ser genuína.
Wayland não podia apontar uma data exata para sua conversão. Ele não podia dizer com confiança que sentia o Espírito Santo vivendo dentro dele de alguma forma experiencial. Ele não podia dizer que sua própria fé em Cristo transcendia a razão. Mas ele podia dizer que amava o Senhor e queria desistir de tudo para seguir a Jesus. Como Wayland dizia: “Se conheço meu próprio coração, eu, com prazer, submeto a mim e a tudo o que tenho a Deus”.
Então, decidiu que, se isso era verdade, deveria significar que ele realmente havia nascido de novo.
Pessoalmente, achei reconfortante encontrar alguém como Wayland em minha pesquisa, pois também enfrentei lutas semelhantes. Embora eu possa dar algum tipo de testemunho de salvação, em meus momentos de honestidade sou forçado a admitir que nem sempre considero minha experiência muito convincente.
Como Wayland, minha conexão com Deus geralmente me parece tão lógica que é tentador imaginar se foi gerada pelo Espírito Santo ou se foi uma fé simulada, gerada por meus próprios esforços racionais. E se minha fé em Cristo ou a confiança em minha salvação dependesse inteiramente de minha própria experiência, eu me sentiria tão perdido quanto Wayland — especialmente depois de buscar o Senhor e não sentir nenhuma sensação de segurança.
Mas o testemunho de Wayland é um lembrete de que os cristãos evangélicos que amam sinceramente o Senhor e se rendem humildemente a Deus nem sempre terão as experiências religiosas que sua teologia pode prever. A promessa de salvação e de regeneração que Deus nos faz não se baseia em nossa experiência, mas sim em algo muito mais objetivo, como Wayland descobriu.
Wayland escolheu acreditar nas promessas de Deus presentes nas Escrituras — e no final, isso foi o suficiente. Não tenho dúvidas de que ele realmente “nasceu de novo”, mesmo que não tenha percebido isso na época.
Daniel K. Williams é professor de história na University of West Georgia e autor de Defenders of the Unborn: The Pro-Life Movement Before Roe v. Wade.
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