“Todo mundo diz que devemos nos casar, mas estamos satisfeitos com a nossa vida atual. Além disso, ainda não estamos nem um pouco prontos para ter filhos.”
A mulher que me disse isso tem 27 anos. Ela é cristã, foi criada em um lar acolhedor, e estávamos conversando sobre os planos que ela tinha com seu namorado de longa data, depois de terminar a pós-graduação. Eles estão juntos há mais de seis anos — praticamente moram juntos. Ela sabe que dormir com o namorado antes do casamento não é o que Deus quer para ela, mas também sabe que casamento e filhos dão trabalho. E mais trabalho do que ela se acha capaz de suportar.
Essa não foi a primeira vez que ouvi um pessoa da Geração Z ou um Millennial mais jovem expressar esse tipo de preocupação. Para pessoas dessas gerações, casamento, filhos e até mesmo outros tipos de relacionamentos parecem um desafio grande demais.
Eles curtem amizades — mas apenas se não exigirem muito esforço ou sacrifício. O casamento é palatável — mas apenas se contribuir para aumentar sua felicidade e seu conforto. E quanto a filhos? Bem, todo mundo sabe que ter filhos é um fardo desgastante para todas as áreas da sua vida, então, eles adiam essa decisão o máximo que podem. Eles viram outras gerações sofrerem e decidiram optar por conforto em vez de problemas, e bem-estar pessoal em vez de sacrifícios em prol de algo comum.
Contudo, as gerações mais jovens não são as únicas que evitam o desconforto. Parece que muitas pessoas, de todas as gerações — e não apenas nos Estados Unidos — passaram a acreditar que uma vida fácil, de confortos e bem-estar é (ou deveria ser) a regra na vida cotidiana.
Mercados inteiros estão reagindo a essa tendência. A indústria global do bem-estar atingiu quase US$ 7 trilhões em 2024, e deverá atingir US$ 9 trilhões até 2028, quase o dobro do faturamento que tinha apenas em 2019.
Essa crescente aversão ao desconforto afetou até as roupas que usamos: roupas confortáveis e mais casuais continuam a crescer em popularidade. Estamos optando por comprar o que nos faz sentir confortáveis, em vez do que parece bonito. Empresas especializadas em athleisure [moda com conforto] começaram a se concentrar em designs multifuncionais, que permitem ir do trabalho para a academia, e da academia para uma festa à noite sem trocar de roupa. Ninguém vai mais precisar desabotoar a calça quando comer muito. Calças de moletom macias podem ser usadas para ir à igreja, a um jantar ou até mesmo para trabalhar.
Muito dessas coisas podem parecer neutras do ponto de vista espiritual e moral — afinal, será que Deus realmente se importa com a sua calça de moletom? Mas essa avalanche de confortos e autocuidados que nos cercam contribui para as pessoas assumirem uma postura que evita, de forma mais ampla, todos os tipos de dificuldades. Está cada vez mais normal evitar as complexidades de relacionamentos que possam nos forçar a sair de nossa aconchegante zona de conforto.
E sim, essas zonas são como cavernas, pois essa sede de conforto coincide com o aumento do isolamento social. Obcecados por nossas próprias zonas de conforto, repelimos cada vez mais tudo e todos que possam tornar nossa vida mais difícil. O casamento exige perseverança. Filhos custam caro. Amizades pedem sacrifícios. Por que não ter só um cachorro?
O problema com esse modo de pensar não é simplesmente o fato de que ele nos impede de ter relacionamentos significativos ou de nos casar ou de ter filhos — embora realmente resulte em tudo isso. O problema mais profundo é que essa maneira de viver está em desacordo com o caminho do evangelho. Em um mundo voltado para atender nosso estilo de vida fácil e nos proporcionar sentimentos que nos trazem felicidade, o chamado de Cristo pode parecer um convite tão incômodo quanto raspar a pele com uma lixa ou andar por aí com as meias molhadas.
Com frequência, seguir Jesus é algo difícil. Você não pode viver como alguém que entroniza o conforto e simultaneamente declara que Jesus é o Senhor.
Jesus diz: “Se alguém quiser vir após mim, negue‑se a si mesmo, tome a sua cruz e siga‑me.” (Mt 16.24). Este não é um chamado para pegar um travesseiro e um edredom e deitar-se em algum cantinho confortável do Reino de Deus. Pelo contrário, é um chamado para sacrificar voluntariamente seu conforto, seu progresso pessoal e sua sensação de bem-estar em prol do chamado de Deus.
Contudo, enquanto o bem-estar físico é temporário e o conforto é passageiro, a paz que vem de seguir a Jesus por meio de sacrifícios é duradoura. Na verdade, é o único tipo de paz duradoura.
Como líderes da igreja, prestamos um desserviço ao mundo com apelos que chamam novos crentes a uma vida mais fácil com Jesus e com programas de discipulado que prometem o melhor da vida com Cristo aqui e agora. A mensagem que devemos transmitir é que uma vida com Cristo exige que renunciemos a tudo para segui-lo.
Mas precisamente nisto está a nossa alegria: nada do que perdemos ou ganhamos neste mundo pode ser comparado com o que ganhamos com Cristo. O que sacrificamos por Jesus se desvanece em comparação com o que ganhamos vivendo em comunhão com ele. Em uma era mergulhada no consumo de confortos temporários, nós, cristãos, carregamos a certeza da paz eterna que advém da união e da obediência a Cristo como Senhor e Salvador.
Como seria, para você, trocar o bem-estar deste mundo pela paz de espírito mais profunda — ainda que mais exigente — de alguém que vive em união com Cristo? Que sacrifícios Deus está chamando você a fazer para garantir o consolo que decorre de estar no centro de sua vontade? Não há nada de errado em desfrutar de confortos ou em querer nosso bem-estar. Mas conforto, bem-estar e uma vida tranquila não devem ser alcançados à custa do chamado sacrificial do evangelho.
Nicole Massie Martin é diretora de operações da Christianity Today.