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A Geração Z busca direção espiritual nas redes sociais

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Christianity Today February 18, 2025
Illustration by Mallory Rentsch Tlapek / Source Images: Getty

À medida que a crise de fé avança na cultura estadunidense, a geração Z encontra cada vez menos recursos e pessoas que possam ajudá-la a responder questões sobre identidade, pertencimento e propósito. Assim, não causa espanto o fato de que esses jovens estejam buscando respostas na internet.

Eu faço parte da geração Z e estou familiarizada com essa inclinação: prefiro mil vezes consultar o aplicativo de uma loja para procurar um item a incomodar um funcionário. Procurar respostas na internet pode parecer um tanto antissocial, se visto de uma perspectiva superficial, mas é um reflexo da nossa cultura altamente autônoma bem como do extenso uso que a geração Z faz da internet.

E, evidentemente, o mesmo acontece nas igrejas. Com o declínio no número de pessoas da geração Z que frequentam os cultos, não surpreende o fato de que jovens adultos estejam migrando para espaços virtuais, em vez de espaços físicos, para encontrarem respostas para suas grandes questões.

Acredito que integrantes da geração Z que se dizem “sem religião” tenham mais curiosidade sobre a fé do que comumente achamos. É fácil mensurar dados sobre afiliação religiosa; já mensurar curiosidade e abertura espiritual é mais difícil. No espaço online, podemos perceber quais são as questões que as gerações mais jovens estão levantando e quem está se propondo a respondê-las.

Um bom exemplo é o Girlscamp [acampamento de garotas], um podcast para ex-membros da Igreja de Jesus Cristo dos Santos dos Últimos Dias [Mórmons] processarem essa transição relacionada à sua fé. A anfitriã, Hayley Rawle, entrevista ex-mórmons, compartilha histórias anônimas de seus ouvintes e suas percepções sobre diferentes aspectos da fé mórmon.

Nesse podcast, Rawle encoraja seus ouvintes a construírem uma nova visão de mundo longe de uma religião cheia de exigências. Como resposta, ela oferece uma filosofia secular de relativização da verdade como solução para os limites rígidos de religiões que fazem altas exigências. Descobri esse podcast há mais ou menos um ano. Ainda que seu conteúdo seja focado nos mórmons, ela também critica abertamente a igreja cristã e o cristianismo ocidental. Seu podcast é só um exemplo de como a geração Z se engaja com a espiritualidade sem as obrigações de uma comunidade encarnada.

Por experiência própria, vejo que muitos cristãos da minha idade aprendem que a religião é algo praticamente ausente da vida de alguém da geração Z. Parece haver uma crença de que as pessoas costumavam ser religiosas, mas que a realidade não é mais essa. Isso, porém, é uma mentira.

No papel, a geração Z está ficando cada vez mais conhecida como os “sem religião”, porque muitos afirmam não seguir uma crença específica nas pesquisas sobre afiliação religiosa. Como metade da geração Z se identifica como sem religião, parece ser uma suposição lógica dizer que esses jovens não estão interessados em espiritualidade. No entanto, a única coisa que muda aqui é a forma como a geração Z busca a espiritualidade, que difere das gerações anteriores.

Ryan Burge, professor associado de ciências políticas na Universidade do Norte de Illinois, aponta que as taxas de pessoas que se identificavam como “ateus/agnósticos” crescia em porcentagem a cada geração, até a transição da geração Y para a geração Z, quando a categoria “nenhuma crença em particular” tem crescido continuamente no decorrer dos anos.

Timothy Pickavance, professor da Escola Talbot de Teologia, enxerga o crescimento da categoria “nenhuma crença em particular” como um indicador da postura aberta que a geração Z tem em relação à espiritualidade, em lugar da postura cínica ateísta antes adotada.

“Esse dado aponta para a sensibilidade da geração Z para coisas espirituais e seu desejo por uma vida espiritual profunda”, ele afirmou em uma entrevista.

A participação da geração Z na religião pode ser englobada pelo termo fé desvinculada, cunhado pelo Insituto de Pesquisa Spingtide, o qual descreve a forma como as pessoas constroem sua fé através de uma combinação de elementos, como crenças, identidade, práticas e comunidade. Esses elementos são provenientes de várias fontes, religiosas ou não, e não mais de apenas um único sistema.

Podcasters e influenciadores — pessoas como Rawle, que funcionam, em certos aspectos, como uma figura pastoral ou alguém que dá direção espiritual para seus seguidores — hoje são uma das fontes consultadas por aqueles com “nenhuma crença em particular”. Convidados e ouvintes são instruídos em um “evangelho” secular, no qual a boa-nova é que eles podem forjar suas crenças religiosas, mantendo as doutrinas com as quais concordam e livrando-se de restrições ou ensinamentos dos quais discordam.

Pessoas que não possuem religião podem escutar semanalmente o podcast, da mesma maneira que as que são religiosas escutam o sermão do domingo e aprendem algo novo sobre como operacionalizar a sua espiritualidade. Em um episódio do podcast Girlscamp, um convidado falou sobre reservar a noite do domingo para jantar com a família e amigos, e pedir que os membros da família compartilhem algo pelo qual são gratos, em vez de fazer uma oração. E em vez de compartilhar histórias das Escrituras, eles ensinam a seus filhos lições seculares sobre amor e aceitação.

Cristãos e outras pessoas que possuem uma afiliação religiosa podem achar essa abordagem muito ambígua e pouco autêntica. Mas essa abertura que as pessoas de vinte e poucos têm para o mundo imaterial é um solo fértil para conversas significativas e engajamento.

A geração Z pode estar abandonando as intituições religiosas tradicionais, mas ela não está abandonando a espiritualidade. Na década de 1990, houve uma mudança nos termos usados para descrever o arcabouço moral e espiritual de um indivíduo: passou-se  do termo religioso para o termo espiritual. Agora, o termo mudou novamente para “construção de significado”.

Deus e a comunidade estavam no centro da vida religiosa, mas, para a geração Z, ambos não são mais prerrequisitos para uma vida espiritual intencional. Como Pickavance pontuou: “Ainda há um anseio e uma intenção clara em relação à espiritualidade, mas que não estão sendo trazidos para o âmbito de uma tradição específica.”

Eliza Smith DeBevoise, capelã da Universidade Converse, frequentemente aconselha estudantes fazendo-lhes perguntas sobre as grandes questões da vida. Ela afirma que a geração Z é extremamente espiritual. “Independentemente de a Geração Z ser religiosa ou não, eles estão fazendo um trabalho bem árduo de formação espiritual” que, segundo ela me disse, “para ser honesta, eu nunca vi em gerações anteriores que eram mais devotamente religiosas.”

DeBevoise afirma que os estudantes têm dificuldade para se identificar com uma única religião, ainda que eles tenham convicções pessoais fortes. Ela disse que até mesmo esses alunos devotos se preocupam com o fato de parecerem pessoas de mente fechada.

Como todas as gerações anteriores, a Geração Z tem a eternidade em seu coração. Contudo, esse anseio por algo além de si mesmos não pode ser saciado em uma jornada espiritual individual. Precisamos da igreja.

Como Henri Nouwen escreve em seu livro Formação espiritual: “A formação espiritual não é um exercício de devoção particular, mas de espiritualidade coletiva. Temos experiências pessoais com Deus, mas juntos somos constituídos como o povo de Deus”. O impulso religioso que os seres humanos sentem é mais bem satisfeito no contexto de uma comunidade de fé, e é um impulso que a igreja pode estar preparada para atender.

Esse guias digitais, como a Rawle, por exemplo, podem orientar as pessoas em suas jornadas espirituais sem jamais conhecê-las. Isso faz com que os riscos sejam baixos para as pessoas que estão interessadas em navegar pela desconstrução religiosa. Embora uma exploração significativa da nossa espiritualidade possa ocorrer on-line, não fomos criados para responder a essas perguntas por conta própria ou em um vácuo.

Os jovens cristãos também podem ser tentados a se envolver com sua fé apenas de forma on-line. Mas podcasts, influenciadores ou livros cristãos devem ser catalisadores para a comunidade presencial local, e não substitutos.

Embora as nossas igrejas sejam imperfeitas, a comunidade encarnada que decorre dessa reunião semana após semana, mês após mês e ano após ano é um aspecto essencial da vida espiritual. Quando a espiritualidade é praticada de forma independente, ela é incompleta.

Os adolescentes passam, em média, cerca de 9 horas por dia em frente às telas. Embora fazer parte de comunidades primordialmente on-line possa ser regra para a geração Z,  a igreja não deve concentrar sua energia nisso [para atrair atenção]. Há muitos recursos cristãos on-line de qualidade para combater os recursos seculares ou de desconstrução [da religião], mas o que os jovens precisam, mais do que apenas informações, é de comunidade — e isso começa com relacionamentos concretos.

Sou um exemplo vivo de como a amizade autêntica pode ser um catalisador para a fé, porque isso é parte da minha história. Por causa dos adultos que investiram em mim, eu tive um lugar seguro para transitar por todos os questionamentos que eu tinha sobre Deus. E eu sabia que era amada e aceita, não importava o que acontecesse.

Hoje, como uma das líderes do Young Life para meninas do ensino médio, minhas colegas e eu estamos aprendendo a construir relacionamentos dentro e fora da igreja. Temos a tarefa de criar espaços alternativos fora da igreja, onde as garotas possam encontrar Jesus, como, por exemplo, sair com elas para almoçar, levá-las para tomar um café e marcar presença nos seus jogos esportivos. A partir daí, organizamos estudos bíblicos, onde temos a oportunidade de envolvê-las espiritualmente e convidá-las para uma comunidade de fé.

Em vez de apenas criticar as horas que os jovens passam on-line, precisamos oferecer a eles uma alternativa que os atraia: uma comunidade amorosa, encarnada e imperfeita.

Como Mary Demuth escreveu para a CT em 2011:

Vivemos em uma cultura móvel, que às vezes nos isola. Nós, que criamos personas na web, que aperfeiçoamos nossa maneira de nos ocultar, talvez achemos assustador nos ligarmos a uma igreja local. E, no entanto, Deus nos chama para lá, com todas as nossas qualidades e defeitos. Ele nos chama para fazermos uma aliança com outros discípulos de Jesus, para bagunçarmos nossas vidas com pessoas com as quais talvez, em outras circunstãncias, jamais nos relacionássemos. Nessa bela conflagração de comunidade, aprendemos a arte de amar uns aos outros e de mostrar ao mundo fora de nosso círculo quem é Jesus.

Para aqueles que evitaram a comunidade por vários motivos, sim, há riscos em fazer parte de uma comunidade de fé física e presencial. Você não pode ser anônimo, não pode se desconectar quando se sentir incomodado. Mas você também tem a oportunidade de ser conhecido e amado — algo que uma comunidade on-line jamais poderá oferecer.

Jenna Mindel é bolsista do NextGen Accelerator da Christianity Today. Recentemente, ela se formou em jornalismo pela Biola University.

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