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De que modo a forma como Bolsonaro aborda os evangélicos é diferente da forma usada pelos presidentes anteriores?
Guilherme de Carvalho: Bolsonaro se colocou abertamente como representante dos evangélicos; é a primeira vez que uma presidência não trata os evangélicos como “os outros”. Ele conseguiu fazer isso mesmo sem ser evangélico. Seu sucesso lança luz sobre um problema que venho apontando já há algum tempo: as elites culturais nacionais ainda não concederam cidadania brasileira ao movimento evangélico.
Iza Vicente: Bolsonaro conseguiu o que muitos líderes religiosos jamais conseguiram: unir diversos segmentos evangélicos, das mais plurais denominações e tradições. Tal união não se deu a partir da unidade em Cristo, mas sim pelo medo que a propaganda bolsonarista fomentou no meio evangélico, e também pela sede de poder e reconhecimento de grande parte dos líderes evangélicos. Mesmo com os evangélicos em pleno crescimento, com a ascensão da bancada evangélica, e sem nenhum tipo de perseguição sistemática, Bolsonaro utilizou falácias e discursos vazios para indicar que mudanças na sociedade envolvendo direitos civis de minorias representam um ataque aos valores que os evangélicos prezam, e que ter um presidente supostamente cristão atenuaria esses efeitos.
Ziel Machado: Bolsonaro tem mais vínculos com a comunidade evangélica. Sua esposa é evangélica, ele teve mais presença na igreja evangélica, um pastor evangélico celebrou seu casamento. Assim, seu vínculos com os evangélicos antecedem os vínculos políticos. São vínculos de amizade, de alguém que se simpatiza e se identifica com os valores cristãos. Portanto, não é só uma estratégia política. Tornou-se uma estratégia política, mas esses laços antecedem seu uso político.
Os outros presidentes não têm essa mesma proximidade com o mundo evangélico, e tratam-no como mera aproximação política, como se fosse uma estratégia de campanha. Com isso não quero dizer que essa atitude seja inválida ou inadequada. De fato, uma aproximação política honesta pode ser mais ética do que uma aproximação afetiva entrelaçada com valores confusos.
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Jacira Monteiro: Bolsonaro cooptou os cristãos, a partir de manipulação, oferecendo-se como a única salvação contra a esquerda, contra o PT. Apresentou-se como um messias. Pegou para si pautas importantes para os cristãos, como as questões do aborto e da família, e fez delas a base de sua campanha. Também fez (e continua fazendo) um jogo de doisladismos: “ou eu sou o presidente e livro vocês do mal, do Satanás — a saber, do PT e da esquerda — ou o Brasil volta para as trevas”. Tudo isso usando em sua campanha um linguajar agressivo e polarizado.
Ricardo Barbosa: Desde que os evangélicos se tornaram uma força política, em virtude do seu crescimento numérico, os políticos têm procurado construir pontes para se aproximar desse grupo e conquistar seus votos, visitando igrejas, participando de eventos religiosos, por exemplo.
Segundo dados do livro do antropólogo Juliano Spyer, “O Povo de Deus”, na década de 70, os evangélicos representavam apenas 5% dos brasileiros. Hoje são um terço da população adulta do país, e seguem crescendo. Parece-me que de todos os presidentes, desde Fernando Henrique Cardoso (1995-2002) até Bolsonaro, Bolsonaro foi quem melhor se identificou com uma parcela significativa de cristãos (evangélicos e católicos), pela sua linguagem, pelos valores que defende, como a família tradicional, o patriotismo, por se opor às ideologias de gênero. Grande parte do eleitorado cristão brasileiro se importa muito com estes mesmos valores.
Confira a biografia dos nossos entrevistados no artigo principal.
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