Não basta transmitir cultos on-line. As igrejas precisam promover o senso de comunidade.

O que os pastores podem aprender com a queda na frequência aos cultos on-line.

Christianity Today October 9, 2020
Illustration by Mallory Rentsch / Source Images: PeopleImages / Adene Sanchez / Getty Images / Christopher Gower / Alex Knight / Unsplash

Desde que o coronavírus forçou a realização on-line dos cultos públicos, quase um terço dos fiéis pararam de frequentar a igreja, de acordo com uma recente pesquisa do instituto americano Barna. Entre os millennials, a queda foi ainda maior: metade dos que costumavam ir à igreja parou, desde o início da pandemia.

O motivo não está claro. Mas, quando a frequência cai, precisamos parar, refletir e entender a razão.

Talvez as pessoas estejam “cansadas das videoconferências”. Mesmo que as pessoas gostassem desse recurso antes do isolamento, semanas de videoconferências on-line no trabalho, na escola e em reuniões sociais fizeram com que muitos ficassem sem vontade de se conectar por mais uma hora nas manhãs de domingo. Mas será que isso realmente representa quase um terço dos fiéis?

Pode ser o louvor. Cantar em casa, em frente a uma tela, não proporciona a mesma experiência que cantar na igreja, cercado por outros cristãos. O tempo de atraso e falhas ocasionais na transmissão tornam incrivelmente difícil entrar na música e encontrar aquele “estado de fluxo” que muitos associam à boa adoração. Mas a maioria dos frequentadores não considera o louvor a parte mais importante de sua experiência na igreja. O autor cristão Gary Thomas identificou nove “caminhos sagrados” que levam as pessoas a se conectar a Deus. Apenas dois deles priorizam a música. O ministério North Point, da mesma forma, descobriu que a adoração por meio da música é uma prioridade para, talvez, 14% dos frequentadores regulares da igreja.

Outra razão pode ser que os membros da igreja vivam em áreas com Internet limitada ou inexistente, o que torna os serviços de streaming ao vivo praticamente impossíveis. Em 2018, a Federal Communications Commission dos Estados Unidos descobriu que 18,3 milhões de americanos não tinham acesso à Internet de banda larga. Como explicou a comissária Jessica Rosenworcel, “a questão não é que as pessoas não possam pagar. Simplesmente não está disponível”. Essa falta de acesso é realidade especialmente nas zonas rurais do país. Mas isso representa apenas 5% ou 6% dos americanos e não parece explicar a queda dramática na frequência à igreja desde março.

Deixe-me sugerir outro potencial motivo. Há algo envolvido no fato de ir à igreja que ainda não foi traduzido a contento para o ambiente on-line. As igrejas estão focadas no que acontece no santuário durante aquela uma hora por semana, o que é compreensível. Antes da pandemia, muito esforço era dedicado para criar aquele evento de 60 a 90 minutos. Assim que a pandemia eclodiu, o mesmo tipo de energia foi canalizado para traduzir o culto para um formato on-line. Mas algo se perdeu.

Nas manhãs de domingo, antes da COVID-19, enquanto as pessoas que participam da organização do culto planejavam e se preparavam para o que aconteceria dentro do santuário, algo mais acontecia do lado de fora, no saguão, no átrio, no pátio, na área de boas-vindas da igreja. Algo menos planejado e, para algumas igrejas, menos intencional. As pessoas conversavam. Elas compartilhavam sua vida. E, pelos cantos do santuário, ou em salas reservadas para esta finalidade, as pessoas oravam juntas pelas mais variadas necessidades. Antes da COVID-19, o prédio da igreja reunia em si adoração, comunidade e cuidado pastoral.

Quando os cultos passam a ser on-line, o que ocorre com esse conjunto de coisas? Para muitos membros de igreja, esses pontos de conexão pessoal desapareceram. Alguns, embora bem poucos, podem ter feito um esforço para resgatá-los no Zoom ou no Facebook Live — com instruções para virtualmente dizer olá para alguém que esteja “sentado ao seu lado”. Meu palpite é que as perdas no senso de comunidade e no cuidado pastoral tiveram um impacto dramático na frequência às igrejas.

Embora o culto público seja algo que as igrejas possam produzir e transmitir em grande escala para quem quiser assistir, senso de comunidade e conexão pessoal são coisas que não podem ser transmitidas em grande escala. Isso significa que ambos não se sujeitam à produção em massa. Ser pessoalmente conhecido e cuidado é quase sempre uma experiência individual, que não pode ser produzida em massa. Os cultos públicos, em compensação, tendem a ser projetados para um modelo de produção em massa do tipo um-para-muitos — ou seja, como algo que é produzido por uma pessoa e distribuído para muitas. É possível apenas observar o culto público como membro da audiência, mas com muito pouca participação.

O que ocorre no santuário, durante o culto público, é aparentemente fácil de se transmitir on-line. O que acontece fora do santuário, porém, é incrivelmente difícil. Mas, se o senso de comunidade e o cuidado pastoral são aquilo de que as pessoas precisam e não estão mais recebendo no culto on-line, faz sentido o fato de muitos terem parado de frequentá-lo.

Quando as igrejas priorizam os cultos de adoração da mesma forma que faziam antes da pandemia, é fácil ignorarem outras atividades aparentemente periféricas, embora sejam essas atividades que tornam a frequência à igreja uma experiência vital para muitos. A verdade é que podemos ter interpretado mal por que um terço da congregação frequentava a igreja todos os domingos. A razão pode ser o cuidado e o consolo que as pessoas recebiam de seus amigos e pastores. Na verdade, presumimos que o culto promove a comunidade, mas a realidade pode ser o oposto: a comunidade e o cuidado pastoral apoiam o culto.

Para muitos, o “periférico”, na verdade, é central. E, se essa parte desapareceu porque igreja é apenas o que está sendo transmitido on-line, então as pessoas procurarão outro lugar para atender às suas necessidades relacionais e espirituais.

A pesquisa do instituto Barna fez essa mesma descoberta. E ela vale não só para os que abandonaram a frequência aos cultos, mas também para aqueles que continuam a assisti-los on-line. A pesquisa relatou que “os cristãos praticantes em todos os EUA estão buscando oração e apoio emocional”. Na transição para um [formato apenas de transmissão dos cultos] (https: // j hn / what-is-an-online-broadcast-virtual-stream-local-church-some-úteis-disttions /), algumas igrejas podem ter perdido de vista essas outras prioridades importantes. O culto de adoração foi dissociado da comunidade e do cuidado pastoral. Ao passar para o formato on-line, o prédio da igreja não mantém mais esses três elementos juntos.

Diante disso, o que as igrejas podem fazer?

Embora a pesquisa do instituto Barna a princípio pareça perturbadora, ela também oferece uma percepção crucial. A frequência aos cultos — on-line ou presenciais — não pode mais ser o único parâmetro que os líderes de igreja usam para medir a saúde espiritual e relacional de sua igreja ou congregação. As igrejas devem buscar novas formas de medir as conexões da comunidade e o cuidado pastoral que estão acontecendo em outros lugares de seu ecossistema on-line e off-line.

As igrejas seriam sábias se desenvolvessem novas métricas neste tempo de dispersão. Considere rastrear os pedidos de oração que chegam por meio dos formulários on-line da igreja. Algumas igrejas já notaram aumento na quantidade desses pedidos. As igrejas também podem verificar o número de ligações que os pastores e sua equipe estão recebendo e fazendo para sua congregação. As métricas devem medir o que importa. Elas não precisam ser descartadas, mas, em vez de rastrear a frequência como a principal, a igreja pode explorar novas métricas capazes de ressaltar, promover e capacitar a comunidade e o cuidado pastoral.

A COVID-19 também pode redirecionar nossa atenção para a interação membro a membro na comunidade. O prédio da igreja servia como uma espécie de plataforma social. A comunidade crescia organicamente naquele espaço. Que espaços podemos criar na era da COVID-19, que encorajem e fomentem essa experiência em que as pessoas se sentem cuidadas, conectadas e conhecidas? A pandemia nos tirou algumas coisas, mas ela não precisa ter a palavra final.

Existem muitos exemplos encorajadores de igrejas que vêm fazendo experimentos criativos em defesa da comunidade. As melhores ideias parecem começar pela consideração da personalidade singular de cada congregação. Por exemplo, a All Saint’s Episcopal Church, no bairro de Ravenswood, em Chicago, é uma igreja histórica que tem a tradição de celebrar mensalmente os aniversários dos membros. Assim que a quarentena começou, essa tradição foi adaptada para o ambiente on-line. As pessoas passaram a enviar por e-mail uma foto para um dos pastores, que as compila em uma montagem de fotos que a igreja integrou à transmissão ao vivo do culto, nas manhãs de domingo. O contexto on-line deu aos participantes a chance de se envolverem mais e de verem a si mesmos e aos outros no culto on-line. Essa prática ajudou as pessoas a se sentirem conectadas umas às outras.

Tais esforços não precisam envolver alta tecnologia, porém. Algumas igrejas reativaram antigas abordagens, que comunicam o cuidado de maneira mais profunda. Uma igreja em Nova York organizou os membros em grupos de cerca de quinze pessoas e designou líderes para acompanhá-los, ver se precisavam de oração, comida ou outros suprimentos. Embora a equipe pastoral possa não ser capaz de se conectar com cada membro da igreja, distribuir o fardo atua como um catalisador, fazendo o ministério acontecer por todo o corpo da igreja, e não apenas a partir da liderança.

Uma igreja batista na Carolina do Sul convidou seus membros a escreverem cartas para residentes de lares de idosos, os quais não podem receber visitas e se sentem muito solitários. O esforço extra que essas cartas enviadas envolve vai muito além das simples palavras escritas. Novamente, pela simples organização de um plano criativo, os líderes da igreja conseguiram mobilizar os membros para ministrarem fora do santuário.

Em Moose Jaw, Saskatchewan, uma igreja imprimiu e distribuiu cartazes nos quais estimulavam as pessoas a telefonar ou enviar e-mails em caso de necessidade. Embora alguns dos que procuraram a igreja precisassem de provisões materiais, outros apenas se sentiam solitários e telefonavam, a fim de conversar ou pedir oração. Outra igreja da região montou um time de conselheiros espirituais, que pudessem fornecer “escuta compassiva” a qualquer pessoa que telefonasse. E um terceiro grupo, como a igreja em Nova York, organizou um serviço telefônico que, como uma carta enviada pelo correio, comunica mais que um simples texto ou e-mail em grupo.

Há, provavelmente, tantas ideias para apascentar comunidades quantas forem as comunidades. A questão é que a COVID-19 é um convite à criatividade das igrejas. Como um amigo sempre gosta de me lembrar: “No meio da devastação, há uma oportunidade para inovação”. É uma palavra oportuna para a igreja em um tempo sem precedentes.

Adam Graber é diretor da FaithTech e coapresentador do podcast Device & Virtue. Você pode encontrá-lo no Twitter @AdamGraber.

Traduzido por Maurício Zágari.

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