No ano passado, participei de muitos podcasts cristãos para divulgar dois livros novos que eu havia escrito. A maioria dessas conversas foi bem parecida, mas uma delas terminou com uma troca de ideias que me pegou de surpresa.
O entrevistador perguntou se eu já havia mudado de opinião sobre alguma grande questão teológica. Ao escutar aquilo, entendi que ele estava perguntando o que eu diria para o meu eu mais jovem, do passado, com menos experiência teológica. Então, respondi: “Você não precisa ser radical para ser cristão”.
Depois de soltar essa resposta, precisei perguntar a mim mesmo o que eu realmente queria dizer com aquilo. Eu não estava pensando no vigor constante, na energia fervorosa e na ingenuidade sincera da juventude — ou nos movimentos de renovação e nas denúncias proféticas que tudo isso costuma gerar. A inclinação “radical” a que me referia é um fenômeno mais específico, o qual, creio eu, também é conhecido por muitos cristãos americanos da minha idade.
Quando estávamos no ensino médio e na faculdade, ser um cristão radical e “louco por Jesus” era apresentado como o objetivo de qualquer cristão sério. A mensagem partia de pastores de jovens, de livros como Radical, de David Platt, de suas muitas derivações, e de letras fervorosas da música pop cristã. Pelo que consigo me lembrar, o conceito era composto de quatro partes.
A primeira parte do conceito afirmava que os ensinamentos de Jesus são o cerne do evangelho. Isto é, para saber o que significa ser cristão, não precisamos olhar para o Antigo Testamento nem mesmo para os apóstolos. Devemos olhar para os Evangelhos de Mateus, Marcos, Lucas e João, para as palavras de Jesus que são ensinadas neles.
Em segundo lugar, o evangelho radical revelava que nem sempre o que escutamos na igreja são os ensinamentos de Jesus. Na verdade, Jesus nem sequer estava particularmente interessado na igreja, exceto como um lugar onde se reúnem as pessoas comprometidas em viver seus ensinamentos, para se apoiarem mutuamente. Se você foi criado na igreja, muito provavelmente viu os ensinamentos de Jesus serem minimizados, atenuados ou suavizados para que suas partes mais incisivas não causassem tanto desconforto.
Em terceiro lugar, os ensinamentos radicais de Jesus estão necessariamente em conflito com o estilo de vida norte-americano, que significava, no mínimo, uma mescla de individualismo, consumismo, secularismo, nacionalismo e militarismo. Mas que também poderia incluir elementos de uma típica vida adulta em muitos lugares do mundo: casamento, filhos, um emprego gratificante, um imóvel financiado, um bairro seguro, uma boa educação, economias no banco e férias remuneradas — algo que muitos hoje chamam de sonho americano. Ser radical por Jesus significava sacrificar tudo isso por amor a ele. Você poderia seguir Jesus ou correr atrás de “viver bem”, mas jamais poderia ter as duas coisas.
Finalmente, a alternativa radical a esse “viver bem” era o tipo de vida sobre a qual lemos nas páginas da história da igreja: as vidas de santos, monges, missionários e mártires. Como a vida de São Francisco, que vendeu todos os seus bens. Ou a de Dorothy Day, que fundou o Movimento dos Trabalhadores Católicos. Ou a vida de Martin Luther King Jr., que liderou as marchas pelos direitos civis em Selma e Washington. Ou ainda a de Dietrich Bonhoeffer, que foi executado em um campo de concentração nazista.
O exemplo vivo mais proeminente era Shane Claiborne. Seu livro de 2006, A Revolução Irresistível, detalhava como ele havia ajudado a estabelecer uma comunidade cristã intencional em um bairro pobre da Filadélfia. Claiborne havia passado um tempo em Calcutá, com a Madre Teresa, e em Bagdá, com uma equipe de pacificação, durante o bombardeio da cidade liderado pelos EUA. Isso é o que significa seguir Jesus, concluíram os aspirantes a radicais (independentemente de ser essa ou não a mensagem que Claiborne pretendia transmitir). Os cristãos comuns precisavam despertar para a vida radical.
Os crentes jovens, impressionáveis e precoces como eu levaram essa mensagem a sério. Aprendi que há cristãos e cristãos — ou seja, há pessoas que se dizem cristãs e há pessoas cuja vida manifesta a sua fé cristã.
Eu queria fazer parte do segundo grupo. Queria ser um pacifista empobrecido e membro de uma comunidade intencional. Era isso que uma simples leitura dos Evangelhos exigia — eu estava convencido disso — e certamente não queria ser um daqueles que apenas ouvem, mas não praticam os ensinamentos de Jesus (Tiago 1.22-25). Como Jesus adverte no final do Sermão do Monte: “Nem todo aquele que me diz: ‘Senhor, Senhor’, entrará no reino dos céus, mas apenas aquele que faz a vontade de meu Pai, que está nos céus” (Mateus 7.21).
Então, eu passava os verões no exterior, fazendo trabalho missionário. Fiz estágio em um abrigo para moradores de rua. Busquei maneiras de me doar, de me sacrificar, de sofrer. Quando era recém-casado — o que claramente já era uma concessão que eu fizera ao mundo e à carne! — minha esposa e eu morávamos em um apartamentinho antigo e feio, de um quarto, nos arredores de Atlanta. Um dia, estávamos passando de carro por um bairro mais rico, e minha esposa se perguntou em voz alta que tipo de casa compraríamos um dia, quando tivéssemos filhos e empregos de verdade. Ai, ai. Respondi, com uma seriedade espiritual austera, que ficaria feliz em morar em nosso velho apartamento pelo resto da vida.
Fui prontamente informado de que seria bem-vindo para continuar morando lá para o resto da vida, contanto que também estivesse disposto a viver sozinho.
Gostaria de poder dizer que isso me fez acordar, mas essa minha piedade presunçosa levou um bom tempo para começar a diminuir. Hoje, professor em uma universidade cristã, casado e pai de quatro filhos — com uma hipoteca, um salário e, sim, férias remuneradas — só o que posso fazer é sorrir, quando vejo uma piedade semelhante em algum dos meus alunos. Grande parte dela é algo bom, repleto de sincera doçura e digno de nada além de honra e encorajamento. Mas, em parte, ela é mera fase de desenvolvimento: e uma fase que precisa ser vivida. Não deve ser contornada, pois o caminho não passa em volta dela, mas sim através dela.
No entanto, há algo nessa atração que sentimos pelo radical que vale a pena questionar. Por que o caminho radical era uma proposta tão atraente para mim e para tantos outros? Por que movimentos semelhantes, cheios de boa intenção, mas equivocados, às vezes acabam dando errado?
Seu apelo básico é bastante óbvio: com esse conceito radical, adolescentes das classes média e média-alta podiam aspirar a algo que ia além da vidinha doméstica de seus pais. Será que Jesus veio ao mundo e morreu na cruz para que os moradores dos subúrbios pudessem ter uma casa com piscina e tábuas de queijos? É improvável. Certamente a vida cristã é muito mais do que isso.
O impulso de ser radical também contribuía para o leve conspiracionismo presente em grande parte da religiosidade americana: Jesus pregava a paz, mas Constantino batizava pela espada. Paulo proclamava o martírio, mas Agostinho justificava a guerra. Pedro distribuía bens a todos os necessitados, mas o papa se gloriava em sua pompa dourada e cheia de ostentação.
Por essa perspectiva, a igreja é uma instituição corrupta ou, na melhor das hipóteses, meramente humana, indigna de nossa confiança. Se os ensinamentos originais de Jesus foram rejeitados ou corrompidos pela “religião organizada”, então, é preciso se afastar da congregação local e se voltar apenas para Jesus — ou, mais precisamente, para o Jesus que você encontra pessoalmente nos Evangelhos.
Há um instinto aqui que é inegavelmente correto. Os ensinamentos de Jesus são realmente difíceis, tanto de ouvir quanto de colocar em prática. A igreja está realmente repleta de pecadores falhos, de pessoas que fracassam completamente em viver o caminho de Cristo. Os cristãos realmente são, na expressão do teólogo Nicholas Healy, “insatisfatórios”, imperfeitos. A salvação que Deus nos oferece no evangelho não se resume a bens terrenos, bênçãos e felicidade. E realmente existem aspectos do estilo de vida almejado pela cultura que são incompatíveis com a vida e os ensinamentos de Jesus.
Nesse sentido, a mensagem radical está correta: onde quer que as igrejas tenham comprometido sua fé e seguido outros deuses — o dinheiro, a guerra ou qualquer outro ídolo mundano —, o chamado para que voltem para Jesus não é apenas apropriado, mas urgente. Voltemos ao Senhor, custe o que custar. “Portanto, lembre‑se de onde caiu! Arrependa‑se e faça as obras que praticava no princípio” (Apocalipse 2.5).
Contudo, na prática, a mensagem radical invariavelmente chega a uma conclusão infeliz (embora não admitida): quase ninguém na face da Terra é um cristão “verdadeiro”. Quase nenhuma comunidade de crentes é uma igreja “verdadeira”. As pessoas que estão sentadas nos bancos das igrejas e pregando em seus púlpitos simplesmente não são suficientemente sérias ou comprometidas. (Na verdade, essa conclusão costuma ser comparativa: ora, elas não são tão fervorosas quanto eu, esse radical que as julga, sou.)
Contudo, em vez de aceitar essa implicação sombria, gostaria de propor uma alternativa: sim, os radicais são crentes fiéis. Mas o caminho que eles trilham não é o único caminho para a vida cristã. De fato, seu caminho está tão fora do padrão para a maioria dos crentes, na maior parte dos tempos e dos lugares, que proponho que eliminemos a palavra radical do nosso vocabulário cristão.
Sendo bem sincero, essa não é uma ideia nova. Durante séculos, os cristãos não se exortavam mutuamente a serem “radicais”. O uso dessa palavra, particularmente como um termo que denota aprovação, explodiu apenas nos últimos 50 anos. Muitos cristãos não percebem que entre as fontes desse uso estão a política de extrema esquerda e a política reacionária, embora o termo tenha migrado para um uso mais convencional e até mesmo centrista desde a década de 1970. Na igreja estadunidense, suspeito que seja possível rastrear a trajetória da palavra, desde contextos políticos de esquerda e anabatistas, por meio da influência de teólogos como John Howard Yoder e Stanley Hauerwas, no final do século passado.
Mas, seja qual for a origem do termo, devemos abandoná-lo por dois motivos. O primeiro é que, ao usá-lo de forma indiscriminada e frequente, esvaziamos seu sentido. Com base nesse uso indiscriminado, qualquer coisa pode ser considerada radical, desde que você realmente acredite nisso. Mas se coisas como montar uma tábua de queijos ou ouvir Bach, votar em um determinado candidato ou comprar uma pintura de um artista cristão podem ser consideradas radicais, então, a palavra perdeu completamente o sentido. De repente, ser radical voltou a significar o mesmo estilo de vida burguês que nós, jovens cristãos fervorosos, tentávamos evitar lá no passado.
Como a maioria dos cristãos, conheço alguns discípulos de Jesus que são verdadeiramente radicais. Estou pensando, por exemplo, em um amigo de longa data que, por duas décadas, trabalhou em uma grande cidade americana para aliviar o sofrimento dos sem-teto. Se reservássemos o termo radical para pessoas como ele, eu não faria nenhuma objeção. Mas, se não tivermos essa opção, é melhor abandoná-lo por completo.
O segundo motivo é que a maioria dos cristãos não são nem verdadeiros radicais como meu amigo, nem radicais autoproclamados como aqueles que critiquei. A grande maioria dos cristãos, de todos os lugares e de todas as épocas, são apenas e tão somente pessoas comuns.
Não são pessoas impressionantes. Não são extraordinárias. Apenas lutam para sobreviver. Não se consideram santos nem heróis. Se conseguem ir à igreja no domingo e orar antes das refeições e de dormir, já se consideram bem-sucedidos. Acreditam em Deus, confessam seus pecados e buscam graça em Jesus. E, para ser bem sincero, isso é tudo.
Cristãos comuns não são como o jovem rico, que ficou triste ao se afastar de Jesus (Mateus 19.22), nem como Simão de Cirene, que carregou a cruz de Jesus (Marcos 15.21). Eles são mais parecidos com o outro Simão, chamado Pedro, que se recusou a carregar a cruz e negou até mesmo conhecer Jesus. São como Tomé, que não acreditaria até ver o Senhor ressuscitado com os próprios olhos. São como o pai anônimo em Marcos 9, que clamou a Jesus: “Eu creio; ajuda‑me a vencer a minha incredulidade!” (v. 24).
Nas palavras de Paulo, eles levam “uma vida tranquila e pacífica”, e são afortunados se a viverem “com toda a piedade e dignidade” (1Timóteo 2.2). Muitas vezes são fracassados, pessoas que cometem erros, que desistem — pessoas comuns, que se esforçam para sobreviver. Não são o que já chamei em outro artigo de “soldados de elite espirituais”. Mas são todos aqueles que invocaram o nome do Senhor Jesus e — exatamente como Ele prometeu — foram salvos (Romanos 10.13; Joel 2.32).
O cristianismo talvez fosse mais impressionante se fôssemos todos verdadeiros radicais. Mas, então, seria uma fé para heróis, e não para pecadores. Deixaria de ser uma boa-nova para os desamparados e indefesos. Seria uma mensagem para poucos, não para o mundo inteiro (1João 2.2). Seria uma fé apequenada, menor, tanto em quantidade quanto em qualidade.
Quando eu era mais jovem, tinha um desejo ardente de ser radical como Jesus. Isso era bom, era o certo. Mas o que me faltava era a compreensão do peso do pecado no mundo — e, com ele, a morte, o sofrimento, a aflição, a tristeza e a dor. O que me faltava era a dimensão da graça, do evangelho e da igreja. Eu não entendia que ali nos eram oferecidos uma libertação profunda o suficiente, uma cura forte o suficiente, um perdão amplo o suficiente para abranger tudo o que a humanidade caída precisa.
O cristianismo não está reservado para os radicais. O Senhor não ajuda quem pode ajudar a si mesmo. Por um milagre, Ele ajuda os que estão total e pateticamente desamparados, indefesos — dos quais eu sou o principal. Essa é verdadeiramente uma boa-nova. E é também um terrível escândalo. E o ponto é justamente esse.
Brad East é professor associado de teologia na Universidade Cristã de Abilene. Ele é autor de quatro livros, entre eles, The Church: A Guide to the People of God [A igreja: um guia para o povo de Deus] e Letters to a Future Saint [Cartas para um futuro santo].