Este artigo foi adaptado da newsletter em inglês de Russell Moore. Assine aqui.
Não muito tempo atrás, um economista cristão da Índia mencionou que fazia parte de uma coalizão incomum. Nesse grupo encontravam-se de ateus a crentes, de astrônomos e físicos a líderes religiosos, todos buscando desmascarar a astrologia em seu país de origem. Isso não era resquício de uma velha superstição oriental, como a maioria dos secularistas ocidentais presumiria. Essa fome por horóscopos era, em grande parte, segundo esse economista, algo que fora importado de outra cultura — a saber, da cultura da América do Norte. Isso não deveria nos surpreender.
Em seu livro lançado a vários anos atrás, Strange Rites: New Religions for a Godless World [Ritos estranhos: novas religiões para um mundo sem Deus], Tara Isabella Burton aponta para estudos que mostram que 40% daqueles que dizem não ter nenhuma afiliação religiosa acreditam em videntes, e que 32% dizem acreditar em astrologia. Burton argumenta que a secularização não significa um abandono de crenças e práticas espirituais, mas sim uma “remixagem” delas.
Podemos ver esse fascínio pelo papel das estrelas na vida humana em recentes investigações ficcionais sobre o significado da vida. O romance de Karl Ove Knausgaard, publicado em 2021, The Morning Star [A estrela da manhã], situa uma série de conflitos familiares e de crises pessoais em contraste com o contexto de uma estrela misteriosa e agourenta no céu noturno. Uma história semelhante é o pano de fundo do romance de Sarah Perry, lançado em 2024, Enlightenment [Iluminação], que é sobre, entre outras coisas, um batista calvinista inglês desconstruído que questiona se um cometa está controlando seu destino. Ele encontra propósito em uma combinação da física com um espécie de astrologia.
Perry disse em entrevistas que, por um lado, seus editores insistiram para que ela explicasse conceitos teológicos, como predestinação e providência, em termos mais claros para os leitores. Supõe-se, por outro lado, que os editores presumiram que os leitores precisariam de pouca explicação para o tipo de fatalismo que se baseia na leitura das estrelas.
A astrologia, claro, é uma prática antiga, mas perfeitamente adequada para esta era. Em suas Confissões, Agostinho argumentou que a astrologia era uma maneira de justificar o pecado de alguém sem buscar misericórdia de Deus. Os astrólogos podiam dizer: “A causa do seu pecado foi determinada de forma imutável pelos céus” e “O planeta Vênus (ou Saturno ou Marte) fez isso”, escreveu Agostinho, “o que significa que o homem, feito de carne e sangue e corrupção arrogante, é livre de culpa e que o criador e governante do céu e das estrelas deve arcar com a culpa”.
Nós, seres humanos, de fato desejamos autojustificar nossa culpa, mas acho que a astrologia tem um apelo adicional que é diferente daquele dos tempos antigos.
Agora temos escolhas cotidianas que nossos ancestrais jamais imaginaram. Até bem recentemente, um orientador de carreira no ensino médio era algo que não fazia sentido. De certa forma, o mesmo é verdade para outras grandes escolhas — como com quem uma pessoa se casa, por exemplo, ou onde mora. Mas todas elas estão repletas de possibilidades de se fazer a escolha errada. Afinal, por que você deveria confiar em seu eu de 19 ou 20 anos para tomar decisões que definirão não apenas a sua vida, mas as gerações que virão depois de você?
Pierce Moffett — personagem do romance Aegypt, de 4 volumes, da autoria de John Crowley — percebe que a clarividência e a astrologia tratam da questão de “admitir que o cosmos era, em algum sentido, uma história — que o universo era um cosmos”. Ele conclui que a busca por harmonias e direções para o futuro é, em última análise, uma busca para fornecer “Cliff’s Notes [um guia resumido] para os enredos de suas próprias vidas”.
Diante do medo de destruir o próprio futuro — ou do arrependimento por temer já ter feito isso — quem não gostaria de uma maneira resumida de encontrar esse enredo? Isso é especialmente verdade quando toda uma cultura global parece estar atormentada por uma ansiedade que o filósofo Hartmut Rosa descreve como uma expectativa de estar simultaneamente no controle de tudo e, ao mesmo tempo, sentir que tudo está fora de controle.
Quando uma pessoa se sente dominada por um destino que está fora do seu controle, há consolo em acreditar que o destino é controlado pelo nosso signo do Zodíaco. Ao menos assim, então, segundo alguém pensa, podemos meio que ver o que está por vir.
Os reis magos da narrativa do nascimento de Jesus, no Evangelho de Mateus, eram orientais que liam as estrelas, tendo discernido no céu noturno um sinal da vinda do rei de Israel, que fora profetizado (Mateus 2.1-2). Quando eles calcularam por meio da estrela a localização do menino Jesus, Mateus nos conta que eles “se regozijaram muito com grande alegria” e adoraram Jesus, quando o encontraram (Mateus 2.10-11, ESV, na íntegra).
À primeira vista, a orientação dos reis magos pode nos levar a concluir que também nós devemos procurar aqueles que podem ler constelações. Mas a história de Jesus derruba por terra tudo isso.
A antiga profecia — “Eu o vejo, mas não agora; eu o avisto, mas não de perto. Uma estrela surgirá de Jacó; um cetro se levantará de Israel” (Números 24.17) — também se originou com um ocultista frustrado. Balaão foi contratado pelo rei Balaque para lançar uma maldição sobre Israel — uma maldição que Deus continuava transformando em uma bênção que incluiria a profecia da estrela da manhã de Jacó.
O apóstolo Paulo escreveu pouco sobre o que chamamos de “a história do Natal”, com exceção de breves referências como esta: “Mas, quando chegou a plenitude do tempo, Deus enviou seu Filho, nascido de mulher, nascido debaixo da Lei” (Gálatas 4.4). Ele fez isso para nos libertar da escravidão — escravidão à “Lei”, mas também ao que ele chama de “princípios elementares do mundo” (v. 3).
Como Paulo escreveu à igreja de Colossos, a propensão era voltar a ser escravizado por esses “princípios elementares do mundo” (Colossenses 2.8). Os antigos não eram estúpidos em acreditar que estavam presos por forças fora de seu controle — pelos “elementos” de um universo que, no final das contas, matam a todos nós. O problema não é só que as pessoas sintam esse tipo de fatalismo, mas o fato de que nós realmente o desejamos.
“Antes, quando vocês não conheciam a Deus, eram escravos daqueles que, por natureza, não são deuses”, escreveu Paulo. “Mas agora, conhecendo a Deus, ou melhor, sendo por ele conhecidos, como é que estão voltando àqueles mesmos princípios elementares, fracos e sem poder? Querem ser escravizados por eles outra vez?” (Gálatas 4.8-9).
Quer seja com uma resignação do tipo “Bem, o que se vai fazer?”, quer seja com uma tentativa de canalizar as forças incontroláveis que acreditamos estarem nos jogando de um lado para o outro, nós, quando somos deixados por nossa própria conta, preferiríamos ter uma história que fosse escrita para nós pelo destino ou por tabelas ou por gráficos — ou mesmo por algum código legal da Bíblia — do que contemplar a possibilidade sombria de que não exista história alguma, apenas um vazio aleatório e sem sentido.
Um certo tipo de racionalista se ri do “atraso” daqueles que leem horóscopos. Mas há pouca diferença entre esse tipo de superstição e o tipo de tecno-utopismo que baseia o futuro, por exemplo, na “terraformação” de Marte [um processo hipotético de geoengenharia que trataria o solo do planeta vermelho e sua atmosfera para torná-los mais favoráveis aos assentamentos humanos] ou no downloading da consciência humana para a nuvem.
Não encontramos liberdade desse tipo de escravidão ao destino quando dominamos os elementos ou, pior ainda, quando tentamos dominar o Criador dos elementos. Não a encontramos nos tornando tão inteligentes quanto “o universo” nem aprendendo a tirar proveito dele — seja por meio da magia ou da tecnologia. Encontramos liberdade, em vez disso, como filhos e herdeiros do Pai que “enviou o Espírito de seu Filho ao [nosso] coração […], e ele clama: ‘Aba, Pai’” (Gálatas 4.6).
Em outras palavras, encontramos liberdade não nos tornando como os reis magos, e muito menos um Rei Herodes, alguém que tenta canalizar esse tipo de poder para se proteger. Encontramos liberdade quando, unidos a Cristo, clamamos, dependentes não de um universo impessoal, mas de um Pai que nos ama.
Ao perder sua necessidade de controle — mesmo o controle ilusório de prever seu futuro — você pode contar o futuro de Jesus como seu próprio futuro. O “destino” de Jesus, se prefere chamar assim, torna-se o seu. Ao perder sua vida, você pode encontrá-la.
Talvez a estrela no topo de cada árvore de Natal que você vir este ano o lembre disto: que a estrela, por si só, não pode ajudá-lo, enquanto você luta com um passado do qual pode se arrepender ou com um futuro que pode temer.
A pessoa que consulta seu horóscopo num aplicativo, ao seu lado na cafeteria, não é alguém que não seja confiável, nem é uma tola. Ela está tentando encontrar uma narrativa, uma história que faça sentido. Esse caminho não a levará até lá. Mas Deus é conhecido por redirecionar as pessoas para a verdadeira história — a história que se fez carne e habitou entre nós, cheia de graça e verdade.
Russell Moore é o editor-chefe da Christianity Today e lidera o Projeto de Teologia Pública.