Igrejas em todos os Estados Unidos e Canadá cantaram “O fogo do refinador /o único desejo do meu coração/é ser santo” por uma década inteira, depois que o pastor de adoração da Vineyard, Brian Doerksen, lançou esse cântico, em 1990.
“Overcome ”, escrito em 2007 por Jon Egan, líder de louvor de uma megaigreja, era tão popular quanto o primeiro cântico. Mas as igrejas norte-americanas só cantaram seus versos, “digno de honra e glória/digno de todo o nosso louvor/você venceu”, por cerca de três anos.
Os cânticos de adoração já não duram mais tanto quanto costumavam. A duração média de uma música largamente cantada é cerca de um terço do que era há 30 anos, de acordo com um estudo que será publicado na revista Worship Leader, em janeiro.
Para o estudo, Mike Tapper, professor de religião da Southern Wesleyan University, reuniu dois analistas de dados e dois ministros de louvor para analisar décadas de registros da Christian Copyright Licensing International (CCLI). A organização licenciadora fornece assessoria em direitos autorais para cerca de 160 mil igrejas na América do Norte e recebe relatórios periódicos sobre as músicas de louvor cantadas nessas igrejas, acompanhando cerca de 10 mil congregações ao mesmo tempo.
Olhando para as principais músicas [cantadas] nessas igrejas, de 1988 a 2020, os pesquisadores foram capazes de identificar um ciclo de vida comum para as músicas de louvor populares, segundo disse Tapper a CT. Uma música normalmente desponta nas paradas, sobe, atinge o pico e depois desaparece, conforme as equipes de louvor a retiram de suas listas de músicas cantadas no domingo de manhã.
No entanto, o arco de popularidade de um cântico de adoração, em média, diminuiu drasticamente de 10 a 12 anos para meros 3 ou 4. Os pesquisadores não sabem o porquê.
Marc Jolicoeur, que trabalhou no estudo, disse que os dados confirmam o que muitos ministros de louvor sentiam intuitivamente. Eles correspondem à sua experiência como ministro de louvor wesleyano, em New Brunswick, Canadá.
“Recebi três e-mails de pessoas da minha igreja esta semana, que diziam: ‘Você viu essa música nova, pastor?’”, conta ele. “O pastor da minha igreja não está dizendo: ‘Preciso do melhor e mais recente cântico de adoração esta semana’, mas, ao mesmo tempo, os cânticos parecem [ficar] obsoletos mais rapidamente do que antes.”
O aumento de velocidade da rotatividade das músicas parece estar de alguma maneira conectado às mudanças nos estilos musicais, disse Jolicoeur. O modelo perene de verso-refrão-verso para as canções cantadas nas igrejas deu lugar a músicas como Elevation Worship ou o lançamento de 2021 da Maverick City, “Jireh”, que tem versos que soam como refrões, seguidos por refrões de verdade, seguidos por várias pontes — três ou mais, dependendo de quem está tocando. “Jireh” é “um rolo compressor em forma de música”, de acordo com Jolicoeur, mas também é um exemplo das inovações musicais que envelhecem rapidamente.
“As músicas sempre mudaram”, disse Jolicoeur. “Mas queremos que as músicas mudem mais rápido agora. É a cultura. São as águas em que estamos nadando.”
Estudiosos da música cristã, entretanto, dizem que provavelmente não são as canções em si que estão provocando a mudança, mas a maneira como a música é distribuída.
Nos anos 90, os líderes de louvor conheciam as novas canções em conferências. Eles, então, ensinavam uma música para suas congregações, tocando-a por três semanas seguidas, pulando uma semana, tocando-a novamente no domingo seguinte e, em seguida, colocando-a em uma rotatividade regular. Ela podia permanecer em rotatividade por uma dúzia de anos.
Hoje, os líderes de louvor conhecem as músicas novas quando são lançadas no Spotify, Apple Music, Amazon, iTunes, Pandora e YouTube. Muitos cristãos terão ouvido uma nova música por semanas, via stream, antes de ouvi-la na igreja. E todo o processo caminha a uma velocidade diferente.
“Tudo está ligado aos mecanismos de como as pessoas estão descobrindo as músicas e como os padrões de consumo estão mudando”, disse Leah Payne, professora de teologia do Seminário de Portland, que está escrevendo uma história da música cristã contemporânea. “Trata-se de uma adoração que é sensível aos padrões de consumo.”
O novo modelo de distribuição é organizado em torno do “lançamento do álbum” como um evento, disse Adam Perez, pós-doutor em estudos litúrgicos na Duke Divinity School. Isso significa que todos — do compositor ao líder de louvor e aos fãs que vão à igreja — estão focados nas próximas novidades.
Esse modelo enfraquece o valor que tinham, no passado, um repertório musical comum e uma coletânea comum de canções. Mas também ajuda muitas igrejas a cumprirem sua missão de alcançar e incluir novas pessoas.
Para muitas congregações, é importante falar para o momento presente, segundo Perez. Os líderes de louvor não estão preocupados se uma música que tem boa aceitação hoje também será relevante em 2033. Ela só precisa se conectar com os dias de hoje. Isso lhes dá mais liberdade e os incentiva a abraçar novos estilos, mantendo-os atentos a canções que atrairão novas pessoas.
Mas nem todo mundo gosta disso. Algumas igrejas, evidentemente, optam por não usar cânticos de louvor contemporâneos. E mesmo aqueles que cantam as músicas de contemporâneas às vezes ainda sentem que essa rápida rotatividade pode criar uma sensação de que nada é sólido, de que nada dura, diz Nathan Shaver, um compositor e músico cristão que hoje pastoreia uma igreja em Indianápolis. A constante mudança de estilos e de modas pode fazer com que as pessoas sintam que a fé em si é uma moda passageira.
“Há um motivo para algumas pessoas estarem redescobrindo e cantando os salmos”, disse ele. “Sabe algo que é familiar, que tem história, que não mudou nem vai mudar amanhã? Eu me pergunto se as pessoas não sentem necessidade disso.”
No final das contas, Shaver decidiu que precisava ignorar as pressões do mercado ao escrever sua música. E tentou abordá-la como arte, como paixão.
“Você tem de escrever música porque ama. É daí que vêm os melhores cânticos de adoração ”, diz ele.
Mark Nicholas concorda. Vice-presidente de lançamentos da Integrity Music, Nicholas diz que os artistas podem cair na armadilha de perseguir um sucesso e passar todo o tempo analisando temas e tendências populares, em vez de se concentrar no que Deus deseja que escrevam.
“A luta do nosso negócio — e a luta de qualquer negócio, na verdade — é manter essa tensão entre nossos ideais e a realidade da economia”, disse Nicholas. “Você pode sentir quando uma música está em construção. Quando são escritas para atender a uma necessidade na vida de alguém, essas músicas carregam um algo mais. ”
Esse algo pode ser cantado nas igrejas por 10 anos ou por apenas uns poucos. Mas isso realmente não importa, disse Nicholas, contanto que a música certa se conecte às pessoas no momento certo.
Ele se lembrou da época em que colocou seu filho para dormir pela primeira vez, depois de adotá-lo aos quatro anos. Uma frase do hino “Grande é a tua fidelidade” me veio à mente: ‘Bênçãos todas minhas, com dez mil ao lado’”.
Ele não conseguia se lembrar da última vez que cantara isso, mas não importava. Aquele trecho veio a ele quando precisou.
Ele espera que as músicas que a Integrity Music lança para o mundo tenham esse tipo de impacto, criando o tipo de momento em que o fragmento de uma linha abre um coração para Deus.
No ano passado, quando a COVID-19 infectou milhares e, depois, centenas de milhares morreram, as igrejas em toda a América do Norte cantaram Way Maker: “fazedor de caminhos, fazedor de milagres, guardião de promessas, luz nas trevas, meu Deus.” A música foi divulgada pela Integrity, que fez um acordo com o autor da música, Sinach, um líder de louvor nigeriano, para tê-la gravada por Michael W. Smith e a banda Leeland. A música apareceu na lista da CCLI, subiu, e por um tempo ocupou o primeiro lugar das paradas.
Pode não estar lá no próximo ano. Até lá as igrejas podem não mais precisar dessa música.
Mas Nicholas acha que ainda terá importância. “Músicas que nos acompanham em certos momentos vão ficar conosco, mesmo que desapareçam um pouco mais rápido”, disse ele. “A música ‘Way Maker’ significará algo para as pessoas até seu leito de morte, porque as ajudou a atravessar um período difícil.”
Quer as igrejas cantem uma música por um ano ou por 10 mil, isso é tudo que se pode pedir de um cântico de adoração.
Daniel Silliman é editor de notícias da Christianity Today.
Traduzido por Mariana Albuquerque.
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