Fred Luter pertence à Convenção Batista do Sul há 35 anos. Mas os últimos quatro anos “têm sido um dos períodos mais difíceis” para ser negro na Convenção Batista do Sul (CBS), disse ele, uma vez que pastores brancos pareciam apoiar o presidente Donald Trump de forma acrítica, apesar de falhas de caráter pelas quais “teriam crucificado” o presidente Barack Obama.
Percebendo a disparidade, membros da congregação predominantemente negra que Luter pastoreia, em Nova Orleans, disseram a ele que estão “quase envergonhados” por serem membros da Convenção Batista do Sul. Eles até pediram para sair da CBS.
Mas Luter, o primeiro presidente afro-americano da CBS, não vacilou em seu apoio à convenção.
“Não estamos nesta convenção por causa de quem é o presidente dos Estados Unidos”, disse Luter. “Estamos nesta convenção por conta do nosso compromisso com a Grande Comissão e o Grande Mandamento.”
Luter compartilhou sua história como parte de uma série do YouTube intitulada Why I Stay [Por que eu fico], que apresenta testemunhos de líderes negros que permaneceram em círculos evangélicos brancos — entre os quais está a CBS — a despeito da crescente pressão para saírem. A série é apresentada por Dhati Lewis, vice-presidente do Conselho de Missões da América do Norte (CMAN) que está entre os funcionários negros de maior posição hierárquica das entidades da CBS.
“Temos que fazer tanto barulho quanto os detratores para permitir que as pessoas saibam tudo de positivo que está acontecendo na denominação”, disse Lewis aos cristãos negros e de outras raças diferentes da branca.
Essa mensagem positiva tem sido cada vez mais necessária, à medida que a saída da CBS de negros de alta hierarquia incentiva membros negros a questionarem seu próprio envolvimento na convenção. Até agora, a maioria das igrejas de minorias tem permanecido na CBS. Cristãos negros e de outras raças que encontraram um lar na convenção esperam manter as coisas assim.
O relacionamento entre a CBS e os cristãos negros “é como um casamento”, disse Marshal Ausberry, primeiro vice-presidente da CBS e presidente da Associação Nacional de Afro-Americanos (ANAA) da convenção. “No casamento, temos alguns momentos difíceis ao longo do caminho, mas não nos divorciamos.”
O ano passado foi um momento difícil. Charlie Dates, de Chicago, e John Onwucheckwa, de Atlanta, estão entre os pastores negros que anunciaram sua saída da CBS, alegando preocupações sobre o clima racial na denominação.
O pastor Dwight McKissic, do Texas, que já foi membro do conselho do Southwestern Baptist Theological Seminary e presença perene nas sessões de discussão de assuntos da CBS, disse que sua igreja está deixando a Convenção Batista do Sul do Texas (CBST) e também pode vir a deixar a CBS, se esta não deixar de apoiar uma resolução de 2019 que endossa a limitação do uso da teoria crítica de raça.
No entanto, as minorias étnicas continuam sendo uma presença marcante na CBS. Congregações compostas por pessoas que não são de origem anglo-saxônica representavam 22 por cento do total de 51.538 congregações da Convenção Batista do Sul em 2018, último ano para o qual há dados disponíveis. Isso incluiu uma alta recorde de 3.382 igrejas de maioria negra, um aumento de 90 por cento em relação a 2000. O número também incluiu 3.509 congregações hispânicas e 2.095 congregações asiáticas.
Terry Turner, pastor da região de Dallas e ex-presidente da CBST, disse que os relacionamentos ajudam a mantê-lo na CBS. O Programa de Cooperação da denominação, que financia missões e ministérios, é “a melhor maneira de edificar o reino”, disse ele, e a convenção é “inigualável” em missões, combate à fome e apoio às vítimas de desastres.
Quando liderou os batistas do sul, no Texas, Turner ajudou a lançar a iniciativa “Look Like Heaven” [Parece o céu] para incentivar a adoração e cooperação interculturais. Quando se trata de tensão racial, “eu só quero estar na vanguarda para tornar as coisas melhores”, disse ele.
Turner está preocupado, no entanto, com o fato de que os presidentes de seis seminários da CBS tenham causado uma “tensão desnecessária nas relações raciais”, no ano passado, quando emitiram uma declaração afirmando que “qualquer versão da teoria crítica de raça é incompatível com a Fé e Mensagem Batistas”, a confissão de fé da CBS.
Outros pastores negros da CBS compartilham da preocupação de Turner. Em Birmingham, Alabama, há dois anos, mensageiros da CBS adotaram uma resolução sobre a teoria crítica de raça e a interseccionalidade que provocou algumas objeções do plenário e, posteriormente, um documentário alegando uma agenda de justiça social na convenção. Os presidentes dos seminários emitiram sua declaração em parte para tratar de tais objeções.
Mas alguns dentre os afro-americanos questionaram a rejeição completa da teoria crítica de raça por parte dos presidentes, perguntando se eles haviam cedido à pressão e subvertido a vontade dos mensageiros da CBS. A teoria crítica de raça, embora seja falha como visão de mundo, tem seu uso limitado, dizem os pastores de cor, inclusive para ajudar a analisar preconceitos inconscientes nas instituições da CBS — das quais nenhuma jamais contratou um presidente-executivo que não fosse branco.
Ausberry tem dialogado com os presidentes dos seminários sobre as preocupações dos batistas de origem não anglo-saxônica. Os presidentes não minimizaram intencionalmente a opinião dos afro-americanos, disse ele, e admitiram que incluir pessoas de cor em suas deliberações sobre a teoria crítica de raça teria sido útil. ANAA e CMAN estão trabalhando em parceria com o intuito de lançar um novo esforço para alcançar as igrejas negras, cujos detalhes terão início ainda este ano.
Em março, porém, a ANAA disse estar desapontada com o fato de que os presidentes “não tenham mudado sua declaração original de incompatibilidade com a teoria crítica de raça em todas as suas formas” e reiterou que “temos forte convicção de que qualquer discussão sobre racismo sistêmico deve levar em consideração as experiências vividas pelos negros e outros grupos étnicos”.
O envolvimento contínuo com a CBS é benéfico para os cristãos de cor, disse Ausberry, por causa da “visão elevada das Escrituras” da convenção e de seu foco em alcançar os perdidos para Cristo. Ele sente “um chamado de Deus para estar na CBS”.
O pastor de Chicago, Adron Robinson, membro do Comitê Executivo da CBS e ex-presidente da Associação Estadual Batista de Illinois, sente um chamado semelhante.
Para ele, dentre as “inúmeras vantagens” de afiliação à CBS estão as oportunidades missionárias dentro e fora dos Estados Unidos, bem como o relacionamento com pastores de várias etnias. Contudo, Robinson acredita que o “apoio irrestrito” a Trump, por parte de alguns integrantes brancos da CBS que “tentaram batizar” a ideologia do ex-presidente, está fazendo com que pastores negros e latinos reconsiderem seu futuro envolvimento com a CBS.
“Alguns me disseram que estão com um pé fora da denominação”, disse Robinson. “Outros me disseram que estão avaliando as coisas e esperando para ver, e outros ainda me disseram que não têm intenção de sair neste momento.” O “caminho a seguir é a CBS voltar ao que o Senhor nos chamou para fazer. Isto é, viver a Grande Comissão e o Grande Mandamento”.
Robinson acredita que os pastores ligados às minorias estão aguardando a eleição deste ano para presidente da CBS, na reunião anual da convenção em junho, em Nashville, como um indicador do caminho que ela tomará. Os quatro candidatos anunciados até o momento são o diretor executivo da Convenção Batista do Noroeste, Randy Adams; um pastor do Alabama, Ed Litton; o presidente do Seminário Teológico Batista do Sul, Albert Mohler; e Mike Stone, ex-presidente do Comitê Executivo.
Todos os quatro falaram sobre as questões que estão sendo discutidas pelos afro-americanos e outras minorias étnicas. Adams lidera os batistas em uma das regiões com maior diversidade cultural da América. Litton assinou várias declarações sobre reconciliação racial nos últimos anos e será indicado por Luter. Mohler recebeu elogios no passado por seu trabalho em prol da reconciliação racial, inclusive por ter ajudado a inspirar um livro em 2017, Removing the Stain of Racism from the Southern Baptist Convention [Removendo a mancha do racismo da Convenção Batista do Sul]. Mais recentemente, ele recebeu críticas por apoiar Trump em 2020, depois de declarar que nunca apoiaria Trump, quatro anos antes.
Stone, membro do comitê diretor da Rede Batista Conservadora, expressou preocupação com a influência da teoria crítica de raça na convenção. Mas o pastor latino Javier Chavez, candidato a segundo vice-presidente da CBS este ano, disse que Stone “pressionou por diversidade” quando foi presidente da Convenção Batista da Geórgia, e ajudou a trazer Chavez à liderança da convenção estadual.
Embora Chavez queira ver mais hispânicos na liderança da CBS, ele está satisfeito com o alcance da convenção para integrantes de língua espanhola. Várias entidades da CBS oferecem programas e recursos em espanhol, disse ele, incluindo uma série de publicações da Lifeway Christian Resources, o braço editorial da CBS.
Para superar a tensão racial na convenção, “vamos abrir as nossas Bíblias”, disse Chavez, pastor da Amistad Cristiana, uma igreja hispânica em Gainesville, Geórgia. “Vamos sentar, conversar, e então orar e seguir em frente […] Vamos encerrar esta conversa.”
A reunião do Comitê Executivo no mês passado, em Nashville, ofereceu um vislumbre de esperança de que tal avanço seja possível. Em seu discurso presidencial, J. D. Greear sugeriu ter ouvido as preocupações articuladas por integrantes não pertencentes à raça branca, negros e de outras raças. Ele se dirigiu aos “nossos líderes negros, muitos dos quais eu sei que estão lutando para se manterem engajados em uma convenção que pensam que pouco se importa com vocês”.
“O melhor de nós é que somos Batistas da Grande Comissão”, disse ele, “e são esse evangelho e essa Grande Comissão que nos manterão unidos em tempos de provação”.
David Roach é pastor da Igreja Batista Shiloh, em Saraland, Alabama.
Traduzido por Leandro Bachega