Theology

Então é Natal e tudo o que eu queria era uma máquina do tempo

Editor in Chief

A transfiguração e o mistério do tempo e do espaço.

Hands holding a special hourglass.
Christianity Today November 27, 2025
Illustration by Silvia Reginato

No início deste ano, pedi a uma amiga que se imaginasse, por uns instantes, como uma viajante no tempo. Eu e ela acabamos no mesmo lugar.

A máquina do tempo não era literal, claro; era apenas imaginária. Foi uma pergunta que eu fiz, no fim de um dos episódios do meu podcast, para Beth Moore, essa amiga e convidada frequente do programa. Perguntei a ela: “Se você pudesse ser transportada para qualquer momento na Bíblia… exceto a ressurreição, para qual momento você se transportaria?”

Quando ela respondeu “para o momento da transfiguração”, e eu imediatamente gritei: “Eu também!”. Aquela era exatamente a resposta na qual eu tinha pensado!

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Naquele momento ali, no monte, Pedro, Tiago e João veem Jesus envolto por uma nuvem de glória resplandecente, e o ouvem falar com Deus. Esse momento reúne grande parte do restante da narrativa bíblica: a coluna de fogo e a nuvem que guiaram Israel pelo deserto; os ensinamentos de Jesus (convocando-os para um monte); a crucificação de Jesus; a Ressurreição; a Ascensão; a glória da Nova Jerusalém que viria — está tudo ali.

Mas a parte do relato da transfiguração que mais me tem intrigado ultimamente é a aparição de Moisés e Elias.

Em seu livro Lifting the Veil: Imagination and the Kingdom of God [Levantando o Véu: Imaginação e o Reino de Deus], Malcolm Guite faz referência ao seu poema “Transfiguração”, que começa assim: “Por aquele instante, ‘dentro e fora do tempo’, / Naquele monte, onde todos os momentos se encontram”. Guite afirma que a escolha das palavras foi inspirada pela presença de Moisés e de Elias na Transfiguração, pois “ambos, em seu próprio tempo e lugar, tiveram experiências de iluminação transfigurada no topo do monte; ambos viram Deus de forma inefável”. Guite continua:

Eu me perguntava se a aparição deles na presença de Cristo, no topo daquele monte, seria não uma repetição daquela primeira experiência ou uma revisitação deste mundo por essas figuras do Antigo Testamento, que representam entre si a Lei e os Profetas, mas sim o fato de que os discípulos estavam testemunhando a verdade de que, à luz do céu, no tempo do céu, por assim dizer, aqueles três momentos distintos — o de Moisés em seu monte, a seu tempo; o de Elias [em seu monte], a seu [tempo]; e o de Cristo neste momento [da transfiguração], no Evangelho — eram todos um só momento! Se Moisés e Elias viram a face de Deus em mistério, então [aquela face] não poderia ser outra senão a face de Cristo.

Em outras palavras, e se Moisés e Elias não estivessem, naquele momento, transcendendo milagrosamente o espaço (retornando do além), mas sim transcendendo o tempo? E se Pedro, Tiago e João tivessem testemunhado o exato momento em que Moisés, em seu monte, e Elias, no seu, contemplavam a glória de Deus? E se a glória que Moisés refletia, quando voltou do monte — tão intensamente brilhante que ele precisou cobrir o rosto — fosse a glória que emanava do rosto do Cristo transfigurado?

Em épocas passadas, essa ideia poderia ter parecido ridícula. Mas a ciência moderna nos mostrou que o universo é mais estranho do que imaginamos. Em termos gerais, pouco sabemos sobre como o tempo e o espaço funcionam, mas sabemos o suficiente para perceber que Agostinho estava certo, quando disse que o tempo não é algo fixo e linear, mas sim muito mais complexo. Leve um físico a uma sala de aula do ensino médio e observe o que acontece: entre as primeiras perguntas que lhe farão estará esta: “O que havia antes do Big Bang?”. O físico buscará uma maneira de dizer — em termos que a mente humana possa compreender — que falar em “antes” não faz sentido nessa pergunta.

Ora, ninguém sabe ao certo como Moisés e Elias estavam presentes naquele monte. Se Beth Moore e eu pudéssemos viajar no tempo até lá, talvez fizéssemos essa pergunta. Mas, sem dúvida, ouviríamos a mesma resposta que Simão Pedro ouviu, quando fez uma pergunta naquele momento, por não saber que outra coisa dizer. Ouviríamos: “Este é o meu Filho amado; ouçam-no” (Marcos 9.7).

Por trás de toda a especulação há uma verdade que muitos de nós precisamos ouvir. Afinal, nós também somos viajantes do tempo. Em um dos últimos versos que escreveu, o cantor e compositor Rich Mullins expressou isso da seguinte forma:

O que eu realmente preciso saber
É se Tu, que vives na eternidade,
Ouves as orações daqueles de nós,
que vivemos no tempo.
Não podemos ver o que está por vir
E não podemos nos libertar do que
deixamos para trás.

Em uma carta, C. S. Lewis respondeu a um cristão que enfrentava lutas espirituais e que dizia que as orações eram sem sentido, pois Deus já “sabe há milhões de anos exatamente o que você está prestes a orar”. Lewis fez a seguinte colocação: “Não é assim que funciona. Deus está te ouvindo você agora, de modo tão simples quanto uma mãe ouve um filho.”

A diferença que faz a atemporalidade de Deus é que este agora (que nos escapa no exato momento em que dizemos a palavra “agora”) é infinito para Ele. Se você precisa pensar na atemporalidade de Deus, não pense que Ele esperou por este momento durante milhões de anos: pense que, para Ele, você está sempre fazendo esta oração.

Quando uma criança pergunta como Deus pode ouvir orações feitas em Nashville e em Nairóbi, no mesmo instante, não pensamos que Deus se desloca rapidamente no espaço entre esses dois lugares. Ele é onipresente — e está tão presente em Nashville e em Nairóbi quanto em Netuno. De fato, Ele transcende os limites espaciais do próprio cosmos (1Reis 8.27). O mesmo se aplica ao tempo.

Quando você relembra algum trauma do passado, pode perceber mais do que apenas ter a consciência de que Deus estava com você. Ele está com você lá, naquele momento passado. Da mesma forma, seu entendimento vai além do fato de que Deus estará com você nesse futuro que hoje já lhe causa preocupações. Ele está com você lá, naquele momento futuro. Assim como a coluna de fogo e a nuvem protegiam os israelitas do Êxodo por todos os lados (Êxodo 14.19-20), Deus está fazendo o mesmo por você, agora. Você não precisa compreender isso totalmente. Como criaturas condicionadas ao vai e vem do tempo poderiam realmente entender? Você pode, no entanto, se maravilhar com o Jesus de Nazaré, que pôde dizer, 2.000 anos antes de Einstein: “Em verdade lhes digo que, antes de Abraão nascer, Eu Sou!” (João 8.58).

Pedro queria congelar o tempo no momento da transfiguração. Queria construir monumentos ali, tabernáculos que fixassem e tornassem permanente aquele lampejo de glória. Mas ele não entendia que não é assim que os tabernáculos realmente funcionam.

A glória de Deus não seguia um ritmo previsível, enquanto guiava o povo pelo deserto. Eles apenas sabiam que, quando vissem a glória descer sobre a tenda, acampariam, e quando isso não acontecesse, seguiriam em frente (Êxodo 40.34-38). Assim como Pedro, porém, muitas vezes queremos concretizar esses momentos em que sentimos a presença de Deus — seja pela nostalgia de uma era dourada que criamos em nossa cabeça, seja pela ansiedade em relação a um futuro que imaginamos.

Alguns, em seu zelo pelo calendário litúrgico, podem objetar que estou discutindo a Transfiguração quando, nesta época do Advento e do Natal, deveríamos nos concentrar na Encarnação. Mas tudo o que Elias e Moisés contemplaram na luz — e o que Pedro, Tiago e João testemunharam — foi, de fato, a Encarnação.

O mesmo João que testemunhou a Transfiguração escreveria mais tarde: “E o Verbo se fez carne e habitou entre nós, cheio de graça e de verdade, e vimos a sua glória, glória como do Unigênito do Pai” (João 1.14, ARA). Por trás de toda a banalidade de nossa vida, por trás de todas as tristezas e desgraças de nosso tempo, “a luz brilha nas trevas, e as trevas não a derrotaram” (v. 5).

Talvez não seja por mera coincidência que tantas histórias de Natal do passado explorem a instabilidade do tempo. Ebenezer Scrooge, personagem de Um Conto de Natal, vê tanto o passado quanto linhas temporais alternativas de seu futuro. George Bailey vivencia algo semelhante em A Felicidade Não se Compra. Cantamos “Ó Pequena Cidade de Belém”, no presente, como se estivéssemos olhando, agora mesmo, para a pequena vila, na época do nascimento de Cristo, e afirmando: “As esperanças e os temores de todos os anos se encontram em ti esta noite”.

Talvez os ritmos do Advento e do Natal nos conduzam a uma espécie de viagem no tempo. Olhamos ao redor para ver quem não está à mesa este ano. Vemos, agora, aqueles que um dia foram crianças e brincavam com o papel dos presentes nos adultos que imaginávamos que se tornariam.

Não podemos reviver o passado. Não podemos vislumbrar o futuro. Não podemos sequer nos apegar ao presente. No eterno “hoje” do Deus que criou, preenche e transcende o tempo, só podemos saber isto: Deus está conosco.

Russell Moore é editor geral e colunista da CT.

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