O pregador expositivo John F. MacArthur Jr., que ensinou as Escrituras a milhões de pessoas por meio de sermões gravados, transmissões de rádio, comentários bíblicos e uma Bíblia de estudo que virou um best-seller, faleceu aos 86 anos.
MacArthur dizia que a marca mais importante de seu ministério era que ele explicava a Bíblia com a própria Bíblia, sem encher os sermões com histórias pessoais, comentários sobre eventos atuais ou apelos à emoção, mas apenas pregando verdades atemporais. O pastor de longa data da Grace Community Church dizia que um bom sermão deve continuar sendo bom mesmo 50 anos depois de ser pregado.
“[Um bom sermão] Não é marcado pelo tempo, em função de nenhum tipo de evento cultural ou pessoal”, disse MacArthur. “Não trata de mim. E transcende não apenas o tempo, mas também a cultura.”
Ele publicou a Bíblia de Estudo MacArthur, em 1997, que conta com 20 mil notas sobre versículos específicos, bem como um índice de doutrinas importantes, introduções para cada livro da Bíblia e sugestões de planos de leitura da Bíblia. Essa Bíblia vendeu 2 milhões de exemplares em 22 anos.
Seu comentário do Novo Testamento — que faz parte de uma série que a Moody Publishers publicou em 34 volumes, ao longo de 31 anos — também vendeu mais de 1 milhão de exemplares.
“Ele foi o decano dos pregadores expositivos”, disse à Christianity Today Jerry Jenkins, autor de Deixados para Trás e ex-editor da Moody que propôs pela primeira vez a ideia de MacArthur fazer um comentário. “Era um expositor brilhante. Pregava sermões de 40 minutos que sempre pareciam durar apenas 10 minutos.”
MacArthur também gerava polêmicas com certa regularidade, tendo entrado em conflito com evangélicos que discordavam dele sobre os dons do Espírito Santo, os papéis bíblicos de gênero e o que é necessário para a salvação.
Às vezes, ele mesmo reconhecia que esses conflitos poderiam ter sido resolvidos com mais humildade. “Eu poderia ter entrado um pouco mais como um cordeiro do que como um leão”, disse ele sobre um sermão. Mas MacArthur também acreditava que a condenação de cristãos que não são cristãos de verdade era essencial — e essa foi a segunda marca fundamental de seu ministério.
Os seguidores mais devotados de MacArthur foram inspirados por seu furor. O site de notícias satíricas Babylon Bee frequentemente celebrava MacArthur como um guerreiro que triunfava em conflitos ridículos. A jornalista cristã Megan Basham elogiou sua coragem.
“MacArthur… recusou-se consistentemente a aderir às últimas modas em busca de relevância. E foi essa mesma recusa que conferiu ao ministério dele uma relevância duradoura para as novas gerações”, escreveu ela no X (antigo Twitter). “Sou eternamente grata pelo impacto que seus ensinamentos tiveram em minha vida.”
MacArthur, filho de Irene Dockendorf MacArthur e John F. MacArthur Sr., nasceu em 19 de junho de 1939. Ele era filho, neto, bisneto e tataraneto de pregadores evangélicos, cujas origens remontam ao Canadá e à Escócia.
Seu pai, pastor batista e evangelista itinerante, lançou no sul da Califórnia, no início da década de 1940, um ministério para estrelas de cinema, entre as quais figuravam os atores Roy Rogers e Dale Evans. Também teve um ministério de rádio chamado “Voz do Calvário”, que influenciou a conversão de John M. Perkins, que veio a se tornar um proeminente defensor evangélico da reconciliação racial.
O jovem MacArthur contava que começou a imitar o pai aos cinco ou seis anos de idade, subindo em uma caixa no quintal de casa para pregar para amigos da vizinhança e suas três irmãs mais novas, Jeanette, Julie e Jane.
“Não me lembro de existir alguma época em que eu não tenha crido no evangelho”, dizia MacArthur. “Eu fui uma daquelas crianças que nunca se rebelou e que sempre acreditou. E assim, não foi perceptível para mim quando Deus realizou sua obra redentora em meu coração.”
À medida que crescia, MacArthur passou a se interessar mais por esportes do que por pregação. Ele queria jogar futebol americano na faculdade, mas seu pai insistiu para que ele fosse para a Universidade Bob Jones, que não tinha um time intercolegial na época. Em vez de jogar futebol americano, MacArthur foi colocado em um time de pregadores de rua.
Ele “se irritava um pouco” na Bob Jones, como lembrou mais tarde. Mas um acidente de carro o convenceu de que precisava se submeter completamente a Deus.
Segundo a história que ele contou e recontou em seus sermões por muitos anos depois, ele estava viajando pelo país afora, com outros cinco jovens, em uma turnê de pregação, após seu primeiro ano de faculdade. O motorista tentou ultrapassar alguém em uma rodovia do Alabama e perdeu o controle. O Ford Fairlane de duas portas deu um giro completo e depois capotou a 105, 110 ou 120 quilômetros por hora, parando de cabeça para baixo.
MacArthur foi arremessado para fora do veículo, derrapando de costas na estrada.
“Minhas costas ficaram literalmente em carne viva”, lembrou ele. “Levantei-me e percebi que estava vivo.”
De bruços, internado no hospital por vários meses, ele decidiu retornar a Universidade Bob Jones para o segundo ano. Ele achou que discernira um chamado para o ministério e sentiu que precisava entregar tudo a Deus.
“Senhor”, orou ele, “agora posso ver que minha vida realmente está em tuas mãos e que tu tens controle absoluto não apenas sobre meu destino eterno, mas também sobre meu tempo aqui neste mundo.”
MacArthur teve outra chance de jogar futebol americano um ano depois, e fez uso dela, transferindo-se para o Los Angeles Pacific College. Mais tarde, ele alegaria ter sido recrutado por vários times profissionais, entre eles o Washington Redskins e o Cleveland Browns, mas seu histórico escolar mostra que ele não era um jogador de destaque na universidade da Califórnia que frequentava. Em um ano, ele fez apenas cinco tackles [jogada de defesa em que se tenta parar um jogador do time adversário que está avançando no campo com a bola na mão ] e três rushing yards [jogada de ataque em que o jogador tenta chegar o mais longe possível com a bola].
Em 1961, MacArthur decidiu que não queria dedicar sua vida ao futebol americano de maneira nenhuma. Ele preferiu seguir o exemplo do pai no ministério.
Seu primeiro emprego, terminado o seminário, foi como pastor associado de seu pai, em uma igreja que levava o nome de seu avô: a Igreja Bíblica Memorial Harry MacArthur. Depois de alguns anos, ele decidiu seguir carreira solo e aceitou um chamado para a Grace Community Church, uma congregação independente e não denominacional na região de Sun Valley, em Los Angeles, Califórnia. A morte de dois pastores em sequência havia deixado a congregação de cerca de 400 pessoas ansiosa para encontrar um pastor jovem.
MacArthur, que na época estava com 29 anos, não ficou impressionado com a igreja. O lema da igreja era “unidade no essencial, caridade no não essencial”, algo que ele descartou como tolo e sentimental. A igreja não tinha uma doutrina real, segundo MacArthur, e muitos dos membros antigos e até mesmo dos líderes da congregação não eram cristãos de verdade.
“Havia presbíteros não salvos naquele conselho e pessoas não salvas na liderança da igreja”, dizia MacArthur. “Mas havia muitas pessoas boas que sabiam o que queriam e sabiam que precisavam aprender a Palavra de Deus.”
MacArthur pregou seu primeiro sermão em 1969, sobre a passagem de Mateus 7.21, que diz: “Nem todo aquele que me diz: ‘Senhor, Senhor’ entrará no reino dos céus, mas apenas aquele que faz a vontade do meu Pai, que está nos céus.”
Depois disso, ele começou a pregar o Novo Testamento, um livro por vez, começando com o Evangelho de João e depois passando para a primeira e segunda epístolas de Pedro. MacArthur passava 30 horas por semana preparando sermões e delegava quase todas as outras responsabilidades pastorais aos presbíteros e líderes leigos da igreja.
A igreja cresceu rapidamente. A Grace Community Church construiu um novo prédio com capacidade para 1.000 pessoas, em 1971, e ampliou seu espaço novamente em 1977, triplicando de tamanho. Tornou-se a maior igreja protestante de Los Angeles no final dessa década.
A demanda pelas gravações dos sermões de MacArthur também explodiu. Os membros da igreja enviavam 5.000 fitas por semana, depois 15.000, depois 30.000. No final da década de 70, mais de 100.000 cristãos em todo o país recebiam os sermões gravados de MacArthur semanalmente. A igreja também lançou um ministério à parte, chamado Grace to You, para transmitir as mensagens de MacArthur na rádio cristã.
“O ministério de John prova o quão atemporal a pregação pode ser, quando se trata apenas de uma exposição bíblica sólida e clara”, disse Phil Johnson, diretor-executivo do ministério Grace to You, em 2011. “Se o objetivo da pregação é o despertar de almas espiritualmente mortas e a purificação e a transformação de vidas contaminadas pelo pecado, então, tudo o que realmente importa é que o pregador seja fiel em proclamar a Palavra de Deus com clareza, precisão e franqueza.”
Sua pregação, no entanto, não estava livre de controvérsias. Em 1979, MacArthur ensinou sobre Tito 2 e as instruções do apóstolo Paulo para as mulheres “estarem ocupadas em casa” e “sujeitas ao marido” (v. 5). Ele disse que as mulheres não deveriam trabalhar fora de casa e que uma família não deveria requerer duas fontes de renda.
Os líderes da igreja decidiram que a equipe toda, e não apenas a liderança, precisava ser composta exclusivamente por homens. O anúncio causou alvoroço na igreja e na comunidade ao redor. Várias pessoas deixaram a Grace, acusando MacArthur de “machismo cristão”.
No ano seguinte, a família de um homem que frequentava a Grace entrou com uma ação judicial por negligência clerical — a primeira ação desse tipo nos Estados Unidos, segundo o jornal Los Angeles Times. Ministros da igreja aconselharam um jovem suicida chamado Kenneth Nally, dizendo-lhe que deveria orar mais, ler a Bíblia e ouvir fitas dos sermões de MacArthur. Quando Nally tirou a própria vida, seus pais contrataram um advogado. Eles alegaram que os ministros que prestaram aconselhamento deveriam ser reponsabilizados segundo os mesmos padrões legais que se aplicavam aos psicólogos. Um tribunal da Califórnia acabou rejeitando a ação com base na Primeira Emenda.
Talvez a controvérsia mais marcante tenha ocorrido no final da década de 1980, depois que MacArthur publicou O Evangelho Segundo Jesus. Ele argumentou no livro que não bastava que os pecadores aceitassem a Cristo como Salvador; os verdadeiros cristãos também devem reconhecer Jesus como Senhor.
Segundo MacArthur, os evangélicos americanos haviam desviado do caminho milhões de pessoas com a “falsa certeza condenatória” dessa “crença fácil e insidiosa”. E, segundo ele, muitos seguidores professos de Cristo, com testemunhos de que tinham nascido de novo, estavam, na verdade, “gravemente enganados sobre a mais básica das verdades cristãs”.
Críticos, entre eles vários evangélicos conservadores do Seminário Teológico de Dallas, acusaram MacArthur de misturar fé com obras e de negar a justificação pela fé. O teólogo Charles C. Ryrie escreveu que MacArthur diluiu e poluiu a graça de Deus. Zane Hodges, professor de Novo Testamento, foi além, chamando os ensinamentos de MacArthur de “satânicos em sua essência”.
Outros evangélicos proeminentes se uniram em defesa de MacArthur. Argumentaram que ele estava apenas articulando ideias cristãs tradicionais sobre arrependimento e discipulado.
O teólogo J. I. Packer, por exemplo, identificou a posição de MacArthur com o ensino reformado de que a fé “é uma realidade que envolve toda a alma, e tem aspectos afetivo e volitivo, bem como intelectual”. O presidente do Seminário Teológico Batista do Sul, Albert Mohler, chamou a obra O Evangelho Segundo Jesus de “um corretivo muito necessário para mal-entendidos perigosos”.
Alguns observadores disseram que os dois lados simplesmente entenderam mal um ao outro.
“Muitas vezes há uma diferença entre o que MacArthur diz e o que ele aparentemente quer dizer”, escreveu o professor de Novo Testamento Darrell L. Bock. “Certas ambiguidades no estilo de MacArthur dificultam determinar qual é seu real posicionamento.”
Ninguém acusou MacArthur de ambiguidade em seus ataques aos carismáticos. Ele disse que os cristãos que acreditavam estar cheios do poder do Espírito Santo estavam ensinando um cristianismo falso, uma “aberração”. Ele os chamou de “pessoas desmioladas […] instigadas por Satanás” e condenou a ampla presença do movimento carismático na mídia cristã.
“Ele [esse movimento] tomou conta e redefiniu o cristianismo na mente das pessoas, e é uma forma aberrante de cristianismo”, disse MacArthur. “Sua teologia é ruim, é antibíblica, é uma aberração, e é destrutiva.”
MacArthur também foi claro sobre os cristãos que acreditam que as mulheres podem ser chamadas para ensinar a Bíblia, acusando-os de ignorar mandamentos universais e inequívocos das Escrituras, e de se envolverem em “rebelião aberta” contra a Palavra de Deus. As mulheres não devem sequer falar na igreja, segundo MacArthur, nem ocupar cargos de autoridade na igreja ou na vida secular.
MacArthur atacou especificamente a popular professora de Bíblia para mulheres, Beth Moore, dizendo que ela tinha habilidade natural para vender joias na TV, mas que não deveria confundir isso com um chamado para pregar. Ele disse para ela “ir para casa”.
Houve outra controvérsia na década de 2020, quando uma mulher chamada Eileen Gray veio a público para acusá-lo de envergonhá-la publicamente por ter deixado seu marido abusivo. David Gray, um pastor do ministério infantil da Grace Community Church, confessou ter batido em sua filha “com muita força — de maneira brutal”, nas pernas, pés, mãos e cabeça, e de ter arrastado seus outros dois filhos como forma de disciplina. Gray disse que havia sido instruída por pastores da Grace a perdoá-lo, mesmo que ele não se arrependesse, e a mostrar a seus filhos de que modo “sofrer como Jesus”. Quando ela, em vez de fazer isso, pegou seus filhos e se mudou dali, MacArthur a condenou do púlpito e instruiu a congregação a rejeitá-la, sugerindo que ela não era realmente cristã.
David Gray foi posteriormente preso por abuso infantil de caráter físico e sexual.
Hohn Cho, um presbítero da igreja, analisou a decisão de expulsar Eileen Gray, em 2022, e concluiu que ela havia sido tratada injustamente. Ele pediu aos líderes que se acertassem com ela, pelo menos em particular. O presbítero contou à Christianity Today que MacArthur disse para “esquecer o assunto”.
Em vez de seguir a ordem de MacArthur, Cho renunciou, apenas para descobrir que havia pelo menos outras oito mulheres na Grace com histórias de terem sido aconselhadas a permanecer com maridos abusivos, mesmo temendo por sua própria segurança e pela segurança de seus filhos.
A liderança da igreja se recusou a responder a acusações específicas, mas divulgou um comunicado defendendo o aconselhamento dado na igreja como bíblico, e chamando o artigo da Christianity Today de “mentiras”.
MacArthur, em outra ocasião, disse que teve dificuldade em lidar com críticas e acusações públicas, mas ficou especialmente magoado com o que chamou de “motim”.
“Já aconteceu várias vezes”, disse ele. “E é um choque. Sabe, seu próprio amigo íntimo levanta acusação contra você, aquele com quem você partia o pão. Percebe? Assim como as Escrituras dizem sobre Judas.”
As ondas de controvérsia, década após década, não limitaram de forma significativa a influência de MacArthur.
O santuário da Grace, com 3.500 lugares, ainda ficou lotado por várias vezes, a cada fim de semana, em 2025. Os sermões de MacArthur foram transmitidos em mais de 1.000 estações de rádio nos Estados Unidos, e distribuídos pelo ministério Grace to You. Mais de 700 homens matricularam-se no Master’s Seminary, onde MacArthur atuou como chanceler, e cerca de 5.000 participaram de uma conferência anual para líderes da igreja.
A Bíblia de Estudo MacArthur continua à venda e está atualmente disponível nas versões Nova Versão King James, Nova Versão Internacional, Versão Padrão Inglesa, Nova Versão Padrão Americana e a versão da Bíblia Padrão Legacy. O aplicativo para smartphones da Bíblia Diária MacArthur já foi baixado mais de 5 milhões de vezes.
Chip Brown, veterano na área de publicações, disse que as pessoas recorriam a MacArthur porque confiavam nele como pastor, e porque ele “estava apenas desvendando o que o texto diz e como isso se encaixa em nossa vida”.
MacArthur, por sua vez, dizia que esperava ser lembrado por ensinar a Bíblia.
“Eu realmente quero ser conhecido como alguém que foi um servo do Senhor”, dizia ele, “fiel ao ensino da Palavra de Deus e à revelação dos mistérios do evangelho do Novo Testamento”.
MacArthur deixa sua esposa, Patricia Smith MacArthur; seus filhos Mark, Matt, Marcy e Melinda; 15 netos e nove bisnetos.