Há alguns anos, eu me vi em uma condição que jamais imaginei estar: completamente dominado pela ansiedade, mergulhado na depressão e silenciosamente desmoronando sob o peso de toda essa situação.
Como pastor, eu sentia uma pressão constante para liderar da melhor maneira possível, pregar com clareza, tomar decisões coerentes, e cuidar daqueles que precisavam, tudo isso enquanto aparentava estar forte e espiritualmente equilibrado. Mas, por baixo daquela superfície, eu estava ruindo.
O ministério muitas vezes pode parecer uma rotina implacável. Encaramos o peso das expectativas que nós mesmos nos impomos, sem mencionar as expectativas (muitas vezes irreais) daqueles a quem servimos. Adicione a isso os desafios em cascata de um cenário pós-COVID-19, a ascensão da batalha espiritual e a crescente polarização da cultura — e verá que não é nenhuma surpresa [diante deste cenário] que muitos de nós estejamos exaustos, desencorajados e sofrendo em silêncio.
Por muito tempo, pensei que estava lutando esta batalha sozinho. Agora sei que não estou.
Na verdade, um estudo de 2023 do Barna Group revelou que, no meio protestante, “aproximadamente um em cada cinco pastores seniores nos Estados Unidos (18%) afirmam ter cogitado cometer atos de automutilação ou suicídio no ano passado”. Se considerarmos uma população de 30 mil pastores seniores, 5.400 será a quantidade de líderes que chegaram a considerar seriamente a possibilidade de automutilação e de suicídio — e isso apenas em 2022. Esse número deveria nos fazer parar e pensar.
Existe uma crise acontecendo entre pastores e líderes de ministérios — e muitos de nós estão atravessando esse vale sozinhos, em silêncio, abatidos pela vergonha, pelo medo e pela crença falsa que diz que procurar ajuda é sinal de fraqueza.
Mas nós não precisamos viver assim.
Da conversão ao chamado
Quando eu tinha 25 anos, um amigo me convidou para um estudo bíblico voltado para empresários, e foi através disso que eu vim a crer em Jesus Cristo. O Espírito Santo mudou a minha vida de maneira profunda. Eu me senti livre do peso das expectativas que os outros tinham e que eu mesmo tinha em relação a mim. Mas embora a salvação seja imediata, a santificação leva a vida toda. Mesmo depois da conversão, eu continuei lutando com minha insegurança e com a necessidade de provar o meu valor.
Depois de cinco anos no mundo dos negócios, entrei no seminário e comecei a servir no ministério vocacional em período integral. Isso foi há quase 30 anos. Desde lá, vi Deus em ação das mais variadas maneiras — mas também aprendi como é fácil, mesmo sendo pastor, negligenciar o que está se passando abaixo da superfície.
Quando as rachaduras começam a aparecer
É realmente difícil para mim identificar qual foi o meu primeiro encontro com a depressão. Olhando para trás, consigo perceber sinais [de depressão] já durante o ensino médio. Eu cresci em um lar cheio de amor, mas me sentia mais amado quando era elogiado por ter tido um bom desempenho na escola e no tênis. Em algum ponto ao longo do caminho, eu comprei a mentira que dizia que o meu valor depende do meu desempenho. Trabalhei duro para ter um bom desempenho em todas as áreas da vida, esperando que isso pudesse me tornar alguém digno de ser amado — não apenas por minha família, mas por todos que me cercavam.
Logo depois do seminário, eu me juntei à equipe da Igreja Perimeter. Foi nessa época que dei de cara com o primeiro obstáculo na estrada. Matt, que era meu chefe na época, reconheceu o que estava acontecendo e recomendou que eu buscasse aconselhamento. Assim eu fiz — e me prescreveram uma medicação para tomar. Por muitos anos, a medicação ajudou a equilibrar os altos e baixos das minhas lutas contra a depressão e a ansiedade. No entanto, as mentiras em que eu acreditava com relação a minha identidade, meu valor e minha dignidade continuaram me trazendo desencorajamento e vergonha.
No início do ano de 2020, aquele primeiro obstáculo na estrada deu lugar a uma espiral de depressão e ansiedade muito mais profunda do que tudo que eu já havia experimentado antes. Eu estava servindo no time de liderança executiva da Igreja Perimeter e liderando um movimento de igrejas em Atlanta. Quanto mais profunda a minha depressão se tornava, mais as mentiras se tornavam críveis:
“O movimento [de igrejas] não está indo bem e isso é culpa minha.”
“Como alguém que ocupa um cargo sênior do time de liderança executiva da Perimeter, eu deveria ter tudo sob controle.”
“O que as pessoas vão pensar de mim, se souberem o que realmente está se passando aqui dentro?”
Comecei a compartilhar minhas dificuldades com Matt, uma vez que, a essa altura, nós já éramos amigos há 30 anos. Um dia, quando estávamos sentados à mesa, durante o almoço, ele me olhou e disse: “Você não está bem”. E eu sabia que ele estava certo.
Se o Matt não tivesse me confrontado em amor, não sei quanto tempo mais eu poderia ter aguentado sem procurar ajuda. Na mesma hora, ele pegou o celular e ligou para um conselheiro que nós dois conhecíamos. E marcou um encontro naquela tarde para que nós três pudéssemos conversar. Para mim, foi um pequeno passo de fé conseguir dizer: “Eu realmente preciso de ajuda”.
Três dias depois, eu compareci a uma de nossas reuniões de liderança da Perimeter acompanhado do meu conselheiro e com algumas anotações. Mentalmente, eu não tinha certeza se seria capaz de compartilhar de forma coerente aquilo que tinha preparado. Confessei que precisava de ajuda e que eu não conseguiria continuar trabalhando sem tirar um tempo de descanso. Admiti que estava funcionando abaixo dos meus 20% — estava exausto, sem foco e emocionalmente esgotado. Eu tinha muita dificuldade em tomar decisões. Ficava encarando a tela do computador, olhando fixamente para os e-mails, sem conseguir respondê-los. Às vezes, eu nem mesmo conseguia dizer frases completas que fizessem sentido. Eu estava entrando em colapso. Esse foi o primeiro de dois colapsos que enfrentei nos anos seguintes. Em cada um deles, precisei passar dois meses afastado do trabalho.
Cheguei no meu limite
Eu estava assustado e sinceramente acreditava que não conseguiria sair daquela situação. Estava com medo de perder meu trabalho e, o mais importante, estava com medo de não conseguir ser o marido e o pai que um dia já fora e que precisava ser.
Com o tempo, fui percebendo que todos nós sentimos ansiedade e depressão em algum nível. Alguns de vocês podem se identificar com experiências mais profundas como a minha. Se esse é o seu caso, quero que saiba de uma coisa: você não está sozinho.
Como o processo de cura começou
Sempre que conto a minha história, as pessoas me fazem perguntas do tipo: “como você ficou curado?”. Geralmente, minha resposta se divide em duas partes. Eu acredito que quadros graves de depressão e ansiedade são decorrentes de problemas psicológicos e espirituais. Nós somos uma unidade psicossomática — composta de corpo e alma — e a Queda afetou todas as partes do nosso ser, incluindo nossa composição química e física. Do lado físico, experimentei resultados positivos com os medicamentos que me foram prescritos. Não estou dizendo que todos devam tomar algum tipo de medicação, mas, para alguns de nós, essa abordagem pode ser profundamente benéfica.
Minha depressão e minha ansiedade eram também problemas espirituais. Eu sou uma pessoa orgulhosa. Tenho minhas inseguranças. Às vezes, equivocadamente ligava a minha identidade a coisas que revelam meus ídolos, que são performance e aprovação. Confessar e me apoiar no poder transformador da Palavra de Deus e em minha comunidade me permitem ter vitórias no lado espiritual desses problemas. Eu não entendo plenamente como todas essas questões físicas e espirituais se combinaram e me fizeram chegar no ponto em que cheguei — mas Deus sabe. Tudo isso faz parte da sua obra de santificação em minha vida.
Durante meus dois colapsos, a cura começou quando novamente tomei consciência do incrível amor de Jesus por mim. Ele veio ao meu encontro nos momentos mais sombrios da minha história — nos pontos em que eu senti mais vergonha — e me fez lembrar que meu valor e minha dignidade não dependem da minha performance nem do que os outros possam pensar sobre mim. É tudo sobre Jesus! Saber que ele estava lá naqueles momentos era tudo o que eu precisava. Ele me ama através da minha família e dos meus amigos, aquelas pessoas que estão comigo na minha vulnerabilidade e me amam nos meus piores momentos.
Um versículo que continua me amparando e sustentando é 2Coríntios 12.9: “A minha graça é suficiente para você, pois o meu poder se aperfeiçoa na fraqueza”. Fraquezas não são deficiências. É através das nossas fraquezas que o Senhor realiza algumas de suas obras mais profundas em nós e através de nós.
Jesus me mostrou que eu não estava sozinho e que não precisava sofrer sozinho. Através do evangelho e do poder do Espírito Santo, ele me deu duas coisas que fizeram toda a diferença na minha jornada de recuperação: coragem e comunidade.
Coragem
Você não está sozinho nesta luta. E não precisa ler um monte de biografias para encontrar líderes cristãos e pastores que também sofreram com depressão e ansiedade — Martinho Lutero, Madre Teresa, Charles Spurgeon e Martin Luther King Júnior, só para citar alguns. Não há vergonha nem condenação em reconhecer que você sofre com esses problemas (Rm 8.1).
O inimigo sussurra em seu ouvido:
“Porque sofre com isso, você não é digno de ser pastor.”
“Você não estaria sofrendo, se sua fé fosse mais sólida.”
“Como você pode liderar esta igreja ou este ministério, se mal consegue dar conta de seus problemas?”
Essas mentiras aumentam o nosso medo e nos isolam. Mas quando realmente entendemos que nossa verdadeira identidade está em Cristo, o ciclo da vergonha é quebrado. Cristo garante que suas dificuldades não fazem de você um pastor pior, um líder pior, um cristão pior, um pai pior ou um marido pior.
Recuse-se a ficar calado. Mostre coragem, compartilhando com vulnerabilidade suas lutas com um amigo de confiança, um conselheiro ou outro pastor. Compartilhe as dificuldades que você enfrenta com a depressão, a ansiedade ou com qualquer outra coisa. Esse ato de comunicação e de aproximação é um primeiro passo crítico. Por favor, não sofra em silêncio. Encontrar pelo menos uma pessoa que possa caminhar com você pode ser o ponto de virada na sua jornada de recuperação e cura.
Comunidade
Nós precisamos uns dos outros. Eu não acho que teria conseguido me recuperar dos meus colapsos se não fosse pela comunidade que Deus colocou em volta de mim. Eu os chamo de “meu time”, e esse time inclui:
- Minha família — minha esposa, Leigh Ann, e nossos filhos. Leigh Ann tem sido uma rocha firme e incrível durante esses tempos difíceis. Ela assumiu como sua parte da carga de responsabilidades, intervindo para liderar e tomar decisões durante períodos em que eu simplesmente não conseguia fazer nenhuma dessas duas coisas. Ela também sofreu, e de maneiras que a maioria das pessoas sequer percebeu.
- Profissionais —
– Um conselheiro — Eu precisava de um espaço seguro, confiável, onde pudesse processar os pensamentos negativos e nocivos que tantas vezes sobrecarregavam a minha mente.
– Um psiquiatra — Como mencionei anteriormente, nem todo mundo que tem depressão ou ansiedade precisa de medicação — mas alguns de nós precisamos. Eu sei que preciso porque vi a diferença gigante que isso fez na minha vida. Eu só fui a um psiquiatra no meu primeiro colapso, mas queria ter ido antes. A medicação pode nos ajudar a combater os problemas do lado físico da batalha, enquanto continuamos a enfrentar os problemas nas frentes espiritual e mental.
- Minha igreja e a sua liderança — sou incrivelmente grato por fazer parte de uma igreja — e de um time de liderança — que responderam com graça e compaixão em tempos difíceis. Eles se sacrificaram por mim, e sou extremamente grato por isso. Eu sei que nem todo pastor tem esse tipo de apoio, mas assim como Deus me proporcionou tudo isso, ele pode fazer o mesmo por você, ainda que esse apoio pareça um pouco diferente do que eu tive.
- Um bando de irmãos — talvez esse seja o elemento que está faltando na vida de muitos. Eu tenho um cara especial na minha vida — o Matt — que já passou incontáveis horas ao meu lado, durante esses tempos difíceis. Eu também tenho alguns outros “bandos de irmãos”, amigos de longa data de diferentes fases da vida, assim como um grupo de pastores que tem se reunido regularmente há anos. Nós nos chamamos de “hermanos”. Ao longo dos anos, temos escolhido uns aos outros, apesar das nossas diferenças, enfrentando os momentos difíceis com vulnerabilidade e caminhando juntos no evangelho. Atravessamos todos os tipos de problemas ao longo do tempo. Um bando de irmãos não é algo que possa ser criado da noite para o dia, mas pode começar a ser formado quando você procura um amigo ou um pastor.
Você não precisa enfrentar essa batalha sozinho. Por isso, não sofra em silêncio. Com a força de Deus, seja corajoso. Compartilhe a verdade sobre o que você está passando e comece a construir uma comunidade. Nós servimos a um Deus amoroso e Todo-poderoso que é generoso em sua provisão. A provisão dele para você pode não ser parecida com a minha, mas o resultado será tão real quanto o meu. Afinal de contas, nós servimos o mesmo Rei fiel.
Próximos passos práticos
Se você tem enfrentado momentos difíceis, não precisa fazer isso sozinho. Aqui estão alguns passos que deve considerar ao buscar cura e apoio:
1. Procure um pastor amigo.
Às vezes, tudo o que precisamos é de um amigo de confiança para começar essa jornada de cura. Comece com alguém que você já conheça — um pastor local ou um líder de ministério.
2. Encontre um conselheiro ou um psiquiatra cristão.
Não fique desencorajado, se você levar muito tempo para encontrar alguém que dê certo. Continue procurando. Você vale o esforço.
Indicações — pergunte a pastores próximos, membros da sua igreja, ou para pessoas da sua denominação.
Opções online —- a Rede de Aconselhamento Global é um grupo de conselheiros licenciados que oferece aconselhamento cristão remoto para pastores nos EUA, por exemplo. Procure saber se no seu país existe uma rede como esta.
3. Procure participar de retiros espirituais voltados para pastores
Existem espaços que foram criados especificamente para ajudar pastores a descansar e a recarregar as baterias. Peça recomendações sobre isso ao seu conselheiro e a pessoas próximas.
Não importa por onde você comece, mas dê o primeiro passo. Você não precisa fazer tudo isso que mencionei — apenas faça alguma dessas coisas. Eu confio que o mesmo Deus que me sustentou será fiel para ir ao seu encontro e libertar você dessa dor.
Chip Sweney faz parte da equipe de liderança executiva da Igreja Perimeter, onde é pastor há quase três décadas. Ele também é o diretor-executivo de um projeto de iniciativa da igreja, a Greater Atlanta Transformation [Transformação da Grande Atlanta], que lidera ministérios da Igreja Perimeter voltados para toda a área metropolitana de Atlanta.