Theology

Os oligarcas da tecnologia querem Jesus fora do caminho

Editor in Chief

Quando a Palavra Viva fala, as ambições dos que querem ser “mestres do universo” são expostas.

Elon Musk putting on sunglasses
Christianity Today February 21, 2025
Illustration by Christianity Today / Source Images: Getty

Este artigo foi adaptado da newsletter de Russell Moore. Inscreva-se aqui.

Tem sido uma jornada longa e estranha desde George Washington até Elon Musk — e talvez devêssemos nos perguntar se isso tem alguma coisa a ver com Jesus Cristo.

Já há muitos anos, alguns de nós vêm alertando que esse nosso momento de plataformas tecnológicas nos levaria a um ponto de crise constitucional. A maioria de nós, no entanto, achou que isso aconteceria indiretamente — através da erosão do capital social e do aumento da polarização nas redes sociais.

Poucos previram que a crise aconteceria tão diretamente da forma como aconteceu: com Elon Musk, o homem mais rico do mundo, e um pequeno grupo de 20 e poucos empregados tendo um poder de veto unilateral sobre a apropriação de fundos [governamentais] e a aprovação de leis pelo Congresso dos Estados Unidos.

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Existem, é claro, pesadas implicações contitucionais, sociais, econômicas e de política externa para isso que tem acontecido; implicações que, sem dúvida, irão reverberar por décadas e, talvez, por séculos. Mas e se houverem também causas e consequências teológicas?

Nicholas Carr foi um dos primeiros a alertar Paul Reveres sobre os danos que a tecnologia digital causaria à capacidade de atenção humana. Em seu novo livro, Superbloom: How Technologies of Connection Tear Us Apart [Superflorescência: Como a tecnologia que nos conecta nos afasta ainda mais], ele escreve sobre algo que já nos diziam há muito tempo os maiores barões do Vale do Silício — tecno-utópicos e adeptos da filosofia “mova-se rápido e quebra coisas” [que vê o erro como consequência natural da inovação] —: que por trás de seus projetos não existe apenas uma forma de fazer dinheiro (embora façam isso muito bem), mas existe também uma visão particular sobre a natureza humana.

As declarações do fundador da Meta, Mark Zuckerberg, por exemplo, falam das redes sociais como um “gráfico” — o que é, segundo Carr, “um termo do mundo da arte emprestado da disciplina matemática da teoria das redes”.

“O manifesto de Zuckerberg é sustentado por uma concepção da sociedade como um sistema tecnológico com uma estrutura análoga à [estrutura] da internet”, escreve Carr. “Assim como a Internet é uma rede de redes, a sociedade, na mente tecnocrata, é uma comunidade de comunidades.”

Carr argumenta que Zuckerberg há muito tempo aderiu a “uma visão mecanicista de sociedade”, observando que “uma das curiosidades do início do século 21 é a maneira como uma quantidade tão grande de poder sobre as relações sociais veio parar nas mãos de jovens que estão mais interessados em números do que em pessoas”.

A visão mecanicista de sociedade é generalizada — quase unânime, embora se manifeste de diferentes formas — entre os arquitetos do complexo industrial voltado para mídias sociais, inteligência artificial e realidade virtual. Por exemplo, o CEO da OpenAI, Sam Altman, causou alvoroço pelo mundo afora há alguns dias, quando sugeriu que o tipo de inteligência artificial generativa que ele vê no futuro redundará em mudanças “necessárias ao contrato social, dado o poder que esperamos que essa tecnologia tenha”, e observou ainda que “toda a estrutura da sociedade em si estará sujeita a um certo grau de discussão e reconfiguração”.

Essa visão mecanicista não vale apenas para a sociedade em geral, mas para a pessoa humana. Durante anos, comediantes têm feito chacota dos “excêntricos” capitalistas de risco da tecnologia que, por exemplo, supostamente buscariam fazer transfusões de sangue de doadores mais jovens para manter a própria juventude e vitalidade. As pessoas dificilmente levariam a sério e rotulariam como marginais indivíduos como Ray Kurzweil, cientista da computação que fala em carregar sua consciência para uma nuvem computadorizada a fim de viver para sempre. Poucos têm prestado atenção suficiente nessas figuras para que possam ouvir os ecos arrepiantes de Gênesis 3 na resposta que Kurzweil deu, quando lhe perguntaram se Deus existe: “Ainda não”.

Nas últimas semanas, minha colega Kara Bettis Carvalho analisou as afirmações de Bryan Johnson, empreendedor da área de tecnologia, no documentário Don’t Die, da Netflix, no qual ele diz que poderia projetar seu corpo para escapar da mortalidade. Mais uma vez, poucos parecem ouvir aqui as reverberações de Gênesis 3: “Certamente não morrereis” (v. 4, ESV, na íntegra).

É muito fácil atribuir tudo isso a pessoas “excêntricas” que ocupam posições de ponta e possuem um suprimento infinito de dinheiro. No entanto, essa ideologia hoje não habita apenas esse ecossistema tecnológico — ao qual todos estamos interligados —, mas também é um fator determinante por trás de decisões sobre se crianças na África receberão os fundos alocados para salvá-las da fome ou da AIDS, e se o sistema constitucional de freios e contrapesos para controle do poder entre poderes iguais morrerá diante de nossos olhos.

E é isso que nos leva à questão sobre Deus.

Há vários anos, Elon Musk disse aos jornalistas da Axios, Mike Allen e Jim VandeHei, que os seres humanos “devem fundir-se com as máquinas para superar a ‘ameaça existencial’ da inteligência artificial”. Quando pressionado sobre o que isso significa para o nosso senso de realidade, Musk disse que devemos questionar se a própria realidade é real. “É muito provável que estejamos em uma simulação”, disse ele, tendo observado, em outra ocasião, que a probabilidade de não estarmos vivendo em um mundo simulado é de apenas uma em bilhões. A implicação disso é clara: talvez, do outro lado do véu do universo que nos cerca, haja um Elon Musk cósmico.

Ver a humanidade e o resto do mundo “real” através da metáfora da máquina tem consequências. Ver a humanidade e o resto do mundo através da metáfora dos dados é ainda mais perigoso. Uma vez que alguém interprete o universo através de uma grade mestra mecanicista — acreditando que o que conta é aquilo que é quantificável e mensurável —, o resultado final é um desrespeito pela santidade da natureza humana, que não pode ser compreendida dessa forma. E uma vez que todos os limites sejam vistos como arbitrários e “analógicos”, por que alguém se deteria diante dos limites das normas, tradições, leis e ordens constitucionais, ou seja, das coisas que compõem uma sociedade?

Em última análise, a “fria” ilusão da maestria e a “quente“ erupção do caos provam que não são coisas opostas, mas sim os dois lados do mesmo horror. A mentalidade que vê a humanidade e a sociedade como meros dados a serem manipulados naturalmente dá lugar à vontade de potência que não vê limites para o apetite e a libido. Elon Musk deu a um de seus filhos o nome “X Æ A-12” (antes de ter que remover os numerais arábicos por causa da lei da Califórnia), um “nome” que lembra um QR code ou um número de série, enquanto também gerava filhos com várias mulheres. Por que a fidelidade importaria, se o mundo se resume apenas a dados? Quais são as consequências, se o mundo é uma simulação que pode ser reiniciada?

“Deus” não é um problema nesta visão da realidade. Afinal, é possível transformar Deus em uma palavra abstrata e até mesmo algébrica. A sugestão de Albert Einstein de que “Deus não joga dados com o universo” implicava uma estrutura impessoal, uma lógica, e não o Deus vivo de Abraão, Isaque e Jacó. O “Deus” de Spinoza nunca convocará uma pessoa perante um tribunal de julgamento. As palavras “Deus” ou “religião” podem ser usadas como substitutas do próprio tipo de autodeificação que a ideologia dos tech-bros [dos caras da tecnologia] e todos os seus sucessores exigem.

Jesus, em contrapartida, não é fácil de se descartar. Uma vez que ele seja ouvido — não como um avatar teórico que dá autoridade a alguma ideologia, mas pelas próprias palavras que falou, pelo próprio evangelho que pregou —, as ambições de todo aquele que se propõe ser “mestre do universo” ficam expostas.

Em Os Irmãos Karamázov, “O Grande Inquisidor”, poema de Dostoiévski, diz que ele queria Jesus silenciado porque o Jesus da Bíblia não “entendia” a natureza humana: que o que as pessoas realmente querem é a satisfação dos apetites e os espetáculos para distração. Contra a diatribe do Inquisidor, porém, Jesus, assim como fez diante de Pilatos, simplesmente permanece ali, com um olhar que penetra todas as manipulações de uma visão mecanicista do universo.

A visão digital da humanidade não pode se encaixar na visão de James Madison e dos idealizadores da ordem constitucional americana. Revolucionários utópicos sempre ofereceram alguma versão do ditado “é preciso quebrar alguns ovos para se fazer uma omelete”, independentemente do preço que os ovos realmente cobrem no momento. Mas, por trás desse utopismo está sempre uma teologia — e a teologia pode cooptar quase tudo. O cristianismo pode ser cooptado por um utopismo digital, mas apenas se silenciar Jesus.

No entanto, Jesus não é facilmente silenciado. O universo não é uma simulação. Ele é criado e sustentado não por um algoritmo, mas sim por uma Palavra. E esta Palavra não é uma abstração a ser decodificada, mas sim uma pessoa, alguém que “se fez carne e habitou entre nós” (João 1.14).

Um milhão de diferentes Babéis jazem nas ruínas da história, e, por trás delas, um milhão de diferentes Ninrodes; e todos eles atacariam os limites da mortalidade e da responsabilização para criar simulações de si mesmos e de seus impérios. Todos eles se foram, e não podem ser reiniciados.

Os tech-bros herdaram a terra, por enquanto. A culpa não é deles. É nossa. Acreditamos no que eles disseram sobre nós mesmos: que somos, em última análise, apenas dados e algoritmos a serem decodificados, apetites a serem saciados. E, por causa disso, para manter nossa simulação em funcionamento, temos procurado programadores e codificadores  — algo que as gerações anteriores teriam chamado de “deuses”.

Em seu sermão inaugural em Nazaré, Jesus leu o rolo de Isaías, o profeta, que falava das “boas-novas aos pobres” que vêm com “o ano do favor do Senhor” (Isaías 61.1-2; Lucas 4.18-19). Esse mesmo livro profético nos ensinou a orar: “Ó Senhor, ó nosso Deus, outros senhores além de ti nos têm dominado, mas só o teu nome honramos.” (Isaías 26.13).

Depois que todas as promessas dos tech-bros se forem, Jesus permanece.

Russell Moore é o editor-chefe da Christianity Today e lidera o Projeto de Teologia Pública da CT.

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