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O que é (e o que não é) perseguição de cristãos

Nove verdades que os crentes precisam entender para saber orar pelos que sofrem no corpo de Cristo.

Jesus' hand and his feet with holes from the nails
Christianity Today November 12, 2024
Illustration by Mallory Rentsch Tlapek / Source Images: WikiMedia Commons / Getty

Recentemente, conversei com um líder de igreja nigeriano que me mostrou um vídeo assustador, o qual não consigo tirar da cabeça. Militantes do Boko Haram — grupo terrorista que há anos ataca brutalmente igrejas na Nigéria — filmaram a si mesmos subjugando um pequeno grupo de cristãos e dizendo a quem quisesse ouvir que pretendiam matar todos os cristãos, se eles não se submetessem ao islamismo. Então, decapitaram nossos irmãos e irmãs em Cristo.

Um horror como esse foi o que me levou a orar e a trabalhar por anos em favor daqueles que sofrem por sua fé. Como parte do meu ministério com a Radical, tive a oportunidade de falar com cristãos que enfrentaram violência, pressão social ou até mesmo prisão por anunciar o evangelho, plantar igrejas ou simplesmente por se manterem firmes em sua fé.

Ao mesmo tempo, reconheço que, para muitos cristãos, esses casos de perseguição podem parecer distantes, abstratos, incompreensíveis ou avassaladores. Muitos cristãos perseguidos vivem em países que nunca visitamos e em lugares cujo nome mal conseguimos pronunciar. Também vivemos em um ciclo de notícias constante, 24 horas por dia, que nos inunda com histórias de guerra e terror, o que nos insensibiliza para o custo que nossa família da igreja global paga por seguir Jesus.

Mas, pelos próximos dois domingos de novembro, designados pela Aliança Evangélica Mundial como Dia Internacional de Oração pela Igreja Perseguida — e também para além deles — quero convidá-lo a se juntar a outros crentes ao redor do mundo para interceder por aqueles que professam a Cristo e sofrem por isso. Também quero dissipar alguns mitos sobre perseguição e ajudá-lo a entender o que ela realmente significa e como acontece no mundo. À luz da ordem de Deus para que nos lembremos daqueles que são perseguidos como se estivéssemos fisicamente com eles (veja Hebreus 13.3) e oremos por eles, espero que aprender mais sobre perseguição nos ajude a ser o corpo global de Cristo que ele nos chamou a ser.

Perseguição é assédio ou oposição por seguir a Jesus. No Sermão do Monte, o termo que Jesus usa para “perseguido” significa “perseguido com hostilidade”. E ele continua descrevendo como o termo pode significar tudo, desde pessoas ridicularizando, envergonhando, excluindo ou mentindo sobre você até restringindo a sua liberdade, aprisionando você e acabando com a sua vida (veja Mateus 5.10-12;10.16-33; Lucas 6.22-23). É digno de nota que a perseguição se dá quando essas formas de resistência acontecem especificamente porque alguém está seguindo a Jesus. Em Mateus 5, Jesus diz que devemos esperar essa hostilidade, a qual ocorre “por causa da justiça” e “por minha causa”.

Perseguição não pode ser definida como qualquer coisa difícil que acontece a um cristão. Os seguidores de Jesus enfrentam todos os tipos de tribulações neste mundo, justamente como o próprio Jesus prometeu que enfrentariam (João 16.33). Muitas vezes, esse sofrimento é comum à experiência de pessoas que não são cristãs também. Crentes e descrentes recebem diagnósticos de câncer. Crentes e descrentes sofrem por causa de conflitos ou de guerras. Crentes e descrentes passam por sofrimento emocional e tensão em relacionamentos.

Mas dificuldade não é o mesmo que perseguição. Só porque você é cristão e está sentindo na pele os efeitos de um mundo caído não significa que está sendo assediado ou que está sofrendo oposição por causa da justiça.

A perseguição acontece para igrejas que se reúnem em segredo e para igrejas que se reúnem às claras. Muitos de nós imaginamos nossos irmãos perseguidos se reunindo em igrejas secretas nas casas. Anos atrás, a Radical iniciou um evento chamado Igreja Secreta. Essa iniciativa foi baseada em momentos que vivi com crentes asiáticos, em que fui levado às escondidas para lugares em que todos os outros presentes na sala seriam presos, caso fossem pegos reunidos ali.

Mas o que muitos cristãos não percebem é que a perseguição também acontece em países onde nossos irmãos e irmãs se reúnem abertamente em prédios (até mesmo grandes) de igrejas, onde são liderados por pastores formados em seminários. Acabei de me encontrar, na África Ocidental, com um pastor cujo complexo em que fica a sua igreja recebia regularmente mais de 500 fiéis; certo dia, porém, eles foram repentinamente atacados por militantes que começaram a queimar prédios, carros e pessoas. Só porque os cristãos se reúnem em público não significa que não corram perigo.

A realidade da perseguição pode variar dentro de um mesmo país. Veja a Índia e a Indonésia, por exemplo. Os cristãos podem se reunir tranquilamente nas manhãs de domingo, no estado de Kerala, que fica no sul da Índia. Enquanto isso, no ano passado, multidões queimaram mais de 200 igrejas no estado de Manipur, que fica no leste do país. Algumas centenas de quilômetros a sudeste, na Indonésia, os cristãos podem estar protegidos em uma ilha e sofrer oposição em outra. Assim como acontece no país em que você vive, a segurança pode variar de região para região.

A perseguição pode vir de cima para baixo, de baixo para cima ou de ambas as direções. Alguns governos ao redor do mundo proíbem seus cidadãos de seguirem a Jesus e se reunirem como igreja. Mas a perseguição nem sempre é iniciada por autoridades governamentais. Quando meu amigo Zamir se tornou cristão, seus próprios irmãos o espancaram quase até a morte, e seu pai o expulsou de casa. Outros amigos meus, a quem chamarei de Samil e Aanya, foram rejeitados por sua família por seguirem Jesus. Quando o casal voltou, anos depois, para tentar compartilhar o evangelho com seus pais, o pai de Aanya a envenenou e ela morreu. Em alguns países, forças políticas, familiares e amigos trabalham em conjunto para perseguir os cristãos. Por exemplo, o regime norte-coreano proíbe o cristianismo, e as autoridades dependem que familiares, amigos ou vizinhos lhe delatem atividades cristãs.

A perseguição pode significar morte — ou discriminação. Como já compartilhei, as histórias de perseguição na Nigéria são horrendas. Há várias décadas, militantes têm sequestrado, estuprado e matado muitos de nossos irmãos e irmãs em Cristo. Ao mesmo tempo, a perseguição à igreja nem sempre é tão severa. Com base em conversas que tive com irmãos e irmãs ao redor do mundo, um empreendedor cristão em um país do Oriente Médio pode perder o direito de ter um negócio — ou pode perder a clientela que o sustenta. Um novo seguidor de Jesus que vive no alto do Himalaia pode perder o direito à água ou à eletricidade em sua aldeia. Uma igreja em uma cidade do Sudeste Asiático pode ser forçada a pagar taxas extras (e às vezes exorbitantes) para alugar ou possuir um prédio.

Na Europa e nas Américas, os crentes geralmente introduzem qualquer menção à perseguição em suas vidas dizendo: “Não é tão ruim quanto o que nossos irmãos e irmãs ao redor do mundo estão enfrentando”, e isso é uma verdade inquestionável. Mas não significa que ainda não seja perseguição quando um cristão britânico é preso por orar silenciosamente do lado de fora de uma clínica de aborto ou quando um cristão americano é demitido de seu emprego por expressar suas opiniões sobre a sexualidade bíblica.

A perseguição vem em seguida da identificação e da proclamação. Desde o começo da igreja, no livro de Atos, a perseguição tem ocorrido sempre que as pessoas professam ou propagam a fé em Jesus. A palavra grega para “testemunha”, em Atos 1.8, é martus, de onde vem a palavra mártir. Na Somália, enquanto minha amiga Halima continuar reservada e calada sobre sua fé, ela poderá evitar a perseguição. Mas assim que disser que se afastou do islamismo para seguir a Jesus, ela provavelmente será morta. Na Índia, dependendo do estado, compartilhar o evangelho com outra pessoa pode levar alguém à prisão, enquanto levar alguém a Jesus e batizar essa pessoa pode significar dez anos de prisão.

O propósito da perseguição é silenciar o testemunho. Quando começou a perseguição contra a igreja, em Atos 4, os líderes judeus ordenaram aos cristãos que “não falassem nem ensinassem em nome de Jesus”. Pedro e João responderam dizendo: “não podemos deixar de falar do que vimos e ouvimos” (v. 18-20). Depois de se reunirem para orar, os primeiros cristãos ficaram “todos cheios do Espírito Santo e anunciavam corajosamente a palavra de Deus” (v. 31).

É importante lembrar disso, quando cristãos de partes do mundo em que há liberdade costumam dizer coisas como: “eu dou testemunho sendo uma boa pessoa ou praticando boas obras”. Isso pode até soar bem aos nossos ouvidos, mas não é o que a Bíblia quer dizer com testemunho. Em muitas partes do mundo, nossos irmãos e irmãs em Cristo estão razoavelmente seguros, se não forem mais do que boas pessoas que praticam boas obras. Mas quando falam do que viram e ouviram, eles sofrem perseguição.

A perseguição é algo garantido não apenas para outros cristãos, mas também para nós. À luz de tudo o que foi dito aqui, é uma questão de obediência a Deus orar especificamente por nossos irmãos e irmãs que vivem em partes do mundo onde a perseguição é mais feroz (Hebreus 13.3). Não há como exagerarmos a importância disso: temos uma responsabilidade bíblica e familiar de orar e de trabalhar por nossos irmãos e irmãs em Cristo, particularmente em países como Coreia do Norte, Somália, Líbia, Eritreia, Iêmen, Nigéria, Paquistão, Sudão, Irã e Afeganistão. Ao mesmo tempo, Deus também deixa claro em sua Palavra que “todos os que desejam viver piedosamente em Cristo Jesus serão perseguidos” (2Timóteo 3.12). Observe as palavras “todos” e “serão”. A perseguição não é um “talvez” nem é para “alguns” cristãos.

Se você não está sofrendo perseguição em algum grau, precisa se perguntar: “Estou professando e propagando a fé em Jesus?” Em outras palavras, você está se identificando de forma clara e inequívoca com Jesus; está proclamando Jesus com humildade e ousadia; está contando às pessoas sobre a vida, a morte e a ressurreição de Jesus, e chamando outros a se arrependerem e a crerem no nosso Salvador, porque a vida deles, hoje e por toda a eternidade, no céu ou no inferno, depende da resposta que derem a ele?

Se não estamos professando fé em Jesus dessa forma, então, enquanto oramos pela igreja perseguida, precisamos perceber que, na verdade, nossas vidas se simpatizam com os perseguidores. Isso pode soar como algo exagerado, ofensivo, mas considere isto: se o propósito da perseguição é silenciar o testemunho, e se você ou eu estamos silenciando nosso próprio testemunho, então, estamos refletindo a imagem dos perseguidores, e não a dos perseguidos.

Mas se nos identificamos corajosamente com Jesus e damos testemunho dele, então, enquanto oramos, estamos nos identificando com a igreja perseguida. E de acordo com 2Timóteo 3, podemos ter certeza de que a perseguição virá para nós. Quanto mais dedicarmos nossas vidas a seguir a Jesus e a torná-lo conhecido no lugar em que vivemos e em todas as nações, e particularmente nos lugares onde o evangelho ainda não foi pregado, mais enfrentaremos perseguição. Vamos interceder por nossos irmãos e irmãs em Cristo que são perseguidos ao redor do mundo, para que sejam fiéis até o fim, conscientes de que todo cristão precisa de intercessores semelhantes para fazer o mesmo.

David Platt atua como pastor principal da McLean Bible Church e é autor de livros como Radical e Don’t Hold Back [Não se contenha]. Também é o fundador da Radical, uma organização que ajuda as pessoas a seguirem a Jesus e a torná-lo conhecido nos lugares em que vivem e em todas as nações.

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