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Relatório de Lausanne: A maioria dos missionários está alcançando povos já alcançados

O Relatório de Status da Grande Comissão examina desafios e oportunidades em um cenário missionário em transformação.

Christianity Today September 26, 2024
Courtesy of The Lausanne Movement / Photography by Grace Snavely

Nos dias de hoje, mais de 40% do mundo ainda não foi evangelizado. No entanto, do total global de 450 mil missionários cristãos que temos hoje, cerca de 97% são enviados para povos que já têm acesso ao evangelho.

Outro fato surpreendente: em 1900, mais de 80% dos cristãos do mundo viviam na Europa ou na América do Norte, mas hoje, apenas cerca de 25% vivem nessas regiões. O restante reside no Sul Global, que inclui África, Ásia, América Latina e Oceania.

A mudança geográfica no cristianismo também significa uma mudança nos países de origem dos missionários. Os Estados Unidos ainda enviam o maior número de missionários, mas os próximos quatro países [na lista dos que mais enviam] são Brasil, Coreia do Sul, Filipinas e Nigéria.

Estas são algumas das descobertas do Relatório de Status da Grande Comissão, divulgado pelo Movimento de Lausanne no início deste ano, antes do Quarto Congresso de Lausanne em Incheon, Coreia do Sul. O relatório se baseia em pesquisas de organizações internacionais cristãs e sem fins lucrativos, e apresenta insights de 150 especialistas em missões globais.

“A Grande Comissão não é um fim em si mesma; é um meio para um fim”, escreveram Victor Nakah e Ivor Poobalan em um dos ensaios do relatório. “O futuro é a presença de todas as tribos, línguas, nações e idiomas adorando o Rei no fim dos tempos.”

O sucesso e a tarefa inacabada das missões globais

Devido ao trabalho de missionários e movimentos de cristãos locais, o evangelho já alcançou cerca de 4,57 bilhões de pessoas, enquanto 3,34 bilhões ainda não ouviram o evangelho, de acordo com dados do Projeto Josué.

No entanto, a maioria dos missionários hoje não está indo para países com grupos de povos não alcançados. “A maioria dos missionários vai para contextos predominantemente cristãos ou pós-cristãos, o que leva a uma falta de conexão e de compreensão dos adeptos de outras religiões”, observou o relatório. Mais missionários vão para a Europa do que para a Ásia, embora 60% do mundo viva na Ásia e o envio de missionários para a Europa custe dez vezes mais.

O principal país que envia — e o principal que recebe — missionários são os Estados Unidos, com 135.000 missionários enviados para outros países e 38.000 vindos do exterior, de acordo com os números de 2020 do World Christian Database. A população cristã dos EUA ainda é a maior do mundo, já que cerca de um décimo de todos os cristãos são americanos. O Brasil vem em seguida, com quase 8% dos cristãos do mundo, devido em grande parte à rápida disseminação do pentecostalismo. O Brasil também envia o segundo maior número de missionários, um total de 40.000.

A Coreia do Sul, com 35.000 missionários, caiu do segundo para o terceiro lugar entre 2015 e 2020. O envelhecimento de sua força missionária e a diminuição do envolvimento dos cristãos mais jovens contribuíram para esse platô. Os ​​25.000 missionários enviados das Filipinas são, em sua maioria, católicos, e esse número não inclui os filipinos que trabalham no exterior e que atuam como missionários bivocacionados.

Na Nigéria, algumas igrejas estão deixando de lado as agências missionárias e enviando diretamente seus missionários para os não alcançados. Um ensaio do relatório de Lausanne citou um livro de Yaw Perbi e Sam Ngugi: “A história do movimento cristão mundial é a história da colaboração entre igrejas locais e agências missionárias [que] Deus usou… para promover o avanço do evangelho desde o primeiro século até hoje.”

Crescimento do cristianismo na África

No século passado, a África Subsaariana viu o cristianismo crescer mais rápido do que em qualquer outro lugar do mundo. Essa região e a América Latina são as áreas onde o pentecostalismo cresceu com mais pujança. Em 1970, a África Subsaariana tinha cerca de 20 milhões de pentecostais; hoje, esse número disparou para 230 milhões, de acordo com a World Christian Encyclopedia.

O Pew Research Center fez projeções de que, até 2060, mais de quatro em cada dez cristãos chamarão a África Subsaariana de lar. Grande parte dessa mudança é atribuída à demografia, uma vez que a região tem a população mais jovem do mundo. Atualmente, em média, a idade dos cristãos de lá é de 19 anos, em comparação com 39 anos, na América do Norte, e 42, na Europa.

A África Subsaariana também é mais religiosa. Na Nigéria, cerca de 90% dos adultos frequentam cultos religiosos semanalmente, em comparação com menos de 40% nos EUA. Embora, no mundo inteiro, pessoas de 18 a 39 anos frequentem os cultos semanais das igrejas com menos frequência do que pessoas com mais de 40 anos, a lacuna é menor na África Subsaariana, de acordo com o Pew.

“Toda pessoa que pensar em missões não deve apenas considerar como a África participa, mas os próprios africanos devem estar prontos a entrar na linha de frente da força missionária”, escreveram Ana Lucia Bedicks, Menchit Wong e Maggie Gathuku em um ensaio do relatório de Lausanne.

Os não alcançados na Índia e no Paquistão

Enquanto isso, a maioria dos grupos de povos não alcançados do mundo, definidos como grupos que não têm “uma igreja autóctone local capaz de evangelizar seu próprio povo”, reside no sul da Ásia, especificamente na Índia de maioria hindu e no Paquistão de maioria muçulmana. Aproximadamente 3.000 grupos de povos não alcançados — ou cerca de três quintos do total mundial — estão nesses dois países.

Atualmente, mais de 60% dos 30.000 missionários indianos trabalham no próprio país, de acordo com a Operation World. Os cristãos na Índia estão enfrentando maior perseguição, pois um governo nacionalista hindu está no poder e a ideologia Hindutva se torna arraigada na sociedade.

A classe média, em expansão na Índia, oferece barreiras e oportunidades para o evangelho florescer, segundo um ensaio de Carl Ebenezer, Ted Esler e James Patole. “As estruturas religiosas da Índia e suas estruturas sociais profundamente baseadas em castas combinadas com este contexto secular e pluralista representam um enorme desafio para a apresentação da singularidade de Jesus Cristo”, escreveram eles.

No entanto, ao mesmo tempo, os autores notaram que muitos integrantes da classe média da Índia “não estão necessariamente convencidos dos ensinamentos de sua religião nem os praticam. Muitos estariam abertos a ouvir e a mudar sua visão, se fossem convidados a fazê-lo de uma forma que falasse a suas experiências e necessidades”.

Entre os países de maioria muçulmana, o Paquistão tem a legislação contra blasfêmia mais rigorosa, que pode levar à prisão e até à morte. Os cristãos que vivem nos centros urbanos também são forçados a trabalhar em empregos mal pagos na área de saneamento.

O relatório observou que o Sul da Ásia “provavelmente permanecerá como a região menos evangelizada por muitas décadas”.

Missões policêntricas

À medida que os centros do cristianismo se afastam do Ocidente e se voltam para o Sul Global, a atividade missionária agora é policêntrica, termo que significa “de todas as nações para todas as nações”, de acordo com Patrick Fung, embaixador global da OMF International.

Um ensaio intitulado “Polycentric Global Missions” [Missões Globais Policêntricas] argumentou que “a missão tem sido policêntrica desde o início”. Embora a igreja primitiva tenha começado a evangelizar em Jerusalém, a perseguição a forçou a se espalhar pelo mundo romano e a pregar para os judeus da diáspora. Então, os cristãos foram para Antioquia para pregar aos gentios; de lá, Paulo começou suas viagens missionárias e plantou igrejas, e essas igrejas continuaram a levar o evangelho ainda mais longe.

O relatório observou que, com exceção da Europa, todas as regiões do mundo “enviam e recebem mais missionários do que há 50 anos”. Mais missionários estão vindo de países onde os cristãos são minoria, o que muitas vezes os ajuda a se relacionarem com as pessoas que estão tentando alcançar.

No entanto, um desafio é que a riqueza cristã está concentrada na América do Norte, o que demanda discussões sobre como as igrejas policêntricas podem encorajar a generosidade, criar “canais saudáveis” entre os cristãos mais e menos ricos, e identificar novas fontes de financiamento.

“Se toda cultura recebeu a Grande Comissão, então, toda cultura tem o privilégio de apoiar a Grande Comissão”, disse Scott Morton, dos Navigators, que é citado em outro ensaio.

Missões da diáspora

Uma maneira pela qual o evangelho está se difundindo é por meio do deslocamento de pessoas que deixam seus países de origem por causa de fatores como fome, guerra, perseguição, melhores oportunidades de emprego ou para proteger sua família. Em 2020, havia 281 milhões de migrantes internacionais no mundo, um aumento de 60 milhões em relação à década anterior, de acordo com o Relatório Mundial de Migração. Quase a metade desses migrantes são cristãos.

Esse padrão se encaixa nas missões policêntricas, pois os migrantes cristãos estão se mudando para novos locais onde possam testemunhar e plantar sementes. Ao mesmo tempo, os cristãos nos países de destino podem evangelizar migrantes recém-chegados, que geralmente estão mais propensos a aceitar uma nova fé, por estarem longe das tradições e religiões de sua terra natal.

“Deus é soberano sobre a história humana e a dispersão humana”, escreveu Sam George no ensaio “People on the Move” [Pessoas em deslocamento]. Segundo ele afirmou, uma decorrência disso é que “o cristianismo no Ocidente não está em declínio, mas os imigrantes da Ásia, África e América Latina estão revivendo-o e transformando-o com um ímpeto missionário renovado”.

Por exemplo, a restrição de liberdades em Hong Kong levou a um boom de igrejas chinesas na Grã-Bretanha, à medida que cidadãos da antiga colônia britânica encontram refúgio no Reino Unido. Na Bélgica, os cristãos africanos estão cada vez mais dando aulas nos cursos de educação religiosa. Nos EUA, as igrejas butanesas-nepalesas estão crescendo, pois se reúnem em prédios de igrejas cuja congregação local está morrendo.

“O cristianismo é uma fé missionária por excelência, pois é uma fé que nasceu para peregrinar”, ​​observou George.

A igreja se opondo à injustiça

Em termos globais, o número de pessoas que vivem na extrema pobreza caiu de dois bilhões em 1990 para um bilhão em 2019, de acordo com o Banco Mundial. O relatório de Lausanne conectou essa tendência com a importância da missão integral, que aborda não apenas as necessidades espirituais de uma pessoa, mas também questões de ordem física, social e econômica.

Os direitos humanos estão hoje mais protegidos do que nos séculos anteriores. No entanto, as restrições governamentais à religião aumentaram globalmente. O Norte da África, o Oriente Médio e a Ásia têm visto a maior porcentagem de uso da força por parte de governos contra grupos religiosos, de acordo com o Pew.

Hoje, estima-se que 40 milhões de pessoas sejam vítimas de alguma forma de escravidão moderna, entre as quais estão o trabalho forçado, a exploração sexual e o casamento forçado. A quantidade de mulheres e meninas afetadas é desproporcional, representando 70% das vítimas de exploração e 99% das vítimas da indústria do sexo.

“Embora a igreja se pronuncie em certos setores a favor dos oprimidos, em muitos desses casos ela se limita a declarações da liderança que não se convertem em ações”, escreveram Christie Samuel, Jocabed Solano e Jenny Yang, em um ensaio do relatório de Lausanne. Eles pediram que a igreja “assumisse seu papel profético, trabalhando mais prontamente na denúncia da injustiça, na libertação dos oprimidos e se levantando contra a liberdade irrestrita dos opressores”.

A inteligência artificial traz perigos e possibilidades

Outra mudança sísmica que a comunidade missionária precisa levar em conta é como a Internet está mudando todas as facetas da vida humana. O relatório declarou que “o aumento da mídia digital é potencialmente tão transformador para o engajamento com as Escrituras quanto o advento da imprensa no início da Europa Moderna”.

Com cerca de 60% do mundo conectado à Internet, há novas oportunidades para aplicativos da Bíblia que permitem que as pessoas leiam e ouçam com facilidade a Palavra de Deus em seu próprio idioma. Os aplicativos da Bíblia também fornecem uma nova maneira para as pessoas acessarem as Escrituras, especialmente em países onde a segurança é uma preocupação. Softwares de tradução, ferramentas de colaboração online e crowdsourcing [financiamento coletivo] também agilizaram o processo de tradução da Bíblia.

Ao mesmo tempo, os avanços tecnológicos apresentam desafios para a igreja, particularmente em torno da inteligência artificial (IA) e do que significa ser humano.

“A proclamação do evangelho não é simplesmente uma transferência de informações, mas sim uma transformação da pessoa por inteiro, pelo poder do Espírito Santo”, escreveram os autores do ensaio do relatório sobre IA. Eles acrescentaram que “muitos estão buscando tirar proveito do imenso poder das ferramentas de IA em prol do avanço da mensagem do evangelho para todos os povos, tribos e nações”.

Os autores reconheceram que Deus usa tais ferramentas para ajudar a igreja, mas alertaram que seu uso deve ser “guiado pela natureza singular da humanidade e pelo reconhecimento de que as máquinas são fundamentalmente diferentes dos seres humanos”.

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