As cerimônias de abertura das Olimpíadas são celebrações deslumbrantes de glórias nacionais e de união global. Mas, se além da abertura você assistir os jogos em si, notará um padrão incomum: verá que os atletas estão sempre falando sobre Deus.
Se você assistiu às eliminatórias olímpicas do mês passado, notará a mesma coisa. Atletas de todos os tipos continuamente deram crédito a Deus, muitas vezes em termos abertamente cristãos. Era quase como uma competição dentro da competição, para ver quem conseguia superar os demais em redirecionar os louvores para o céu.
Para mim, Sydney McLaughlin-Levrone, a estrela do atletismo dos EUA, venceu essa competição. Depois de quebrar o recorde mundial (de novo) nos 400 metros com barreiras femininos, ela respondeu à pergunta de um repórter desta forma: “Sendo bem sincera, louvado seja Deus. Eu não esperava por isso, mas ele pode fazer qualquer coisa. Tudo é possível em Cristo. Estou simplesmente espantada, perplexa e em choque.” O repórter deu um riso nervoso e passou para o próximo atleta das eliminatórias.
Não é novidade ver atletas agradecerem ao Senhor por seu sucesso. Mas assistir a essas demonstrações públicas de piedade me fez pensar: por que isso ainda é normal? A cerimônia do Oscar não pode ser confundida com um espaço para a igreja. Assim como também [não podem] os grandes encontros de escritores, jornalistas, músicos, investidores ou políticos. Os eventos esportivos parecem ser o último refúgio “aceitável” para a fé pública em nossa cultura secular.
Afinal, quase ninguém critica McLaughlin-Levrone e outros atletas que se professam publicamente cristãos por seus elogios. Isso é permitido. Os repórteres podem achar peculiar ou até mesmo bizarro, mas os atletas geralmente não são punidos por sua religiosidade. E, mesmo se fossem, fica claro que eles não se importariam. Em uma época em que a fé é menosprezada, ignorada ou relegada à vida privada, os atletas são assumidamente fiéis em público. Mas por quê?
Acho que o lugar por onde devemos começar é a natureza do esporte em si. A disciplina dos atletas é algo rigorosamente controlado, pois, quando o apito soa, nada está sob controle. É puro caos, contingência e acaso ao longo de todo o percurso da prova. Os céus se enchem de nuvens de chuva; a quadra fica escorregadia com o suor; a pista, porosa; a estratégia dos oponentes é imprevisível.
A variável mais importante é o corpo. Os atletas de ponta tratam seu corpo quase como uma entidade separada — dipensam-lhe cuidados, tratamentos, alimentação, descanso, confiança, e fazem dele alvo até mesmo de culpa. Um atleta que comete algum deslize, tropeça ou sofre uma lesão diz: Meu corpo falhou comigo. Sabemos o que isso significa. Quem pode prever, com absoluta certeza, quando um ligamento irá romper ou quando terá uma cãibra muscular?
No Jogo 1 das Finais da NBA de 2014, LeBron James — na época, o melhor jogador de basquete do planeta — teve que sair prematuramente devido a cãibras. Por quê? O estádio estava um pouco mais quente do que o normal. Ele era conhecido por pedir ar condicionado gelado onde quer que jogasse, tanto que os fãs especularam que o time adversário, meu amado San Antonio Spurs, manteve o local aquecido para ter uma vantagem competitiva. Seja verdade ou não, os Spurs venceram o jogo e a série, e tudo porque o jogador mais importante da liga não conseguiu evitar que seus músculos tivessem espasmos.
É com razão, portanto, que os atletas se voltam para Deus. Ninguém além de Deus é soberano. Não posso controlar o clima, mas ele pode. Não posso impedir que meu corpo falhe, mas ele pode. Até o vento e as ondas lhe obedecem (Mateus 8.27). Bolas de futebol e de softball não deveriam lhe obedecer também?
É por isso que os atletas, assim como os fãs, podem ser tão supersticiosos. Eles podem ou não acreditar em Deus, mas usam as mesmas meias em todos os jogos, esfregam estatuetas para dar sorte, comem a mesma refeição no mesmo horário do dia: é como uma mágica esportiva. Os “deuses do esporte” são bastante exigentes e podem ser apaziguados por meio de rituais complexos ou ficar irritados pela menor das transgressões. Invoca-se o “carma” para apóstatas, traidores e trapaceiros. Até mesmo um cético como Michael Jordan, depois de espiar os companheiros de equipe, se curvará à meditação Zen, desde que o técnico Phil Jackson prometa que isso os ajudará a vencer.
Para os atletas, Deus não está apenas no comando do momento. É ele quem governa a história. Isso é verdade para todos nós, em todos os momentos, mas os atletas de elite são visceralmente lembrados disso com uma frequência que poucos de nós experimentam.
Não deveria ser nenhuma surpresa, portanto, que um atleta vitorioso mencione nada mais do que Deus respondendo a uma oração. Ele contará ao mundo uma história — uma saga divinamente dirigida pelo dramaturgo celestial. E dirá: Eu nasci para isso; fui criado para fazer isso; esse resultado foi ordenado desde o início. Claro, ele pode estar influenciado pela emoção do momento. Lá no fundo, porém, ele está expressando sua fé na providência divina. É mais uma maneira de ser claro sobre o controle. Nenhum de nós tem controle, pois somente Deus o tem, e quanto mais cedo se reconhece isso, mais cedo é possível ter paz, quando se perde, e alegria genuína, quando se ganha.
Por fim, as competições atléticas são sobre nada mais do que glória. Homero disse justamente isso, há quase 3.000 anos: “Que maior glória acompanha um homem, enquanto vive, / do que a que ele conquista com pés que correm e mãos que lutam?” A glória brilha sobre o último homem que se mantém de pé, sobre a primeira mulher a cruzar a linha de chegada, sobre o time com a pontuação mais alta quando o jogo acaba. Os vencedores são celebrados com status, fama, dinheiro e aplausos. No entanto, o que os próprios vencedores parecem sentir? Alguns deles se pavoneiam e contam vantagem, mas muitos caem de joelhos e choram como crianças. Pergunte a eles o que sentem e lhe dirão: gratidão.
Visto de uma perspectiva secular, não faz sentido: mas você é grato a si mesmo? Você é quem acabou de fazer isso!
O que os atletas intuem, porém, é que, de alguma forma, essa conquista é verdadeiramente deles e é uma dádiva. Assim, eles agradecem a seus companheiros de equipe, a sua família e aos pais — especialmente à mãe — porém, mais do que a qualquer um deste mundo que tenha lhes dado algo, eles agradecem ao “Pai das luzes”, pois sabem que “toda boa dádiva e todo dom perfeito vêm do alto” (Tiago 1.17, RSV). Os atletas se esforçam além dos limites de sua capacidade e, no êxtase do triunfo, não podem deixar de declarar a verdade: Eu não pertenço a mim mesmo, mas pertenço — de corpo e alma, na vida e na morte — ao meu fiel Criador, o Senhor soberano.
Os esportes, assim como outras formas de arte, são canais potenciais de transcendência. É por isso que assistimos e admiramos os atletas. É por isso que os atletas às vezes não conseguem dizer por que fizeram determinada escolha em campo ou o que estavam pensando naquele momento. Eles mergulham tanto no fluxo, tão esquecidos de si mesmos, tão presentes para os companheiros de equipe e para as circunstâncias, que se perdem. A beleza que resulta disso, para eles e para nós, é maravilhosa. Nossa respiração fica presa na garganta. David Foster Wallace disse que assistir a uma partida de Roger Federer é “uma experiência religiosa”. Em certo sentido, ele não estava errado.
Isso deve ajudar a explicar a aquiescência ocasional de fãs e jornalistas seculares ao entusiasmo religioso inabalável dos atletas. Para muitos, acompanhar esportes é o mais próximo que eles chegam de uma liturgia. A observância — termo em si já religioso — é uma espécie de testemunho, e uma experiência que está longe de ser passiva: os fãs participam de forma vicária, indiretamente, por meio de gritos, vaias, palmas, pulos e cânticos. Os atletas, por sua vez, extraem energia, força e encorajamento desse relacionamento único.
Dito isso, há outras razões menos agradáveis pelas quais a fé dos atletas é tolerada entre a imprensa e o público não religioso. Uma opinião mais cínica seria que muitos jornalistas veem isso como o preço a pagar para cobrirem esportes. Eles devem fingir que ouvem o devoto falando sobre Jesus, antes de perguntar, pela enésima vez: “Então, o que estava passando pela sua cabeça, quando você deu aquele tiro?”
Essa não é a interpretação mais condenável, no entanto.
Às vezes, quando olhamos mais de perto, vemos em ação o que parece ser uma dinâmica hedionda. Em muitos esportes americanos populares, uma mídia cada vez mais privilegiada, irreligiosa e ainda majoritariamente branca escreve sobre uma liga majoritariamente religiosa, majoritariamente não branca, na qual relativamente poucos vêm de uma situação privilegiada. O resultado é um abismo entre jornalistas e atletas — seja ele marcado por classe, educação, raça ou por todas as opções anteriores. Nesse aspecto, os liberais estão certos e os conservadores estão errados: não se pode tirar a política dos esportes. E, ironicamente, isso nunca fica mais evidente do que quando se coloca Deus na conversa.
Para citar um exemplo memorável, alguns anos atrás, o jornalista esportivo Dave Zirin criticou o quarterback Russell Wilson por atribuir uma vitória a Deus, acusando que “jogadores de futebol americano falam de Deus como se Ele… fosse o Grande Treinador no Céu, anotando um roteiro de resultados como Vince McMahon, com um moletom largo e um fone de ouvido”. Se existe mesmo um Deus, Zirin acrescentou, “essa força todo-poderosa não se importa muito com futebol”. A gente se pergunta como ele sabe disso.
A cobertura foi igualmente desdenhosa quando o linebacker do Ravens, Ray Lewis, entrou para o Hall da Fama. O periódico Deadspin ficou perplexo com a convicção desse atleta de que Deus falou com ele e cuidou dele em meio à tragédia, e o SB Nation deu o seguinte subtítulo a uma seção que fala sobre a paráfrase que Lewis fez de Isaías 54.17 (“Nenhuma arma forjada contra mim prosperará”): “Armas, Deus, e coisas desse tipo”.
Criticar é um jogo justo, e os jornalistas não devem reprimir discordâncias substanciais só para serem educados. A ótica desses encontros não é das melhores, no entanto, e reagir à piedade dos atletas com escárnio ou fingida indulgência não é respeito nem tolerância. É um desprezo mal disfarçado — e uma revelação do enorme abismo que há entre o modo que nossa cultura secularizada pensa sobre a religião e o modo que atletas fiéis se veem em um mundo extasiado com Deus.
O fato adorável é que os atletas em questão parecem não se importar nem um pouco [com esse desprezo], o que é bastante libertador para aqueles de nós que os aplaudem e compartilham de sua fé. Eles são um exemplo, para todos os crentes, do que é ser alegre e descaradamente cristão em público.
Como muitos fazem na mídia esportiva, eu também costumava revirar os olhos para tais demonstrações de piedade. Aquilo me parecia fora de lugar, desnecessário, talvez até uma fraude. E talvez seja mesmo, às vezes. Mas eu tive de admitir que eu teria a inclinação de ficar de boca fechada no pódio dos vencedores — eu ficaria envergonhado demais para ser tão ousado sobre a minha fé. No entanto, essas irmãs e irmãos são totalmente destemidos. Eu, por exemplo, tenho algo a aprender com a atitude deles.
Brad East é professor associado de teologia na Abilene Christian University. Ele é autor de quatro livros, entre eles The Church: A Guide to the People of God [A Igreja: Um guia para o povo de Deus] e Letters to a Future Saint: Foundations of Faith for the Spiritually Hungry [Cartas para um Futuro Santo: Fundamentos da fé para quem tem fome espiritual].