As restrições governamentais impostas à religião estão em alta globalmente.
A hostilidade social em relação à religião, entretanto, está diminuindo.
É o que conclui o Pew Research Center, em sua 14ª análise anual da extensão das restrições que 198 nações e territórios — e seus cidadãos — impõem à crença e à prática religiosa.
Com exceção de apenas oito países, algum tipo de assédio a grupos religiosos foi registrado em todos os demais.
O relatório de 2024, divulgado no início do mês de março, baseia-se principalmente em mais de uma dúzia de fontes da ONU, dos EUA, da Europa e da sociedade civil, e reflete as condições de 2021, o último ano com dados totalmente disponibilizados.
Na escala de restrições governamentais de 10 pontos, elaborada pelo Pew, a média global atingiu 3,0 pontos pela primeira vez, dando continuidade a um aumento constante desde a pontuação inicial de 1,8 pontos, em 2007. No geral, 55 nações (28%) registraram níveis considerados “muito altos” ou “altos”, apenas duas nações a menos do que o total do ano passado (57).
A Nicarágua destacou-se pelo assédio ao clero católico.
As diferenças regionais são evidentes: o Oriente Médio e o Norte da África (MENA, conforme a sigla em inglês) obtiveram 5,9 pontos, superando sua pontuação inicial de 4,7. A região Ásia-Pacífico obteve 4,2 pontos, crescendo a partir dos 3,2 iniciais. A Europa obteve 3,1 pontos, batendo os 1,7 iniciais. A África Subsaariana obteve 2,6 pontos, ante os 1,7 anteriores. E as Américas obtiveram 2,1 pontos; antes, tinham uma pontuação de 1,0.
Entre as 20 medidas de restrições governamentais elencadas pelo Pew estão esforços para “banir determinadas religiões, proibir a conversão, limitar a pregação ou dar tratamento preferencial a um ou mais grupos religiosos”.
Algumas delas são da época da COVID-19, como as multas no Canadá contra a abertura de igrejas.
Outras 13 medidas adicionais para atos de hostilidade religiosa cometidos por indivíduos ou grupos incluíram “conflitos armados ou terrorismo relacionados à religião, violência sectária ou de multidões, assédio a respeito de trajes usados por motivos religiosos e outras formas de intimidação ou de abuso relacionados à religião”.
As hostilidades sociais em relação à religião continuaram a apresentar uma tendência de queda desde a alta de 2,0 em 2018, diminuindo para 1,6, a pontuação mais baixa desde 1,2 ponto registrado em 2009. Mas 43 nações (22%) ainda registraram níveis considerados “muito altos” ou “altos”, embora em número significativamente menor do que as 65 nações infratoras em 2012.
A Nigéria foi citada por confrontos entre pastores muçulmanos e agricultores cristãos.
A ordem das diferenças regionais no quesito hostilidade social equivale à das restrições governamentais. A região do Oriente Médio e do Norte da África obteve uma pontuação de 3,6, voltando a se aproximar de sua pontuação inicial de 3,7, após o pico dos anos de 2012 a 2014. A região Ásia-Pacífico obteve uma pontuação de 1,9, acima da pontuação inicial de 1,7. A Europa marcou 1,9, ponto, superando a pontuação inicial de 1,2. A África Subsaariana obteve 1,3 ponto, antes tinha 0,4. E as Américas obtiveram 0,8 ponto, antes tinham 0,3.
Apenas quatro nações registraram o status “muito alto” em ambas as categorias: Afeganistão, Egito, Paquistão e Síria.
Juntaram-se a estas nações, como infratores reincidentes por restrições governamentais, a Argélia, o Azerbaijão, a China (com 9,1, a pontuação mais alta), a Indonésia, o Irã, o Cazaquistão, a Malásia, as Maldivas, Mianmar, a Rússia, a Arábia Saudita, Singapura, o Tajiquistão e o Uzbequistão. O Paquistão e o Turcomenistão entraram na lista este ano, enquanto Brunei e Eritreia saíram.
Menos nações foram classificadas com um índice “muito alto” no quesito hostilidades sociais, mas os infratores reincidentes também incluíram Índia, Israel e Nigéria — esta última, com uma pontuação de 8,9, a mais alta. Nenhuma nação nova entrou na lista este ano, enquanto Iraque, Líbia, Mali e Somália saíram.
A classificação foi feita com uma escala. Os primeiros 5% das nações em cada quesito foram classificados com nível “muito alto”, enquanto os 15% seguintes foram classificados como “alto”. Os 20% seguintes foram classificados como “moderado”, enquanto os 60% restantes foram classificados como “baixo”. (Embora o Pew reconheça a Coreia do Norte como uma nação claramente infratora, ela não foi incluída no relatório, devido à impossibilidade de acesso regular por parte de observadores independentes).
Em ambos os índices, a maioria das nações apresentou pouca ou nenhuma alteração em sua classificação. Apenas 16 delas registraram um aumento moderado de 1 para 1,9 ou mais em sua pontuação combinada, enquanto apenas nove nações tiveram uma redução semelhante. E apenas um país, o Sudão, registrou um declínio de 2 pontos ou mais nas restrições governamentais, pois uma nova constituição, agora no limbo em meio a uma guerra civil, descriminalizou a apostasia.
Com relação às hostilidades sociais, apenas a Turquia e a Bolívia registraram declínio semelhante, sendo a última pela ausência de registros — como nos anos anteriores — de missionários protestantes expulsos de áreas indígenas. Em contrapartida, Uganda e Montenegro testemunharam aumentos de 2 pontos em suas avaliações, este último devido à vandalização de mesquitas e ao assédio ao proselitismo cristão.
O mais comum, de acordo com o Pew, é o assédio do governo. Mais de 9 em cada 10 nações (183 no total) registraram pelo menos um incidente. O assédio social ocorreu em mais de 8 em cada 10 nações (160 no total), sendo que 157 nações registraram ambos.
O Pew também registrou os tipos de força ou violência infligida ao redor do mundo. Os danos à propriedade foram os mais comuns em 105 nações infratoras, com a Europa registrando a maior ocorrência, 71%. A região do Oriente Médio e Norte da África liderou a porcentagem de ocorrências em todos os outros tipos, sendo agressões físicas registradas em um total global de 91 países, detenções em 77, deslocamento forçado em 38 e assassinatos em 45.
A Etiópia ganhou destaque pelas mortes de 78 sacerdotes durante sua guerra civil.
Cristãos e muçulmanos continuam sendo os grupos religiosos que mais sofrem assédio. O número de nações que assediam cristãos aumentou de 155 para 160, em comparação com um total de 107 registradas inicialmente. O número de nações que assediam muçulmanos diminuiu de 145 para 141, mas ainda está acima das 96 registradas inicialmente. O assédio a judeus também diminuiu de 94 para 91, mas só foi registrado em 51 países em 2007.
Na categoria “outras religiões”, Baha’is, Sikhs e adeptos do Zoroastrismo vieram na sequência, com seus seguidores sendo assediados em 64 países; logo depois vieram as formas de religiosidade popular, assediadas em 40 países. As violações contra budistas (em 28 países), hindus (em 24) e contra a categoria dos “sem filiação [religiosa]”— composta por ateus, agnósticos e humanistas — (registradas em 27 países) foram menos difundidas.
Uma nova categoria do relatório do Pew rastreou as nações que ofereciam benefícios a grupos religiosos. Do total dos 161 países enquadrados, 127 apoiaram a educação religiosa, 107 ofereceram fundos para construir ou conservar edifícios religiosos e 67 ofereceram compensações ao clero em algum grau. Desses últimos, mais da metade (36 nações) deu tratamento preferencial a determinadas religiões. Do total, 149 governos, no entanto, assediaram os fiéis ou interferiram em seus cultos.
A Arábia Saudita, segundo observou o Pew, oferece ajuda de custo aos imãs, mas restringe seus sermões.
Além da computar as nações, o Pew também organizou dados para medir o impacto das restrições e das hostilidades em um amplo escopo da humanidade. Entre as 25 maiores nações — que representam 5,8 bilhões dos 7,8 bilhões da população mundial em 2021 — Egito, Paquistão, Índia, Indonésia e Nigéria registraram os níveis gerais mais altos. O Japão, os Estados Unidos, a África do Sul, a Itália e o Brasil tiveram as classificações mais baixas.