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A justiça americana determina que embriões congelados são crianças

Decisão inédita reconhece a vida em seus estágios iniciais, mas complica o futuro da fertilização in vitro.

Christianity Today March 2, 2024
BSIP / Universal Images Group via Getty Images

Em meados de fevereiro, o Alabama estendeu a proteção legal para além dos nascituros no útero, de modo a abranger nascituros fora do útero, tornando-se o primeiro estado americano a decidir que os embriões congelados são crianças perante a lei.

A decisão suscitou elogios por parte de alguns evangélicos que, por acreditarem que a vida começa na concepção, querem ver estes “bebês flocos de neve” serem tratados como pessoas, e não como produtos.

A decisão também complicou o futuro da fertilização in vitro (FIV) em todo o estado, desagradando pais atuais e futuros que recorreram ao procedimento. Ao menos um sistema hospitalar suspendeu por ora os tratamentos de fertilização in vitro.

Depois que o precedente Roe v. Wade foi derrubado, participantes do movimento pró-vida invocaram a 14ª. Emenda, que proíbe que se prive “qualquer pessoa da vida, da liberdade ou da propriedade”, e se uniram em torno das leis sobre a personalidade fetal para proibir o aborto e garantir os direitos humanos na concepção.

A medida para proteger os embriões era prevista tanto por ativistas antiaborto quanto por ativistas pelos direitos reprodutivos. Ela segue um padrão de políticas pró-vida no estado sulino: a constituição do Alabama protege “os direitos do nascituro” e a proibição do aborto no estado entrou em vigor após a decisão do caso Dobbs v. Jackson Women’s Health Organization, em 2022.

Em um processo movido pelos pais de vários embriões que foram destruídos em uma clínica de fertilidade, a Suprema Corte do Alabama afirmou que os nascituros são abrangidos pela Lei [estadual] sobre homicídio culposo de menores, independentemente do “estágio de desenvolvimento, localização física ou quaisquer outras características acessórias”, isto é, mesmo que estejam armazenados em um freezer e ainda não tenham sido implantados.

Estima-se que 1,5 milhão de embriões estejam congelados nos EUA, onde tratamentos de fertilidade como a fertilização in vitro estão se tornando mais comuns. No ano passado, 42% dos americanos — e 44% dos evangélicos brancos — disseram que eles mesmos ou alguém que conhecem buscaram assistência para fertilidade, superando os 33% em 2018, de acordo com o Pew Research Center.

A decisão não proíbe a fertilização in vitro, mas, como o procedimento muitas vezes resulta em sobras de embriões, os quais são mantidos indefinidamente congelados ou são destruídos, as clínicas de fertilidade não têm certeza de quais serão as implicações para eles e para o seu armazenamento.

“Por que é que todos os médicos especializados em fertilidade nos estados vermelhos [estados republicanos] estavam pirando, depois da decisão do caso Dobbs?” Katy Faust, fundadora da organização sem fins lucrativos Them Before Us, disse anteriormente à CT. “É porque eles [talvez não consigam] tocar seu negócio lá, se não puderem destruir vidas humanas.”

A questão do excesso de embriões provenientes da fertilização in vitro e a ética do processo em si tornaram-se uma parte importante das discussões pró-vida entre os evangélicos, incluindo a defesa da adoção de embriões.

O magistrado Jay Mitchell — que frequenta a Church of the Highlands, uma megaigreja com congregações em vários locais — foi o redator da opinião majoritária na decisão sobre o caso dos embriões. Ele se concentrou no entendimento da palavra criança, e não mencionou Deus.

“Aqui, o texto da Lei [estadual] sobre homicídio culposo de menores é abrangente e sem especificações. Aplica-se a todas as crianças, nascidas e não nascidas, sem limitação”, afirmou a decisão.

“Não é função deste Tribunal criar uma nova limitação, baseada em nossa própria visão, do que é ou não uma política pública sensata. Isto é especialmente verdade em lugares, como aqui, onde o povo deste Estado adotou uma emenda constitucional que visa diretamente impedir que os tribunais excluam a ‘vida não nascida’ da proteção legal.”

Uma opinião concordante do Chefe de Justiça Tom Parker, no entanto, baseia-se numa compreensão bíblica da personalidade e faz referência a Gênesis, ao apóstolo Paulo, a Tomás de Aquino, a Santo Agostinho e a João Calvino. Parker — que é membro da Igreja Frazer, uma congregação Metodista Livre em Montgomery — concluiu:

A visão teológica sobre a santidade da vida, adotada pelo povo do Alabama, abrange o seguinte: (1) Deus fez cada pessoa à Sua imagem; (2) cada pessoa tem, portanto, um valor que excede em muito a capacidade que os seres humanos têm de calcular; e (3) a vida humana não pode ser destruída injustamente, sem incorrer na ira de um Deus santo, que vê a destruição da Sua imagem como uma afronta a Si mesmo.

Andrew Walker, professor de ética e teologia pública no Southern Baptist Theological Seminary, chamou a decisão de “um avanço impressionante, repleto de significado moral”.

Nikki Haley, candidata republicana à presidência, que engravidou de seu filho por meio de inseminação intrauterina (IIU), fez referência às suas lutas pela fertilidade na campanha e concordou que os embriões “são bebês” na NBC News, na quarta-feira.

“Uma coisa é congelar espermatozóides ou óvulos, mas quando se fala de um embrião, estamos falando de — bom, para mim, isso é uma vida”, disse Haley, cuja IIU não exigiu a criação de embriões fora do corpo.

Haley, uma metodista que se descreve como pró-vida, enfatizou a necessidade de consenso na esfera federal, quando se trata de aborto, e vê mais oportunidades na esfera estadual.

“Quando vemos mais mulheres com problemas para engravidar e mais mulheres fazendo inseminação artificial e in vitro, essas são discussões que precisamos ter”, disse ela. “Mas também são discussões em que precisamos ter mulheres e médicos envolvidos, para que digam: ‘Como queremos lidar com isso, daqui para frente?’”

Mesmo antes da decisão do Alabama, o caso Dobbs tornou mais difícil para casais que fizeram fertilização in vitro doarem aos pesquisadores embriões que optarem por não implantar. O jornal The Washington Post informou que o RENEW Biobank, da Universidade de Stanford, que antes aceitava embriões de 49 estados, hoje aceita de apenas 7 estados — os demais exigem uma revisão extra, no caso de os doadores violarem as leis do seu estado de origem.

Historicamente, os católicos têm manifestado mais preocupações teológicas em torno da reprodução assistida do que os protestantes, embora haja mais pessoas no movimento pró-vida que agora prestam atenção à questão. Os pais evangélicos que desejam ter filhos, mas lutam contra a infertilidade, podem optar pela fertilização in vitro, mas limitando o número de embriões criados, para que cada um deles possa ser implantado.

Apesar de algumas reservas, o teólogo Wayne Grudem escreveu, em 2019, para o ministério The Gospel Coalition que “se a fertilização in vitro for usada por um casal, e se forem tomados cuidados para evitar a destruição intencional de embriões, então, é uma ação moralmente boa, que agrada a Deus, porque não viola nenhuma orientação bíblica, alcança o bem moral de superar a infertilidade e traz a bênção dos filhos para mais uma família.”

Jennifer Lahl, presidente do The Center for Bioethics and Culture Network, há anos tem levantado preocupações sobre a reprodução assistida. Após a decisão do Alabama, ela apontou para a proibição alemã de congelar embriões, que está em vigor desde 1990.

“A fertilização in vitro ainda é legal e o céu não caiu”, disse ela. “Você só não pode fazer muitos [embriões] e congelá-los; você deve implantá-los.”

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