Culture

O que adianta a um cristão proteger uma instituição e perder a sua alma?

Nossa ambição não deve vir antes de nossa consciência.

Christianity Today July 26, 2023
Illustration by Ūla Šveikauskaitė

O falecido pastor Eugene Peterson, em uma carta a seu filho, também pastor, escreveu que o principal problema para o líder cristão é assumir a responsabilidade não apenas pelos fins, mas também pelos “caminhos e meios” que orientamos as pessoas a seguirem para alcançar esses fins. “Todas as três tentações a Jesus, feitas pelo diabo, tinham a ver com maneiras e meios”, escreveu ele. “Todos os objetivos do diabo eram excelentes. O diabo tinha uma declaração de visão insuperável. Mas os caminhos e meios eram incompatíveis com os fins”.

Losing Our Religion: An Altar Call for Evangelical America

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272 pages

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Como disse Peterson, o discipulado para o qual Jesus nos chama é “conduzido tanto pessoal quanto corporativamente, [é um discipulado] no qual há continuidade entre interior e exterior. [É] Uma vida em que somos cuidadosos e atentos tanto em relação ao como quanto em relação ao quê.”

Isso ocorre porque, conforme Peterson aconselhou, “se vamos viver a vida inspirada em Jesus, precisamos simplesmente vivê-la do jeito que Jesus viveu — afinal, ele é o Caminho, bem como a Verdade e a Vida”. Não existem cláusulas de emergência para escapar do caminho da Cruz.

O que parece ser popular neste momento nem é tanto um evangelho da prosperidade; é mais um evangelho da depravação. Neste evangelho da depravação, apelos ao caráter ou a normas morais são respondidos não com apelos de “Sou inocente!”, mas com minimizações do tipo “Caia na real!”

No entanto, esse evangelho da depravação tenta nos atrair. Não importa se você chega até ele adotando-o abertamente, com prazer pela crueldade e vulgaridade, ou se ele leva você ao tipo de cinismo que nunca espera nada melhor.

Nesse caminho reside o niilismo. Você se encontrará em situações, talvez até já esteja em uma dessas situações, em que tem o dever de se responsabilizar por uma instituição. Talvez seja apenas como alguém que detém poder de voto. Você pode simplesmente dar de ombros e votar em qualquer pessoa que seu partido lhe disser para apoiar. Ao longo do tempo, isso vai mudar você. Ou talvez seja como membro de uma igreja ou como integrante de alguma denominação ou ministério cristão.

Não confunda dons e talentos com caráter, seja em relação a você ou a qualquer outra pessoa. Você não deve esperar que seus líderes sejam alguém sem pecado. Eles pecarão, mas há uma diferença entre um ser humano pecador que se arrepende e um padrão [persistente] de corrupção. Nesse último caso, você terá que se perguntar como lidar com isso. Você deve lidar com a situação permanecendo onde está e buscando efetuar mudanças? Ou partindo e encontrando um novo lugar para viver e servir? Eu não sei. Isso depende muito de fatores que muitas vezes você simplesmente não consegue saber. Sugiro que pergunte a si mesmo onde estão suas vulnerabilidades.

Você é do tipo de pessoa que normalmente vira as costas e abandona a situação? Em caso afirmativo, encontre todos os motivos que puder pelos quais você deve ficar e fazer mudanças, antes de partir. Você é do tipo de pessoa que tende a se adaptar a uma situação, por obrigação, lealdade ou nostalgia? Se for assim, considere enfaticamente sair.

A prestação de contas por parte de nossas instituições é importante. São elas que nos transformam no que consideramos “normal”. Quando um comportamento horrendo começa a lhe parecer normal, não é só você que está em perigo.

A consciência é mais do que um simples alerta interno que diz: “Faça a coisa certa”. A consciência — assim como a razão, a imaginação e a intuição — é uma forma de saber que está profundamente enraizada na psique humana.

A consciência nos alerta para o fato de que vivemos em um cosmo moralmente estruturado, e que nossas vidas correm por uma linha do tempo que nos leva a um dia em que prestaremos contas (Romanos 2.15-16) a um tribunal diante daquele que suportou, por nós, seu próprio tribunal (João 19.13).

Isso capacita uma pessoa a ter uma visão de longo prazo do universo e de sua própria vida. Com uma visão de curto prazo (digamos, de cerca de cem anos), pode-se facilmente concluir que a ambição é o que move a vida. Pode-se concluir, assim como fazem o salmista e Jó, que os impiedosos prosperam e que, portanto, o caminho para a prosperidade é através da crueldade. A consciência, quando funciona bem, aponta a pessoa para um escopo mais amplo — para o dia em que tudo será levado a prestar contas e a vida de uma pessoa realmente começará.

Esse bom funcionamento da consciência começa com o ser, e não com o fazer. Isso é precisamente o que todos os tipos de movimentos do Evangelho enfatizam. “Pois pela graça vocês foram salvos pela fé. E isso não é obra sua; é dom de Deus, não vem de obras, para que ninguém se glorie” (Efésios 2.8-9, ESV). Tal afirmação é imediatamente seguida por: “Porque somos feitura dele, criados em Cristo Jesus para boas obras, as quais Deus de antemão preparou para que andássemos nelas” (v. 10).

A moralidade é importante, mas está enraizada na vida, e não o contrário. Se você está em Cristo, seus pecados são perdoados. Você está crucificado com Cristo e ressuscitou com ele. Não há nada a alcançar por mérito. É por isso que, na melhor das hipóteses, o cristianismo evangélico aponta para a moralidade — ou, melhor, para a santificação, conforme a linguagem bíblica — como uma manifestação de quem já somos em Cristo, não como uma forma de merecer o favor de Deus.

A moralidade, então, opõe-se ao moralismo ou ao legalismo. Como disse Martinho Lutero: “Não nos tornamos justos por praticar atos justos; antes, praticamos atos justos por termos sido justificados”.

A moralidade deve ser algo que é definido fora da pessoa e fora da situação. A Cruz é um julgamento definitivo contra o pecado objetivamente definido. O inferno também. O pecado tem a ver não apenas com aquilo que você está fazendo (embora certamente abrange isso), mas também com o tipo de pessoa que você está se tornando. Temos diferentes pontos de vulnerabilidade, e é por isso que temos que carregar os fardos uns dos outros. Observe onde estão esses pontos fracos em sua própria vida. Qual é a ambição que move você? Quem são as pessoas que quer que gostem de você?

Uma consciência inoperante, que não funciona, é informada por prioridades como ambição, segurança e pertencimento. Foi assim que Pôncio Pilatos acabou crucificando Jesus. Não foi porque ele estivesse planejando ver esse Messias morto, mas porque ele estava “desejando agradar a multidão” (Marcos 15.15). Pilatos, segundo escreve Mateus, “percebeu que não estava obtendo nenhum resultado, mas, pelo contrário, estava se iniciando um tumulto”; então, ele lavou as mãos sobre o assunto (Mateus 27.24). É assim que acontece. Pilatos viu o que estava em jogo pela perspectiva do que ele estava ganhando ou perdendo — naquele momento ou no decorrer de sua vida. Ele definiu sua missão em termos de ambição e segurança, e não em termos de consciência. E, assim, sua consciência se ajustou à sua ambição, e não o contrário.

O mesmo pode acontecer com você — não importa se você trabalha em uma mercearia, em uma firma de contabilidade, na associação de roteiristas ou como missionário. Seu ímpeto sempre será o de silenciar sua consciência, pois não consegue lidar com o que teme que ela possa exigir de você. E nessa direção está o desastre.

O problema não é que você se verá se movendo de maneiras que nunca desejou — mas sim que sequer perceberá de que modo está se movendo. Você nem mesmo perceberá que está perseguindo o selo de aprovação de qualquer multidão à qual deseje pertencer, para qualquer objetivo que deseje alcançar. Só depois que já for tarde demais você verá que não se reconhece mais.

Esse clamor por ambição e por pertencimento não levará a uma ausência de consciência, mas sim a uma consciência deturpada, que se envergonha do que não é vergonhoso e não se envergonha daquilo que de fato o é. A formação do caráter também funciona de dentro para fora. Jesus disse: “O homem bom tira coisas boas do bom tesouro que está em seu coração, e o homem mau tira coisas más do mal que está em seu coração, porque a sua boca fala do que está cheio o coração” (Lucas 6.45).

A consciência limpa não conduz, como imaginamos, à paz interior, pelo menos não de imediato. Uma consciência limpa é uma consciência que está viva — e, portanto, vibra com apelos ao arrependimento e ao redirecionamento e com súplicas por misericórdia. Mas, a longo prazo, uma consciência limpa leva à paz — pois lança fora o medo.

Se a sua ambição for o seu padrão, você vive escravizado pelo que quer que possa acabar com a sua ambição. Se pertencer à sua tribo for o seu padrão, então, você ficará apavorado com qualquer ameaça de ser banido dela. Mas, se sua missão estiver alinhada com sua consciência, e se sua consciência estiver alinhada com o evangelho, então, você não precisa viver sob um medo paralisante e também não precisa viver defendendo a si mesmo.

É por isso que Jesus disse a seus discípulos: “Portanto, não tenham medo deles. Não há nada escondido que não venha a ser revelado, nem oculto que não venha a se tornar conhecido. O que eu lhes digo na escuridão, falem à luz do dia; o que é sussurrado em seus ouvidos, proclamem dos telhados” (Mateus 10.26-27).

Se você está ciente de que o Dia do juízo está por vir, não precisa invocar seu próprio dia do juízo agora. E se alguém lhe pedir alguma coisa à custa de sua integridade, saiba que o preço é alto demais.

Russell Moore é editor-chefe da CT. Adaptado de Losing Our Religion: An Altar Call for Evangelical America , da autoria de Russell Moore. Copyright©2023, licenciado por Sentinel, um selo da Penguin Random House LLC.

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